30 de junho de 2025
Politica

Bolsonaro fez uma confusa defesa política num julgamento que não será ‘técnico’

No exercício de sua autodefesa no julgamento do STF o ex-presidente Jair Bolsonaro fez jus à fama de “autêntico”. Deixou claro que chegou à Presidência sem saber muito bem como, governou no improviso sem saber muito bem como e agora tenta livrar-se da cadeia sem saber muito bem como.

Ele surge desse interrogatório como um personagem quase literário. Para usar a imagem do filme do mesmo nome, um Macunaíma parido com farda em vez de fralda. Nas entrelinhas reconhece ter sido o pior adversário de si mesmo. A ponto de se desculpar.

Espera-se que seja “técnico” o julgamento de Bolsonaro. Esperança inútil, pois o que se julga são atos políticos, derivados de contexto histórico político, no qual uma crescente e relevante parcela da sociedade enxerga o julgador como uma das instâncias políticas participantes no embate – portanto, com “lado”.

O ex-presidente da República Jair Bolsonaro, ao lado de seus advogados, durante depoimento ao ministro Alexandre de Moraes
O ex-presidente da República Jair Bolsonaro, ao lado de seus advogados, durante depoimento ao ministro Alexandre de Moraes

Por óbvio Bolsonaro esboçou uma defesa política frente a acusações de caráter criminal. Parte delas não só seus advogados consideram carentes de provas, assim como contestam o foro (deveria ser o plenário do STF), e o papel do ministro Alexandre de Moraes, ao mesmo tempo vítima, investigador e juiz.

O curioso é que essa defesa “política” passou longe de esgrimir argumentos sobre a legitimidade do processo, a consistência das decisões enquanto presidente da República, a natureza das suas convicções ideológicas, como os fatos se encadearam na linha do tempo. Bolsonaro nem de longe ensaiou um discurso do tipo “a história me julgará e absolverá”, capaz de transformar um tribunal em tribuna.

O que ele defendeu foi a causa própria e, sobretudo, pessoal. Tudo na figura do líder populista (não importa se direita ou esquerda) gira em torno de sua pessoa, na qual se fundem interesses de nação, Estado, do povo ou o que seja. Assim como a direita brasileira, goste disso ou não, no momento gira em torno de sua pessoa.

Bolsonaro exibiu-se no interrogatório como personagem muito mais reativo às circunstâncias da luta política do que capaz de conduzi-las. E, quando tentou, tropeçou no próprio temperamento (“minha retórica”), nas alterações de ânimo, na falta de convicções claras que lhe dessem rumo, na ausência de qualquer estratégia até mesmo quando admitiu ter procurado “alternativas” diante da vitória eleitoral do adversário.

Sua “piada” dirigida a Alexandre de Moraes, convidando-o para ser vice numa chapa para concorrer novamente a Presidência, é um brilhante momento cinematográfico. Moraes riu do que não deveria. O convite sugere que o autêntico Bolsonaro viu no algoz qualidades que tanto admira em quem manda segundo os próprios limites.

 

 

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