Lula tenta segurar a popularidade e Haddad, a credibilidade. Os dois falham
Parecia bom demais para ser verdade. E era. Ninguém esperava, nesta quinta-feira, 22, o congelamento de R$ 31,3 bilhões anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e seus colegas da equipe econômica. As maiores previsões na pesquisa do Projeções Broadcast chegaram a R$ 28 bilhões, mas a mediana foi mesmo de R$ 10 bilhões, o que indicava uma expectativa bem abaixo da paulada que foi anunciada nesta quinta pelo ministro dos Transportes, Renan Filho. (Não, você não leu errado. O ministro dos Transportes “furou” os colegas da equipe econômica e divulgou o congelamento antes. Será que foi vingança porque terá seu orçamento bloqueado?)
Se Haddad esperava com isso passar credibilidade e comprometimento com o aperto fiscal, não foi o que aconteceu. Como em todas as relações, não importa o que você diz, mas sim o que o outro entende. A comunicação truncada foi, mais uma vez, o problema do governo. O ministro falou e falou sobre o contingenciamento de R$ 20 bilhões, o bloqueio de R$ 10 bilhões, mas quis “esconder” para depois das 17h, depois de o mercado fechar, a terceira medida: o aumento de impostos.

Por mais que escolha verbos diferentes (equalizar, fechar brechas) o governo subiu alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de diversas transações. E, mesmo antes de fechar, o mercado foi entendendo que o ajuste fiscal não se tratava de corte de despesas apenas, mas de aumento de arrecadação.
Ou seja, dá-se uma segurada nos gastos agora, mas sobe imposto também. Contingencia-se R$ 20 bilhões de cá, aumenta-se mais R$ 20 bilhões em impostos de lá (vai cair pra R$ 18 bilhões o que a Receita vai arrecadar a mais com o IOF, já que o governo teve que recuar). Noves fora, a paulada não é tão paulada assim, vai ficar mais próxima daquilo que os analistas estavam prevendo mesmo.
É assim que se perde credibilidade – e popularidade. Nem precisamos entrar na questão de que a equipe econômica teve que recuar de parte das medidas do IOF meras horas depois de anunciá-las. Mesmo antes, tentar vender o pacote de ajuste fiscal como um apertar de cintos foi menosprezar a inteligência do mercado e de toda a população.
Entre as medidas de aumento de imposto, está a alta de alíquota de cartão de crédito internacional (de 3,38% para 3,5%) e a de compra de moeda em espécie e cartão com conta no exterior (de 1,1% para 3,5%), que atinge quem usa cartões de empresas como Nomad e Wise e contas em dólar que os bancões criaram nos últimos anos para concorrer com elas.
Haddad disse várias vezes que se tratava de uma “equalização” e a Fazenda chegou a omitir da apresentação feita durante a coletiva que a taxa de 2025 para os cartões internacionais era menor do que a que será praticada a partir desta sexta-feira. Uma tentativa efêmera de não divulgar o que rapidamente foi percebido: ficará mais caro levar dólares e outras moedas para viajar para o exterior.
A insistência do ministro em dizer que as pessoas físicas não serão atingidas é, mais uma vez, ignorar o brasileiro – e o eleitor – de classe média. Aquele que já soube esta semana que vai pagar a conta de luz de graça das classes mais pobres para ajudar Lula a subir uns pontos nas pesquisas. Nos últimos meses, Lula e a ala política tentam segurar a queda na popularidade. Haddad e a ala econômica, manter a credibilidade. As duas partes estão falhando.