Lula avalia ‘lavar as mãos’ para não sancionar nem vetar projeto que amplia número de deputados
BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode lavar as mãos sobre o projeto de lei que aumenta o número de deputados federais de 513 para 531, aprovado na semana passada pelo Congresso. Lula avalia a possibilidade de deixar vencer o prazo para sanção do projeto, que vence no próximo dia 16, sem se manifestar. Neste caso, a promulgação do texto caberá ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Trata-se da mesma estratégia adotada no mês passado, quando o presidente ignorou o prazo para sanção do projeto que fixou o “Dia da Amizade entre Brasil e Israel” em 12 de abril por causa de atritos na relação com o país comandado por Benjamin Netanyahu. Alcolumbre, que é judeu, sancionou então a proposta, no último dia 25.

Lula ainda não tomou uma decisão final sobre o projeto que eleva o numero de deputados federais e tem ouvido opiniões jurídicas. A ausência de manifestação do presidente, após o prazo estabelecido, é chamada de sanção tácita. Se essa tática for de fato adotada, o silêncio do chefe do Executivo indicará que ele não quer enfrentar o desgaste de dar o sinal verde para uma medida extremamente impopular.
O imbróglio ocorre na esteira da crise entre o governo e o Congresso após Lula recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), na terça-feira, 1, para manter o decreto que aumenta o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A Câmara e o Senado derrubaram a proposta, considerada fundamental pela equipe econômica para o ajuste fiscal e o equilíbrio das contas.
Lula não escondeu a irritação com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), classificando como “absurda” a iniciativa do deputado de pautar o projeto para derrubar um decreto editado por ele. O presidente alega que o Congresso invadiu as suas prerrogativas e que, se não recorresse ao STF, não governaria mais.
É nesse cenário de turbulências que Lula precisará tomar sua nova decisão. Além de não se manifestar sobre a proposta que amplia o número de deputados, ele também pode vetar o texto.
Auxiliares do presidente argumentam, porém, que essa alternativa equivaleria a jogar mais combustível na crise com o Congresso. Desde que a briga começou, as redes sociais foram inundadas por posts favoráveis e contrários ao aumento do IOF. O PT adotou o discurso de “justiça tributária”, impulsionando o mote de “ricos contra pobres” em nova edição do “nós contra eles”.
Dois interlocutores de Lula disseram ao Estadão que ele só vai se debruçar sobre esse assunto no fim da próxima semana. O presidente está em Buenos Aires, onde participa da Cúpula do Mercosul.
O impacto estimado para os cofres públicos com a ampliação do número de deputados ultrapassa R$ 140 milhões anuais, por causa do “efeito cascata”.
Um levantamento do Estadão/Broadcast mostrou que o projeto abre brecha para a criação de 30 novas vagas de deputados estaduais, que podem custar R$ 76 milhões aos Estados. A cifra vai se somar ao gasto extra de R$ 64,8 milhões na Câmara.
Na prática, o prazo dado pelo STF para que o Congresso estabelecesse uma nova distribuição de cadeiras, com base no Censo de 2022, terminaria em 30 de junho. Mas essa configuração não necessariamente deveria ocorrer com o aumento do número de deputados. Agora, a mudança valerá para as eleições de 2026.