15 de agosto de 2025
Politica

Bolsonaro réu evoca ‘vícios’ de época parlamentar para se desculpar por ataques enquanto presidente

BRASÍLIA – “Eu fiquei dois anos como vereador, e 28 como deputado federal. A minha retórica sempre foi parecida com isso”, Jair Bolsonaro, ex-presidente da República e réu no Supremo Tribunal Federal (STF) em ação que apura tentativa de golpe de Estado, começou com essas palavras o depoimento ao ministro Alexandre de Moraes na tarde desta terça-feira, 10. Mais tarde, contextualizou-as: “Talvez esse vício eu tenha trazido para o Poder Executivo”.

O “vício” mencionado se refere à imunidade discursiva a que os eleitos ao Legislativo têm direito no parlatório – e cujo privilégio teria deixado Bolsonaro mal acostumado. O hábito com palavrões, ofensas e ilações, oriundo de sua origem parlamentar, virou argumento do ex-presidente para justificar os variados ataques às autoridades e instituições que ele desferiu enquanto incumbente do Palácio do Planalto, e com os quais foi confrontado durante o seu depoimento.

O ex-presidente Jair Messias Bolsonaro durante depoimento em ação que julga a tentativa de golpe de Estado, no STF
O ex-presidente Jair Messias Bolsonaro durante depoimento em ação que julga a tentativa de golpe de Estado, no STF

Bolsonaro começou o seu testemunho sendo questionado por Moraes a respeito de afirmações dadas durante uma reunião ministerial em julho de 2022. Na ocasião, o então presidente difundiu teses infundadas sobre fraude nas urnas e atacou ministros do Supremo. Sugeriu, por exemplo, que Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Moraes teriam “levado” dezenas de milhões de dólares para direcionar o resultado das eleições.

“Não tem indício nenhum, senhor ministro. Era um desabafo, uma retórica que eu usei. Então, me desculpem. Não tinha essa intenção de acusar de qualquer desvio de conduta contra os três”, respondeu o réu.

Ele voltaria a evocar o “Bolsonaro parlamentar” outras vezes para justificar e se desculpar pelo “Bolsonaro presidente”. “Eu agi com a Constituição. Muitas vezes me revoltava, falava palavrão. Falava o que não devia falar, sei disso”, afirmou.

“Eu posso ter errado na forma, na entonação”, comentou também, atribuindo a postura à época de imunidade parlamentar. Ele também citou os 29 palavrões proferidos durante uma reunião ministerial de abril de 2020. E definiu sua ofensiva contra o sistema eleitoral como “críticas”, e não como “ataques”.

Em outro momento, Bolsonaro foi lembrado pelo ministro Luiz Fux que, na mesma reunião mencionada por Moraes, o então presidente “escorregou no vocabulário e ofendeu autoridades”. A pergunta se referia à gravação consentida ou não daquele encontro, mas o réu aproveitou o momento para voltar a se desculpar com os ministros do STF.

“Eu sempre carreguei no linguajar. Tento me controlar, tenho melhorado bastante meu vocabulário. Acho que com 70 anos é difícil mudar muita coisa. Estou tentando sempre me policiar. E peço desculpas se ofendi alguém”, respondeu.

Ao fim do interrogatório, Bolsonaro foi questionado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, por uma ameaça certa vez feita ao STF. Na ocasião, disse: “ou o chefe desse Poder enquadra o seu, ou esse Poder pode sofrer aquilo que não queremos”. O ex-presidente voltou a recorrer ao Bolsonaro deputado federal.

“O senhor deve conhecer o meu temperamento dentro do Congresso. Eu respondi a uns 20 processos de cassação lá dentro. Um pouco explosivo, muitas vezes errei”, respondeu, sem explicar que tipo de consequências o STF poderia sofrer se não “enquadrasse” os ministros. Na sequência, declarou que tem “melhorado, mas ainda longe de atingir o nível civilizado para conversar”.

A postura difere do Bolsonaro presidente, que chegou a chamar os ministros do STF de “canalhas” e outros termos de baixo calão. Por outro lado, correspondeu à própria promessa que fez na sexta-feira passada, 6, a apoiadores durante um evento do PL Mulher, setorial feminino de seu partido. Após convocar os apoiadores a darem audiência a seu depoimento, afirmou que “não iria lacrar, nem desafiar ninguém”. De fato, não lacrou, mas aproveitou os holofotes para criar cortes para as redes sociais.

O momento de maior – e única – descontração se deu quando Bolsonaro, sorrindo, perguntou a Moraes se poderia “fazer uma brincadeira” com o ministro. O relator brincou que o ex-presidente deveria antes consultar os advogados, arrebatando gargalhadas no auditório da Primeira Turma. “Gostaria de convidá-lo para ser meu vice em 2026″, perguntou o réu. “Eu declino novamente”, respondeu Moraes, levando os presentes aos risos.

O trecho foi prontamente aproveitado na bolha bolsonarista nas redes sociais. O deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) foi um dos que compartilharam o momento em seu perfil.

“Pra ser considerado piada temos que partir do pressuposto de que as pessoas que estão escutando conheçam o contexto e a realidade, daí a graça consiste no ABSURDO do cenário apresentado como fictício. É o plot

twist. Qualquer pessoa com 2 neurônios entendeu a ironia da fala do @jairbolsonaro, entendeu que a ÚLTIMA pessoa no planeta que seria escolhida para vice dele seria o Moraes. Ele apenas usou a oportunidade para mostrar que será candidato à Presidência em 2026″, escreveu Eduardo no X.

 

 

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