17 de agosto de 2025
Politica

A importância da legitimidade do Ministério Público na liquidação e execução de sentenças coletivas

Imagine milhares de vítimas de um mesmo dano ocorrido, por exemplo, em desastres ambientais ou em razão de contratos de adesão, bancários ou de planos de saúde, com cláusulas abusivas, ou do fornecimento ao mercado de consumo de produtos ou serviços com vícios, sendo obrigadas a ajuizar demandas judiciais individuais, uma a uma, para receber o que a Justiça já reconheceu como direito delas em uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público.

É o que pode acontecer se o STF não der provimento ao RE 1.449.302, que trata do Tema 1270 de repercussão geral. O julgamento, que iniciou no mês de maio de 2025, foi interrompido em razão do pedido de vista do Ministro Flavio Dino, e retornará à pauta no dia 13 de junho de 2025. Dois votos foram proferidos até o momento. O Ministro Relator Dias Toffoli votou contra a legitimidade do Ministério Público e o Ministro Alexandre de Moraes abriu divergência.

A controvérsia gira em torno de uma pergunta simples: o Ministério Público, mesmo tendo sido o autor da ação civil pública, pode ou não promover a liquidação e a execução de uma sentença coletiva — aquela que beneficia um grupo de pessoas que sofreu o mesmo tipo de dano?

O STJ, em decisão recente, disse que não. Na visão daquela Corte, mesmo que a sentença tenha sido conquistada em uma ação civil pública proposta pelo próprio Ministério Público, caberia exclusivamente às vítimas ou seus herdeiros dar andamento à fase final do processo para receber a indenização. Na prática, isso significa obrigar cada vítima a contratar advogado, ajuizar nova ação e enfrentar novamente todas as dificuldades do sistema de Justiça — algo inviável para a maioria dos brasileiros, especialmente os mais pobres e vulneráveis.

Essa decisão, se mantida, enfraquece a lógica do processo coletivo brasileiro, pautado na garantia de acesso à Justiça e na prestação jurisdicional eficiente.

A Constituição é clara ao conferir ao Ministério Público o dever de defender os direitos sociais e os interesses dos grupos vulneráveis (art. 127 da CF). E o STF já reconheceu essa legitimidade em várias decisões anteriores, inclusive para defender direitos individuais homogêneos — que são aqueles direitos que, embora pertencentes a indivíduos distintos, decorrem de uma causa comum, como cláusulas abusivas em contratos ou danos ambientais.

Negar ao Ministério Público essa atuação coletiva significa isolar as vítimas, fragmentar a Justiça e tornar a reparação de danos algo dificilmente alcançável para muitos.

Permitir a atuação do Ministério Público na liquidação e execução de sentenças coletivas é reconhecer que o interesse social não desaparece quando a sentença é proferida.

O Ministro Alexandre de Moraes foi preciso ao indagar a “quem aproveitaria a inação do Ministério Público, negando-se-lhe a legitimidade para buscar a concretização de direitos de especial relevância social já reconhecidos em sentença genérica? A quem interessaria restringir ou limitar a efetiva tutela coletiva de direitos individuais homogêneos de interesse social? Apenas ao causador do ato ilícito”. Além disso, pontuou que “não seria proveitoso às vítimas pela falta de concretização de seus direitos, ao Poder Judiciário pela multiplicação de demandas, à Justiça em si pelo tratamento não isonômico de casos semelhantes ou idênticos, e ao próprio interesse social pela falta de efetividade do sistema jurídico”.

Em prol da racionalização e da eficiência da prestação jurisdicional, bem como a fim de se garantir a isonomia, a duração razoável do processo e a efetiva tutela dos interesses sociais na fase de executiva, de concretização dos direitos afirmados na sentença, espera-se que prevaleça o voto do Ministro Alexandre de Moraes, para que se consolide a legitimidade do Ministério Público para a promoção da liquidação e da execução coletiva da sentença genérica que versa sobre direitos individuais homogêneos, nos termos do artigo 127 da Constituição Federal.

 

 

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