Veja principais trechos de interrogatórios de todos os oito réus da trama golpista no STF
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu nesta terça-feira, 10, os depoimentos dos oito réus acusados de formar o núcleo central da tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. No segundo dia de sessão, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) admitiu que mostrou uma minuta ao então comandante do Exército, Freire Gomes, disse que cogitou decretar estado de sítio, mas negou ter tentado golpe.
Em outro depoimento importante, o general Walter Braga Netto disse que o tenente-coronel Mauro Cid mentiu na delação premiada. Segundo Braga Netto, ele não discutiu um plano para assassinar autoridades em uma reunião com militares das Forças Especiais do Exército realizada em sua casa – o plano, de acordo com a investigação, recebeu o nome de Punhal Verde e Amarelo.
Ele também negou ter repassado dinheiro para Cid em uma caixa de vinho com o objetivo de financiar a operação, como havia dito o tenente-coronel.

Além dos dois, o almirante Almir Garnier, o general Augusto Heleno, o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, e o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, depuseram nesta terça-feira perante o ministro Alexandre de Moraes.
Veja abaixo os principais trechos dos depoimentos realizados nos dois dias.
Jair Bolsonaro
No principal momento do depoimento, Bolsonaro admitiu que exibiu uma minuta de decreto ao comandante do Exército, Freire Gomes, mas negou que o documento representava uma tentativa de golpe de Estado e que seu grupo teve que “entubar o resultado das eleições”.
Bolsonaro também reconheceu que cogitou decretar estado de sítio porque não podia recorrer de uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que multou o PL em R$ 22 milhões após o partido colocar em dúvida o resultado da eleição de 2022.
O ex-presidente disse que não desrespeitou a Constituição e nem ordens judiciais, embora tenha reconhecido que falou palavrões e “coisas que não deveria falar”.
Um dos argumentos utilizados por Bolsonaro foi de que outros políticos também colocaram a segurança das urnas eletrônicas em dúvida e defenderam o voto impresso assim como ele fez durante seu mandato como presidente.
Em outro momento, o ex-presidente pediu desculpas a Moraes por ter afirmado em uma reunião que o ministro do STF recebeu 50 milhões de dólares para defender uma suposta fraude na eleição. Bolsonaro reconheceu que não tinha provas para sustentar a acusação.
Bolsonaro manteve a defesa do voto impresso durante o depoimento e disse que sua intenção não era desacreditar as urnas, mas sim alertar sobre a necessidade de melhorá-las. Ele afirmou que se o voto fosse semelhante ao modelo adotado no Paraguai e na Venezuela ele não estaria depondo como réu perante a Moraes, o que classificou como “momento bastante desagradável”.
Bolsonaro também se queixou que Moraes classificou como confidencial um inquérito da Polícia Federal supostamente sobre as urnas eletrônicas. O ministro respondeu que não há nenhuma dúvida sobre o sistema eletrônico de votação e que o inquérito não está relacionado às urnas.
Em um momento descontraído, Bolsonaro, inelegível, convidou o ministro do STF para ser vice em sua chapa na eleição de 2026.
Bolsonaro abordou também os R$ 18 milhões que arrecadou em doações via Pix de seus apoiadores. Segundo o ex-presidente, o dinheiro foi essencial para pagar seus advogados e ajudar o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL) que está nos EUA.
Em outro momento bem-humorado, o advogado de Bolsonaro, Celso Vilardi, disse que adotaria o “método Alexandre de Moraes”, que consiste em pedir aos réus para responderem apenas “sim” ou “não”. O ministro brincou que mais cedo o advogado de general Heleno tentou usar a estratégia, mas não obteve sucesso.
Braga Netto
Logo no início do depoimento do ex-ministro da Defesa, Moraes fazia as perguntas de praxe ao réu quando Braga Netto respondeu que estava preso. O ministro do STF respondeu de bate-pronto: “Sim, eu sei. Eu que decretei”.
Braga Netto afirmou que Cid mentiu em sua delação. Segundo o general, o tenente-coronel não foi embora mais cedo e ficou até o final de uma reunião em sua casa com militares das Forças Especiais do Exército. Ele classificou o encontro como uma visita de cortesia. O general também negou que tenha repassado dinheiro para financiar a ação.
Braga Netto também disse que não houve fraude na eleição de 2022 e negou ter discutido qualquer plano para assassinar autoridades, como sugerido por Cid em sua delação.
Almir Garnier
O ex-comandante da Marinha rebateu o depoimento do ex-comandante do Exército, Freire Gomes, e negou que colocou tropas da força naval à disposição de Bolsonaro para uma tentativa de golpe.
Almir Garnier disse que não presenciou o diálogo entre o então comandante da Força Aérea, Baptista Júnior, e o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira. Segundo Baptista, ele teria se recusado a receber um documento que previa que Lula não tomasse posse. Garnier disse que chegou atraso à reunião e que cara dos demais presentes era de quem “comemos e não gostamos”.
Anderson Torres
O ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, foi questionado por Moraes sobre o que quis dizer quando afirmou em uma reunião ministerial antes das eleições de 2022 que todos “iriam se f….”. Como resposta, Torres pediu desculpas pela fala e justificou que era uma reunião fechada.
Torres se eximiu de responsabilidade pelos atos de 8 de Janeiro, quando era secretário de Segurança Pública do Distrito Federal. Ele afirmou que estava de férias em uma viagem à Disney, nos EUA, e que houve “falha de protocolo”.
Augusto Heleno
O ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional decidiu fazer uso do direito ao silêncio e responder apenas às perguntas de seu advogado.
No entanto, Heleno foi advertido pelo próprio defensor depois de não cumprir o combinado de responder apenas “sim” ou “não”.
Mauro Cid
Logo no início, Cid foi questionado por Moraes se foi pressionado durante os depoimentos à Polícia Federal e ao próprio ministro. O tenente-coronel negou e disse que o áudio vazado pela revista Veja no qual ele reclama da condução dos policiais foi um “desabafo”.
O ex-ajudante de ordens confirmou que era o próprio Bolsonaro que operava o celular ao fazer publicações no Facebook e repassar mensagens com ataques aos ministros do STF.
Cid reiterou o que havia dito em depoimento à Polícia Federal e, em um momento-chave do primeiro dia de depoimentos, disse que Bolsonaro pediu mudanças na minuta golpista e manteve apenas a previsão de prisão do ministro Alexandre de Moraes.
O tenente-coronel disse que recebeu dinheiro de Braga Netto em uma caixa de vinho e repassou a verba ao major Rafael Martins de Oliveira, acusado de tentar viabilizar o plano Punhal Verde e Amarelo, que previa a prisão e execução de autoridades.
Cid disse ainda que Moraes foi “muito criticado” durante em reunião de militares das Forças Especiais do Exército em novembro de 2022.
Segundo o delator, Bolsonaro sabia que coronéis preparavam carta para pressionar o então comandante do Exército, Freire Gomes, a aderir ao golpe.
Cid declarou ainda que Bolsonaro tinha expectativa de encontrar fraude nas urnas. Na visão do delator, o objetivo era usar a irregularidade para convencer militares a dar golpe de Estado após a vitória de Lula na eleição.
Paulo Sérgio Nogueira
O ex-ministro da Defesa pediu desculpas pelos ataques que fez ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante uma reunião ministerial em 2022 e disse que Alexandre de Moraes “facilitou sua vida” depois que assumiu a presidência da Corte.
Alexandre Ramagem
Moraes questionou o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) sobre textos com ataques as urnas encontrados em seu computador e celular. O agora deputado federal respondeu que os documentos eram pessoais e não foram compartilhados com ninguém. “O senhor escrevia uma carta ao presidente e não enviava?”, rebateu o ministro.
Ramagem negou que Abin tenha sido utilizada para espionar autoridades A Polícia Federal afirma que o órgão foi usado para a produção de notícias falsas e o monitoramento ilegal de autoridades, inclusive por meio do software de geolocalização First Mile.