30 de junho de 2025
Politica

Entre bits e corrupção: a inteligência artificial no combate à decisão solipsista do político

Dizem que no dia que Pedro Álvares Cabral desembarcou em Porto Seguro, no litoral sul da Bahia, em 1500, tornando a região colônia do Reino de Portugal, trouxe inúmeras novidades da civilização europeia ao Continente. Uma delas foi a corrupção, desconhecida pelos habitantes nativos, mas como disse Pero Vaz “Aqui nessa terra tudo que se planta nasce, cresce e floresce”.

A profecia virou realidade. E como tivemos escândalos famosos: os anões do orçamento (1980-1990), navalha na carne (2007), vampiros da saúde (1990-2004), Juiz Lalau (1992-1998), Zelotes (2015), apenas para ficar nos mais recentes. Vemos que alguns sempre tem uma continuação da franquia, como no caso dos anões do orçamento, o qual envolvia corrupção com emendas parlamentares, um clássico que aparentemente nunca saiu de moda.

O qual ainda entoa em nossos ouvidos, a frase icônica do político João Alves ao ser questionado na CPI dos Anões do Orçamento, como conseguiu ganhar 200 vezes na loteria, disse: “Deus me ajudou e eu ganhei dinheiro”. Acusá-lo de lavagem de dinheiro de emendas parlamentares pela loteria esportiva, era inveja combinado com cobiça, somente isso.

A par desses casos escandalosos de corrupção, ainda temos outras intempéries. Uma tradição é o político que se considera um rei eleito, produzindo decisões solipsistas sobre políticas públicas, com interpretações “criativas” sobre os interesses dos cidadãos administrados, como consequência da sua visão pessoal do que significa um regime republicano.

Algumas palavras sobre a decisão solipsista, é comum na crítica aos juízes, quando aquele que julga por suas características pessoais, seja capaz de dizer o que é bom, justo, certo e verdadeiro para a sociedade. Igual a um julgamento salomônico da Bíblia, o qual a pessoa recebe um dom especial divino, superior ao da população, para indicar o que é melhor, em cada caso, sem a necessidade de explicar profundamente, apenas com expressões vagas, como: é do interesse do povo, eu fui eleito e não preciso me explicar… Ou nos ensinamentos de outro político brasileiro “Fi-lo porque qui-lo”.

O que pode se apresentar em um primeiro olhar, como algo surreal, ganha apoio rotineiramente nas redes sociais, de uma parte do eleitorado, em publicações de jornais ou influenciadores, onde vários comentários, para a surpresa dos céticos, são de apoio incondicional, em um verdadeiro terraplanismo ideológico, ainda que seja contra o interesse do próprio administrado.

Isso parece vagamente outra situação como o Primeiro Concílio da Vaticano, do Papa Pio IX, no qual foi definida a tese da Infalibilidade Papal, vigente até os dias de hoje, ou seja, quando o Papa fala sobre fé ou moral, está correto e sem questionamentos. No Concílio Ideológico Afetivo convocado na surdina, o político da corrente ideológica do eleitor, está sempre correto, por que ele representa os sentimentos das pessoas e não mais uma opção ideológica racional.

O personagem Odorico Paraguaçu sabia cultivar bem os sentimentos da população, criado por Dias Gomes, inspirado em uma situação ocorrida em uma prefeitura no interior do Espirito Santo, relata a estória de um prefeito, ao cumprir uma promessa de campanha, convence os cidadãos da necessidade prioritária de construir um cemitério público na pequena cidade de Sucupira, mas sem esclarecer como seria, ou seja, a custa de sucatear todos os serviços públicos da cidade, com funcionários públicos com salários atrasados, crianças sem material escolar…

O cumprimento de uma promessa de campanha, é uma qualidade elogiável de um político, mas ao fazer em detrimento de todos os serviços essenciais, não pode ser considerada uma opção viável, com a desculpa de que apenas fez aquilo que foi eleito, sem consultar o eleitorado sobre as consequências da escolha. Sua eleição decorreu do apelo emocional a necessidade de criar um cemitério, sem se avaliar os dados e as consequências.

Vemos que o despertar desse coma autoinduzido não ocorrerá sem estratégias avançadas de convencimento, o mero convite ao ceticismo, será ineficaz e insalubre. Seria importante criar uma Inteligência Artificial (IA) utilizando dados possa orientar o político e os eleitores antes das escolhas sobre as políticas públicas.

Nessa proposta, a IA vem a ser uma ferramenta utilizada para analisar uma quantidade imensa de dados, para descobrir padrões, detectar anomalias rapidamente, ao contrário de análises humanas, normalmente demoradas e por amostragem.

Assim, auditorias algorítmicas são instrumentos importantes, atualmente sendo utilizados com eficiência no combate as violações de direitos autorais, mas existem projetos como da Controladoria Geral do Município do Rio de Janeiro para o combate a corrupção, por meio da ajuda dos algoritmos. E Desde 2017, o TCU utiliza a IA Alice para detectar fraudes em licitações, ajudadas pelas outras IAs Sofia e Monica.

Mas são todas IA utilizadas após a decisão, é importante uma IA indicando as possibilidades antes da decisão, como por exemplo, no caso da construção de um viaduto para melhorar o trânsito, fossem utilizadas as informações de trânsito obtidas em um aplicativo como Waze, indicando as melhores opções e não apenas a opinião pessoal do político.

Só aumentam os desafios enfrentados no combate a corrupção e a eficiência da Administração Pública, mas ferramentas como os dados digitais, com seu uso pela IA, nos fornecem uma esperança para o futuro. A mesma eternizada por Nelson Cavaquinho: “Quero ter olhos para ver. A maldade desaparecer… O Sol há de brilhar mais uma vez…”

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica

 

 

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