Gilmarpalooza escala seis ministros do STF e executivos do BTG Pactual, banco com ações na Corte
BRASÍLIA – A pouco menos de 20 dias para a edição deste ano do Fórum de Lisboa, evento organizado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, apelidado de “Gilmarpalooza”, seis ministros da mais alta Corte já foram anunciados como palestrantes, assim como três representantes do alto escalão do BTG Pactual, banco que é parte em processos no STF.
Em nota, a organização do evento disse que “a participação de executivos de empresas se dá exclusivamente na condição de palestrantes convidados para contribuir com discussões temáticas de interesse público e sem quaisquer contrapartidas”. “A escolha dos nomes segue critérios de relevância acadêmica e técnica, definidos por uma curadoria plural e independente”, completou.
A organização do Fórum tem divulgado diariamente os nomes de peso da política, do Judiciário, da advocacia e do mundo dos negócios que viajarão a Lisboa para falar no evento. Dos 11 ministros do STF, devem estar presentes no Fórum o presidente Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, André Mendonça, Dias Toffoli, Flávio Dino e o próprio Gilmar Mendes.

Dentre as empresas privadas, BTG, Eletrobras, Grupo Yduqs e Light, todos com processos em tramitação na Suprema Corte, tiveram representantes anunciados como palestrantes no Gilmarpalooza. O banco enviará à capital portuguesa a sócia Bruna Marengoni, o diretor jurídico, Bruno Duque, e o chairman, André Esteves, que já foi preso a mando de ministro e teve o seu processo arquivado pelo STF por falta de provas.
A presença de executivos da cúpula do BTG mostra o estreitamento de laços entre a instituição financeira e o evento liderado por Gilmar Mendes sob a batuta do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), instituição da qual Gilmar é sócio-fundador. A Light, a Eletrobras e Yduqs serão representadas, respectivamente, pelo CEO, pelo o vice-presidente de regulação e relações institucionais e pela vice-presidente do grupo.
Na edição do ano passado, o BTG ofereceu um “happy hour” fora da agenda oficial do evento para autoridades do Judiciário e Legislativo no luxuoso restaurante SUD Lisboa. Como mostrou o Estadão na época, o coquetel foi disputado entre advogados e lobistas. O local foi pensado para que as autoridades e os empresários tivessem mais privacidade.
Juristas críticos deste tipo de interação entre empresários e magistrados apontam que esse eventos geram acesso desigual entre partes processuais e possíveis conflitos de interesse.
O banco de investimentos é parte em dois processos em tramitação no STF. Em um deles, ainda em tramitação, a instituição não responde diretamente a acusações e figura apenas como intimada em uma reclamação trabalhista do Banco Pan, sob relatoria do ministro André Mendonça, contra decisão que reconheceu vínculo empregatício de uma funcionária terceirizada.
Já o outro processo, encerrado definitivamente na última sexta-feira, 14, tinha valor de causa estimado em R$ 300 mil e houve decisão contra o BTG.
O BTG apresentou um agravo ao STF contra decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que identificou responsabilidade solidária do banco em fraudes trabalhistas relacionadas a atraso de salário e não pagamento de verbas rescisórias de um trabalhador da Drogaria Mais Econômica, cuja massa falida foi gerida e, posteriormente, vendida pelo BTG para a empresa de investimentos Verti Capital.
O BTG afirmou na ação que o trabalhador não apresentou provas da relação entre a instituição e a drogaria, mas os argumentos foram rejeitados pelo ministro Luiz Fux em decisão monocrática e final no dia 22 de maio. O STF baixou definitivamente os autos do processo para o TST, a quem caberá cumprir a decisão original contra o banco.
Em nota, o banco afirmou que, “como qualquer empresa referência em seu mercado de atuação“, é ”frequentemente convidado a participar de eventos diversos que abordam temas relevantes para o Brasil e o mundo”. O BTG disse ainda que os assuntos abordados no Fórum “são parte da expertise de porta-vozes do Banco” e adicionou que não é patrocinador do evento, arcando com as despesas de seus executivos sem recebimento de cachê ou outros recursos.
A empresa de energia Light, outra instituição cujo CEO foi anunciado como palestrante do Gilmarpalooza, é parte em três recursos extraordinários que tramitam no STF. Uma dessas ações era relatada pelo ministro Luís Roberto Barroso e passou para a relatoria de André Mendonça — os dois ministros vão viajar a Lisboa para participar do Fórum. Procurada, a empresa não se manifestou.
No processo, a Light disputa contra a Concessionária da Rodovia Presidente Dutra e saiu vencedora nas votações em plenário realizadas até o momento. O litigio entre as duas empresas discute a impossibilidade de concessionárias de rodovia cobrarem tarifa de empresas prestadores de serviços de energia elétrica por utilizarem as chamadas “faixas de domínio”, que é a área sobre a qual se assentam todos os elementos de uma rodovia, como postes, por exemplo.
O caso segue em tramitação no STF com diversos embargos e, na votação mais recente em plenário virtual, Mendonça votou contra embargo da Concessionária da Rodovia Dutra, mas o julgamento foi suspenso por um pedido de vista de Gilmar Mendes.
Já a Eletrobras é corréu (litisconsorte passivo) em um processo movido pelo Estado de Alagoas contra a União por “ter deixado, há mais de 20 anos, de realizar a privatização” da Companhia Energética de Alagoas (CEAL), que é subsidiária da empresa de geração e transmissão de energia. A causa é estimada em R$ 1 milhão e tramita sob relatoria do ministro Cristiano Zanin. Procurada, a empresa não respondeu ao Estadão.
A última empresa anunciado como participante do Fórum foi o grupo Yduqs, que gere diversas instituições de ensino privadas e tem uma de suas empresas, a Estácio, respondendo a 12 processos no STF sob relatoria de Gilmar Mendes, Flávio Dino, Dias Toffoli, André Mendonça e Nunes Marques.
Em nota, o Yduqs afirmou que a sua vice-presidente, Cláudia Romano, vai participar do Fórum de Lisboa representando, além do grupo, Sindicato das Entidades Mantenedoras do Estado do Rio de Janeiro (SEMERJ, do qual é presidente) e o Instituto Yduqs. “Temos processos internos para validação dessas participações e não enxergamos conflito”, afirmou.