1 de julho de 2025
Politica

Único imóvel de espólio é impenhorável quando serve de moradia aos herdeiros; entenda decisão do STJ

Decisão da 4ª Turma fortalece proteção à moradia familiar mesmo durante o inventário, com base na Lei do Bem de Família e no princípio da saisine.

Uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trouxe novo fôlego à proteção jurídica da moradia dos herdeiros durante o processo de inventário. A 4ª Turma da Corte reafirmou que o único imóvel deixado por pessoa falecida e que esteja sendo utilizado como residência por seus herdeiros é impenhorável, mesmo que ainda não tenha havido a partilha dos bens.

A controvérsia surgiu em uma ação na qual credores tentavam penhorar o único imóvel pertencente ao espólio, alegando a ausência de proteção legal diante da falta de partilha formal. O imóvel era ocupado por familiares do falecido. A medida foi inicialmente autorizada pelo juízo de primeiro grau e confirmada pelo tribunal estadual, o que levou os herdeiros a recorrer ao STJ.

O relator do caso, ministro Antonio Carlos Ferreira, destacou que a Lei nº 8.009/1990, que trata da impenhorabilidade do bem de família, é clara ao proteger o imóvel utilizado como residência da entidade familiar, sendo esta proteção uma norma de ordem pública. O fato de o imóvel ainda integrar o espólio — e não ter sido formalmente transferido aos herdeiros — não altera sua natureza de bem de família.

“Com a abertura da sucessão, os herdeiros passam a ocupar a posição jurídica do falecido, nos termos do artigo 1.784 do Código Civil, de modo que o imóvel, se antes era protegido da penhora por ser bem de família, continua assim mesmo após o falecimento”, afirmou o ministro relator em seu voto.

A Turma entendeu que a finalidade social do bem deve prevalecer, especialmente quando está demonstrado que o imóvel é o único bem deixado pelo falecido e que continua servindo de moradia para seus herdeiros. Para os ministros, admitir a penhora nesse contexto seria esvaziar o alcance da legislação protetiva, violando o direito à moradia e a dignidade da pessoa humana.

Princípio da saisine

O fundamento central da decisão é o princípio da saisine, previsto no artigo 1.784 do Código Civil, segundo o qual a herança é transmitida automaticamente aos herdeiros com a morte do autor da herança. Isso significa que, independentemente de partilha ou inventário concluído, os bens são imediatamente adquiridos pelos herdeiros, inclusive os direitos e deveres associados a eles.

Na prática, o STJ entende que essa transmissão automática inclui também a proteção legal do imóvel como bem de família, desde que mantida sua função de residência.

Credor pode cobrar por outros meios

A decisão do STJ não impede que o credor busque o adimplemento da dívida por outros meios. A impenhorabilidade não elimina a obrigação de pagar, mas apenas restringe a possibilidade de penhora do imóvel utilizado como moradia. “A impenhorabilidade não se confunde com a extinção do crédito”, frisou o relator.

Esse entendimento reafirma precedentes da própria Corte Superior, que em diversas ocasiões já considerou impenhorável o único imóvel do espólio ocupado por familiares, em linha com o compromisso do Judiciário com a proteção à moradia.

Segurança jurídica para sucessões

Para especialistas, a decisão é um marco importante para famílias que enfrentam o inventário com poucos bens e destaca a necessidade de orientação jurídica qualificada. “A jurisprudência do STJ tem sido firme em preservar o direito à moradia, mesmo em contextos sucessórios sensíveis. Essa proteção é essencial para garantir que os herdeiros não fiquem desamparados em razão de dívidas que, muitas vezes, sequer conheciam”, afirma a advogada Mariana Borges, especialista em Direito das Sucessões.

A decisão também serve de alerta para os credores: antes de buscar a penhora de bens pertencentes a espólios, é necessário avaliar sua função social, sob pena de frustração da execução por impenhorabilidade legal.

 

 

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