Tarifaço de Trump põe agronegócio em choque com bolsonarismo
O tarifaço anunciado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com a imposição de sobretaxa adicional de 50% sobre os produtos brasileiros, coloca o agronegócio em choque com o bolsonarismo. O setor é historicamente aliado ao ex-presidente Jair Bolsonaro e ao movimento de direita do seu entorno.
Agora, contudo, empresários e políticos do ramo se veem numa encruzilhada: precisam contestar a medida unilateral de Trump, mas sem reconhecer as digitais do bolsonarismo no movimento que vai impactar fortemente a economia do campo.
Esse dilema vai testar a solidez da relação do setor com o ex-presidente e até mesmo com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), apontaram, sob reserva, lideranças empresariais e políticas do agronegócio à Coluna do Estadão/Broadcast.
Na carta em que anunciou o tarifaço ao governo brasileiro, na quarta-feira, 9, Trump apontou expressamente a perseguição do Brasil a Bolsonaro. O deputado licenciado Eduardo Bolsonaro, filho do ex-presidente, usou a taxação para cobrar do Congresso a aprovação de uma anistia ao pai, réu no Supremo Tribunal Federal (STF) na ação penal do golpe.

‘Tiro no pé’
“Um tiro no pé que a família Bolsonaro deu no seu principal reduto eleitoral”, afirmou o representante de uma entidade do agronegócio. Na eleição de 2022, Bolsonaro derrotou Lula em 77 dos 100 municípios mais ricos do agronegócio do País.
Parte do empresariado esperava mais pragmatismo dos políticos de direita na relação com os Estados Unidos, tendo ciência de que o setor seria um dos mais afetados pelas medidas protecionistas do líder norte-americano.
“O momento exigia cautela e afastamento. O próprio Trump coloca o setor agrícola e privado dos EUA em primeiro lugar, ante questões políticas”, observou uma liderança dos exportadores.
Um empresário do agronegócio paulista ressaltou que o governador paulista admitiu que o tarifaço de Trump terá impactos negativos para São Paulo. “Esse reflexo para São Paulo deveria ter sido pensado lá atrás, quando Tarcísio colocou o boné na cabeça”, afirmou, em referência ao adereço “Make America Great Again”, usado pelo governador paulista para emular Trump.
O Estado é polo produtor de suco de laranja, café e carne bovina – setores citados entre os mais expostos às tarifas pelo elevado grau de exportação ao mercado norte-americano.
No Congresso, ‘golpe’ para a direita
Longe do microfone, integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a maior bancada do Congresso, fizeram críticas à atuação da família Bolsonaro no tarifaço.
Um dos lances mais comentados do episódio tem sido o vídeo de Eduardo Bolsonaro cobrando o Congresso a anistiar o ex-presidente, além de estimular aliados a agradecer Trump pela medida protecionista agressiva.
Um deputado da bancada mostrou irritação com a cobrança do filho de Bolsonaro, afirmando que não cabe ao deputado licenciado que deixou o País fazer qualquer exigência aos parlamentares.
Outro integrante da frente parlamentar classificou o tarifaço de de “duro golpe” para a direita, por centrar a pauta do grupo na figura da família Bolsonaro, seja pela anistia ao ex-presidente, seja pela citação direta na carta de Trump. Isso dificulta ainda mais a direita se organizar para 2026, segundo essa avaliação.
“Deputados bolsonaristas dizem nas redes sociais que a culpa é do Lula, mas no fundo sabem que o presidente dos EUA taxar o Brasil e praticamente exigir a absolvição do Bolsonaro é muito grave”, avaliou esse interlocutor do agro no Congresso.