1 de julho de 2025
Politica

Juiz põe em prisão preventiva ‘contador’ de núcleo do PCC que se exibe em redes; ‘louco e sonhador’

A Justiça de São Paulo colocou sob prisão preventiva o contador Rodrigo de Paula Morgado, de 31 anos, apontado pela Polícia Federal como integrante do núcleo financeiro de uma ala do PCC que enviou oito toneladas de cocaína a bordo de veleiros com destino à Europa e África. Ele foi preso em flagrante na terça, 29, na posse ilegal de uma pistola Taurus 9 milímetros modelo G3C, no curso da Operação Narco Vela – investigação da Polícia Federal em parceria com forças especiais anti-drogas dos EUA, Espanha e França.

O Estadão busca contato com a defesa. À Justiça, ele alega ser primário e dono de “excelente reputação”.

Dono da Quadri Contabilidade, situada em Santos, no litoral paulista, Morgado é CAC (Colecionador, Atirador e Caçador) e se exibe nas redes ostentando requintes, a bordo de Ferrari e Lamborghini, e viagens internacionais por endereços paradisíacos.

Vaidoso, em seu perfil destaca que “veio de baixo”. Segundo diz, era tratado como “louco e sonhador”.

Ele teria ligações próximas com Marco Aurélio de Souza, o “Lelinho”, apontado pela PF como chefão do núcleo do PCC que mandava cocaína para o exterior em veleiros e lanchas de alta performance.

Operação Narco Vela: PF apreendeu Ferrari de contador.
Operação Narco Vela: PF apreendeu Ferrari de contador.

A PF prendeu Morgado em um hotel em São Paulo. Relatório de Inteligência Financeira do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) revela que ele é o controlador da Saito Construtora, fundada em maio de 2022. Em apenas sete meses, a empresa recebeu R$ 17 milhões “das formas mais bizarras possíveis”.

Os investigadores indicam que a empresa de Morgado aparece na “cadeia de pagamentos” da compra do veleiro “Lobo IV”, apreendido em fevereiro de 2023 pela Guarda Costeira americana com três toneladas de cocaína a bordo próximo ao continente africano. O confisco do “Lobo IV” foi o início da grande investigação que culminou na Operação Narco Vela, autorizada pelo juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5.ª Vara Criminal Federal de Santos.

Segundo o Grupo Especial de Investigações Sensíveis, braço da Coordenação Geral de Repressão a Drogas, Armas e Facções Criminosas da PF, a construtora informou, inicialmente, que faz venda de imóveis de heranças, mas não possui registro no Creci. Depois, alegou que “possui diversas obras em andamento em diversas localidades, o que justificaria o recebimento em espécie, porém sem documentos comprobatórios”.

“Pesam fundadas suspeitas de se tratar de empresa ‘fantasma’, laranja utilizada para ocultar os reais adquirentes da embarcação e para lavagem de dinheiro”, destaca a PF, amparada em relatórios do Coaf.

“Rodrigo de Paula Morgado possui atuação vinculada ao núcleo financeiro da organização criminosa sob investigação, exercendo papel relevante na estruturação de mecanismos voltados à ocultação e dissimulação de valores oriundos do tráfico internacional de drogas”, assinala a PF.

Rodrigo Morgado é apontado como membro do núcleo financeiro de uma ala do PCC que usou veleiros para enviar cocaína à Europa e África.
Rodrigo Morgado é apontado como membro do núcleo financeiro de uma ala do PCC que usou veleiros para enviar cocaína à Europa e África.

Embora não figure como executor de atos diretamente operacionais, a conduta de Morgado revela “papel estratégico no suporte à engrenagem financeira do grupo, notadamente pela utilização de sua condição de contador para constituir e manter empresas de fachada em nome de terceiros, muitos dos quais identificados nesta investigação, com o objetivo de viabilizar o branqueamento de capitais ilícitos”.

A Operação Narco Vela põe Morgado na condição de “elo entre empresas de fachada e a movimentação de recursos financeiros incompatíveis com a capacidade econômica de seus administradores”.

“Os elementos reunidos demonstram que tais empresas compartilhavam não apenas o mesmo responsável contábil, mas também apresentavam estrutura incompatível com os volumes financeiros movimentados, ausência de atividade operacional regular e vínculos societários entre si, sugerindo um sistema de interposição societária voltado à lavagem de capitais”, destaca a PF.

As transações entre essas pessoas jurídicas seguiram padrão de fracionamento típico de ocultação de origem de recursos, “indicando que a função exercida por Rodrigo Morgado extrapolava os limites de uma atuação meramente técnica ou contábil, colocando-o como provável operador financeiro da organização”.

A análise patrimonial também revelou “padrão de vida incompatível” com os rendimentos declarados por Morgado. “Viagens internacionais e elevado padrão de consumo, aliado aos demais elementos probatórios, reforça a hipótese de sua vinculação estrutural ao núcleo financeiro da organização criminosa liderada por Marco Aurélio de Souza, vulgo ‘Lelinho’.”

A extensão da atuação do contador que mostra luxos nas redes é detalhada em capítulo específico do relatório da PF dedicado à estrutura de lavagem de dinheiro utilizada pelo grupo.

PCC usou veleiros e barcos para enviar cocaína à Europa e África
PCC usou veleiros e barcos para enviar cocaína à Europa e África
Embarcações saíam do Porto de Santos, litoral paulista
Embarcações saíam do Porto de Santos, litoral paulista
Facção fazia uso de satélites e embarcações com autonomia para travessias oceânicas, inclusive veleiros
Facção fazia uso de satélites e embarcações com autonomia para travessias oceânicas, inclusive veleiros
Mais de 20 pessoas foram presas e bens apreendidos
Mais de 20 pessoas foram presas e bens apreendidos
Investigação teve início a partir de alerta DEA (Drug Enforcement Agency), dos Estados Unidos
Investigação teve início a partir de alerta DEA (Drug Enforcement Agency), dos Estados Unidos
 Justiça Federal determinou o bloqueio e apreensão de bens até o valor de R$ 1,32 bilhão
Justiça Federal determinou o bloqueio e apreensão de bens até o valor de R$ 1,32 bilhão

Preventiva

Na audiência de custódia, conduzida na tarde desta quarta, 30, pelo juiz de plantão no Fórum Criminal da Barra Funda, Antonio Balthazar de Mattos, o suposto contador do PCC teve a prisão em flagrante convertida em preventiva – sem prazo para terminar. O juiz observou que Rodrigo Morgado tinha em seu poder a pistola automática de uso restrito, um carregador e 11 munições, sem documentação.

“Ora, quem, sem autorização legal, dispõe-se a andar armado, mormente se envolto em práticas ilícitas, salvo hipóteses excepcionalíssimas, está pronto a cometer os mais sérios crimes tipificados em lei”, advertiu Balthazar de Mattos. “A mera arguição de que circunstâncias judiciais favoráveis não é o bastante para impor o restabelecimento da liberdade.”

O juiz decidiu. “Conquanto primário, o autuado (Morgado) encontra-se vinculado a investigação federal, concernente a crimes afetos à Lei de Drogas, mais especificamente à Operação Narco Vela, que apura potencial tráfico internacional sob uso de veleiros e barcos, cujos indícios amealhados, inclusive, viabilizaram a expedição de mandado de busca e apreensão, além da imposição de cautelares diversas, em seu detrimento.”

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *