Prisão para quem agride médicos, clama presidente da Associação Paulista de Medicina
“O agressor tem que ser punido, se não houver uma real punição isso vai continuar, os médicos vão continuar sendo atacados em pleno exercício de sua atividade.” O alerta é do presidente da Associação Paulista de Medicina, Antonio José Gonçalves, chocado com a onda de violência contra médicos nos plantões de unidades de saúde por todo o País.
Dados oficiais, colhidos pelo Conselho Federal de Medicina a partir de registros em delegacias de Polícia, indicam que a cada duas horas um médico sofre algum tipo de agressão – espancamento, xingamento, humilhação, ameaça, injúria, desacato, difamação e até furto. Desde 2013, início da série histórica, já se acumulam 40 mil ataques contra médicos em trabalho.
Os acusados alegam, na maioria dos casos, demora no atendimento e também questionam diagnósticos e tratamentos.
Gonçalves ainda está perplexo e revoltado com o caso recente de uma médica espancada por uma paciente em Juiz de Fora, Minas. Ela sofreu traumatismo craniano e outros ferimentos graves. ‘É o retrato do que vem acontecendo em vários locais de trabalho em que profissionais de saúde sofrem vários tipos de agressão”, diz Gonçalves, em entrevista ao Estadão.
O dirigente da entidade dos médicos em São Paulo sugere ‘uma revisão do Código Penal’ e ‘aplicação com rigor da lei’. “A violência só aumenta no Brasil graças à impunidade.”
No fim de maio, a Câmara aprovou o projeto de lei 6749/2016 que prevê aumento da pena de crimes contra médicos e outros profissionais da área da saúde no exercício da atividade ou por conta dela. O texto impõe para casos de homicídio de 12 anos a 30 de reclusão – atualmente, a punição fica entre seis anos e 20.
Leia a íntegra da entrevista com Antonio José Gonçalves, Presidente da Associação Paulista de Medicina:
Recentemente, uma médica foi espancada por uma paciente em Juiz de Fora e sofreu traumatismo craniano e outros ferimentos graves. Por que essa brutal agressão?
Esse caso que aconteceu em Minas é o retrato do que vem acontecendo em vários locais de trabalho em que profissionais de saúde sofrem vários tipos de agressão. Segundo a médica, a paciente já apresentava comportamento agressivo na recepção da UBS (Unidade Básica de Saúde), em Juiz de Fora. Durante a consulta, a paciente teria não aceitado algumas orientações da profissional e se irritou com a falta de uma data na receita. De repente, passou a chutar a cabeça e o tórax da médica. A mulher também teria usado uma pedra, que a polícia encontrou no consultório. Essa atitude é absurda. Difícil saber o que passou pela cabeça dessa paciente, mas a revolta, provavelmente, pode estar ligada ao tempo de espera na unidade de saúde. Seja o que for, não justifica. A prefeitura transferiu a médica para outra unidade. Mas isso não basta. É preciso investigar e tomar medidas judiciais severas.
Dados oficiais indicam que a cada duas horas um médico é alvo de ameaça, injúria, desacato, difamação, lesão corporal e até furto. O que está acontecendo?
Acredito que são vários fatores. As unidades de saúde, principalmente públicas, muitas vezes apresentam falta de médicos e problemas de infraestrutura. Outra coisa é que ainda existe uma cultura de buscar atendimento para casos mais simples, muitas vezes para conseguir atestado. Isso lota as UBS’s, UPA’s e pronto socorros. A falta de recursos para diagnóstico também causa descontentamentos. O estresse, ansiedade, depressão, problemas de saúde e afastamento do trabalho prejudicam a qualidade do serviço prestado. É importante também atender o paciente com atenção e de forma humanizada. O descontentamento, muitas vezes por calotes, salários baixos e excesso de trabalho não justificam o mau atendimento.
A Câmara aprovou um projeto que impõe penas mais severas a quem ataca médicos no exercício da profissão ou por conta dela. Considera suficiente para reduzir as hostilidades?
A violência só aumenta no Brasil graças à impunidade. O fato de ter penas mais severas é importante. O país precisa ter uma revisão do Código Penal e aplicar com rigor a lei. O profissional está ali para servir ao paciente e não para ser agredido. A implementação de protocolos de segurança, treinamento de equipes, melhoria da comunicação e do fluxo de atendimento também são importantes.
O sr acredita que uma lei mais rigorosa poderá inibir os agressores?
Se os agressores não forem punidos de verdade, isso vai continuar. A pessoa que agrediu tem que responder na Justiça, ser presa e cumprir a pena. É preciso ainda garantir que os profissionais se sintam seguros para denunciar os casos de violência, sem medo de represálias.

Desde 2013, a polícia em todo país registrou quase 40 mil ocorrências de violências contra médicos. Os agressores não são punidos?
A cada duas horas um médico passa por uma situação de violência. Muitos pacientes e acompanhantes acham que o profissional é o representante oficial de toda a cadeia de Saúde, quando na realidade, ele é um mero prestador de serviço. A maioria dos casos ainda não é denunciada e, por isso, os agressores ficam impunes.
Como os acusados se explicam à Justiça sobre essa onda de abusos? O que alegam?
Os usuários costumam se queixar da demora no atendimento e questionam os diagnósticos e tratamentos. O paciente precisa entender que nem sempre a primeira consulta resolve totalmente. É comum que exames sejam solicitados e com troca de medicamentos
Onde ocorre a maior incidência de episódios assim?
São Paulo registrou a maioria das ocorrências em 2024, 26% do total. Foram 832 boletins de ocorrência. Quase 50 por cento das agressões contra médicas.Os cinco Estados com mais casos são Paraná, Minas Gerais, Santa Catarina, Bahia e Amazonas.
Os médicos podem recorrer a algum canal para denunciar abusos que sofrem?
A Associação Paulista de Medicina mantém um canal de comunicação de defesa profissional que pode ser acessado por aqueles que sofrem agressão. O profissional recebe assistência jurídica e apoio psicológico através do e-mail defesa@apm.org.br.