‘O desabafo é a confissão’, diz Eduardo Kuntz sobre conversas com Mauro Cid ‘Gabriela’
O advogado criminalista Eduardo Kuntz afirma que as conversas entregues por ele ao Supremo Tribunal Federal (STF), atribuídas ao tenente-coronel Mauro Cid, desmontam a delação do ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
“Os diálogos deixam claro que não houve voluntariedade e espontaneidade, requisitos essenciais para a licitude da colaboração”, defende.
A defesa de Mauro Cid informou ao Estadão que não analisou os diálogos e não confirmou a autenticidade das mensagens. Também disse que foi Kuntz quem procurou a família do tenente-coronel. Os advogados disseram que vão aguardar a conclusão da investigação determinada pelo STF para se manifestar.
Em entrevista ao Estadão, Kuntz afirma que considera ilícito o acordo de delação de Mauro Cid. “O desabafo é a confissão, estando à vontade para dizer a verdade.”

As conversas são de janeiro de 2024. O criminalista afirma que decidiu torná-las públicas agora por “estratégia”. O material foi encartado na ação penal contra o núcleo três – ou “núcleo de ações coercitivas” – do plano de golpe.
Kuntz afirma que cogitou expor as mensagens antes, no inquérito sobre a falsificação dos cartões de vacina, mas recuou depois que a investigação foi arquivada.
Mauro Cid teria usado um perfil no Instagram em nome de “Gabriela” (@gabrielar702) para conversar com o advogado. A conta não está mais disponível.
Kuntz afirma que foi o tenente-coronel quem o procurou para sondá-lo sobre a possibilidade de assumir sua defesa.
O ex-ajudante de ordens estava proibido de manter contato direto com outros investigados, mas não com advogados.
“Nunca houve um leva e trás de informação. Cid nunca me pediu para levar nenhum recado”, afirma Kuntz.
O advogado pediu ao STF a anulação do acordo de colaboração. Ele defende o coronel Marcelo Câmara no inquérito do golpe.
Em depoimento à PF na semana passada, Mauro Cid negou ter usado o perfil no Instagram. A primeira vez que ele foi questionado sobre os diálogos foi no seu interrogatório na ação do plano de golpe. O tema foi levantado pela defesa do ex-presidente.
Não é a primeira vez que a delação premiada do tenente-coronel é ameaçada. Em março de 2024, a revista Veja divulgou áudios em que Mauro Cid criticou a Polícia Federal e o ministro Alexandre de Moraes pela condução das investigações e afirmou ter sido pressionado a confirmar uma “narrativa pronta”.
No interrogatório conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes, no dia 9 de junho, o militar justificou que fez “um desabafo de um momento difícil” e reiterou todo o conteúdo de sua delação.