30 de junho de 2025
Politica

Com PT preso a Lula, esquerda vê renovação com ascensão de João Campos na presidência do PSB

BRASÍLIA — A cantoria da militância “Carlos Siqueira é meu amigo, mexeu com ele, mexeu comigo” deu lugar a “Brasil, pra frente, João presidente”. O Partido Socialista Brasileiro (PSB) elegeu por aclamação João Campos, prefeito de Recife, para suceder Carlos Siqueira no comando da sigla.

A transição, feita durante o 16º congresso nacional do PSB no domingo, 1º, marca a renovação de uma esquerda que claudica na busca por novas lideranças fortes o suficiente para fazer frente ao bolsonarismo. Aos 31 anos, João é o presidente partidário mais jovem do País.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prestigiou evento do PSB que elegeu João Campos seu presidente
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prestigiou evento do PSB que elegeu João Campos seu presidente

Em seu segundo mandato à frente da prefeitura, João ascende num campo político que tem a hegemonia do Partido dos Trabalhadores. A sigla, no entanto, enfrenta um problema, na medida em que o seu maior líder, Lula, se aproxima dos 80 anos de idade: tornou-se a mais sênior na Câmara dos Deputados enquanto sofre para encontrar jovens lideranças a nível nacional.

Lula, por sua vez, dá mostras de que não vai abrir caminho tão facilmente para um sucessor. No mesmo evento que coroou João, ele afirmou que deve se candidatar à reeleição no ano que vem se estiver “100% de saúde como está hoje”. E que, estando bem, “a extrema direita não volta a governar” o Brasil. Caso seja reeleito, o petista pode deixar o poder aos 85 anos — desde 1989 ele é a opção número um do PT para a Presidência.

De lá para cá, no entanto, o partido perdeu força com a juventude. A bancada petista na Câmara dos Deputados tinha uma idade média de 55,7 anos ao tomar posse em 2023, acima da média geral. O levantamento do Estadão levou em conta todas as siglas com mais de dez assentos na atual legislatura: são 12 partidos somando 466 parlamentares.

Quando chegou pela primeira vez à Câmara, em 1983, o PT era conhecido pelas jovens lideranças ligadas a movimentos sociais, como Luiz Dulci (27), José Genoino (36), Eduardo Suplicy (41) e Lula (37), então candidato derrotado ao governo de São Paulo no ano anterior. Os seis parlamentares da primeira bancada eleita tinham uma idade média de 39,7 anos. O mais velho era Plínio de Arruda Sampaio, então com 52. Metade da bancada era de “vintões” e “trintões”.

A juventude hoje pertence a outras siglas, em especial ao PSOL. A bancada do partido do deputado federal Guilherme Boulos tem uma idade média de 47,2 anos, a mais jovem da esquerda. Mas o PSB de João Campos também é mais jovem que o PT: 51,1 anos — média puxada para baixo pelo círculo íntimo do novo presidente da sigla. Seu irmão, Pedro Campos (PE), tomou posse com 27 anos. Tabata Amaral (SP), namorada do prefeito, com 29.

16º congresso nacional do PSB

O evento foi realizado num centro de convenções em Brasília e teve a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — é algo incomum que figuras de outros partidos compareçam a assembleias internas de outro, o que foi visto como sinal de prestígio. Nomes de peso do partido, como o vice-presidente Geraldo Alckmin e os governadores da Paraíba, João Azevêdo, e do Espírito Santo, Renato Casagrande, compunham a mesa principal, enquanto a militância circulava pelo espaço com máscaras de João.

A renovação atrelada ao recifense, entretanto, é um paradoxo. Isso porque ele é herdeiro de um dos mais tradicionais clãs políticos de Pernambuco, a família Arraes. João é agora líder maior de um partido que tem a vice-presidência da República, três governadores, 15 deputados federais e quatro senadores. Cargos importantes como o de governador de Pernambuco e até o de presidente da República são esperados na trajetória do prodígio, na visão de seus aliados próximos.

A ambição não surpreende. Seu bisavô, Miguel Arraes (1916-2005), e seu pai, Eduardo Campos (1965-2014), governaram Pernambuco em diversas ocasiões. Eduardo deixou a cadeira nove anos atrás para concorrer ao Palácio do Planalto, tendo Marina Silva (então no PV) como vice. Um acidente aéreo, no entanto, vitimou-o às vésperas da eleição. Tanto Miguel quanto o seu neto faleceram no dia 13 de agosto.

Os familiares marcaram os discursos de João e de seus aliados. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), presença inusitada no evento, mencionou a “renovação da esperança na boa política” e a “história e o legado” do bisavô e do pai que o prefeito carrega nos ombros. O senador Cid Gomes (PSB-CE), presente no evento, é outro a mencionar o paradoxo ao falar do correligionário.

Máscaras com o rosto de João Campos usadas pela militância no 16º congresso nacional do PSB
Máscaras com o rosto de João Campos usadas pela militância no 16º congresso nacional do PSB

“O João é uma renovação com tradição. É um jovem que virou um case de sucesso como prefeito, um nome muito bem cotado para o governo de Pernambuco, meio que um caminho natural. O partido já foi presidido pelo pai e pelo bisavô dele. Ao mesmo tempo, ele se coloca como uma novidade, procurando romper essa polarização (entre PT e PL)”, disse ao Estadão.

Em coletiva de imprensa após sua eleição, João afirmou que o PSB, sob o seu comando, vai defender a manutenção de Alckmin como vice na chapa do PT em 2026. Mais cedo, o próprio Lula havia declarado, num discurso de uma hora, que o petista afirmou que, para ser candidato à reeleição no ano que vem, ele “precisa estar 100% de saúde como está hoje”. Mais cedo, também no palco, o pessebista afirmou que a tarefa do partido é crescer nas urnas e tentar aumentar as bancadas parlamentares.

Em seu discurso, João se mostrou antenado às mudanças sociais do eleitorado e pediu atenção ao componente religioso que tem ocupado lugar de destaque nas eleições:

“A gente vive diante de um Brasil novo, onde a gente tem maiorias que não existiam antigamente, seja no campo do empreendedorismo, seja na mistura das religiões e na fragmentação do cristianismo. Isso tem implicado na vida política”, declarou. E encerrou sua fala com acenos à frente ampla: “vamos derrubar muros, vamos construir pontes”.

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