Condomínios mais fortes: proposta do Código Civil pode expulsar morador antissocial e limitar Airbnb
A convivência nos condomínios pode estar prestes a mudar. Um projeto de reforma do Código Civil, atualmente em tramitação no Senado, promete dar mais poder às assembleias condominiais. Entre os pontos mais comentados da proposta estão a possibilidade de expulsar moradores com comportamento antissocial e o endurecimento das regras para locações por plataformas como Airbnb e Booking.
Hoje, a legislação já permite a aplicação de multas a condôminos que perturbam reiteradamente a paz coletiva, mas a expulsão ainda depende de interpretações judiciais. A proposta em debate pretende normatizar esse cenário. Se aprovada, a assembleia poderá deliberar, por dois terços dos presentes, pela exclusão do morador que tiver comportamento incompatível com a vida em comunidade, como agressões verbais ou físicas, ameaças, barulhos constantes ou danos às áreas comuns. A medida, no entanto, ainda dependerá de chancela judicial. O proprietário não perde o imóvel: ele continua com a posse indireta, podendo vendê-lo ou alugá-lo, mas fica impedido de residir no prédio.
A ideia é reforçar a autonomia dos condomínios, oferecendo instrumentos mais eficazes para garantir o bem-estar coletivo. Segundo juristas que acompanham a tramitação, a proposta apenas formaliza algo que tribunais já vêm permitindo em casos extremos. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo, há decisões favoráveis à expulsão de condôminos que ofereciam risco à integridade de funcionários e vizinhos.
Outro ponto sensível do texto trata das locações de curta temporada. O uso de imóveis residenciais para hospedagem temporária via plataformas digitais tem gerado conflitos em diversos edifícios pelo Brasil. Embora o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tenha decidido, em 2021, que condomínios podem proibir esse tipo de locação por deliberação interna, a legislação ainda é omissa.
Com a nova proposta, a regra se inverte: a locação por aplicativos como Airbnb passa a ser proibida por padrão e só poderá ser autorizada caso conste expressamente na convenção do condomínio ou seja aprovada por assembleia. Isso trará mais previsibilidade, mas exigirá dos moradores atenção redobrada na leitura dos documentos internos e, em muitos casos, a necessidade de revisão da convenção condominial para se adequar à nova realidade.
Além disso, a proposta amplia o poder de sanção contra a inadimplência. A multa por atraso no pagamento da cota condominial, que hoje está limitada a 2%, poderá chegar a até 10%, conforme decisão da assembleia. A medida tem como objetivo inibir a inadimplência crônica, mas deve acender um alerta em tempos de instabilidade econômica, podendo penalizar quem já enfrenta dificuldades para manter seus compromissos em dia.
A reforma também propõe a redução do quórum necessário para a aplicação de penalidades graves. Em vez dos atuais três quartos dos condôminos, bastariam dois terços dos presentes na assembleia. Isso facilita a tomada de decisões em prédios com baixo comparecimento às reuniões, mas também exige responsabilidade dos condôminos no exercício desse poder.
Especialistas alertam que, se por um lado as mudanças fortalecem a governança dos condomínios, por outro, exigem cuidado para que não se tornem instrumentos de perseguição ou arbitrariedade. “É preciso assegurar o devido processo legal e o contraditório. Medidas como a expulsão devem ser excepcionais e bem fundamentadas”, afirma um advogado especialista em direito condominial.
Com a aprovação do projeto, que ainda passará por debates e possíveis ajustes, os síndicos e moradores terão em mãos ferramentas mais claras para lidar com conflitos cotidianos. Ao mesmo tempo, cresce a responsabilidade dos condomínios em manter uma gestão transparente, equilibrada e alinhada aos princípios da convivência civilizada.
O novo Código Civil desenha um condomínio empoderado — mais eficiente para conter abusos, mais rígido quanto ao uso da propriedade e, potencialmente, mais harmonioso. Mas, como toda regra, seu sucesso dependerá da forma como será aplicada: com equilíbrio, bom senso e respeito à dignidade de todos os moradores.