Mísseis, helicópteros e canhões: como as ações de Trump podem afetar o Exército do Brasil
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Um fantasma ronda as Forças Armadas: o receio de que a agressão de Donald Trump ao Brasil para impor ao País seu desejo de salvar Jair Bolsonaro afete as compras de mísseis e helicópteros e a reposição de material fundamental para a Defesa. Pode ser só um temor, mas a situação tarifária pode piorar. O próprio presidente Trump anunciou a abertura de investigação contra o Brasil com base na “Seção 301” da Lei Abrangente de Comércio e Competitividade Americana.

Aplicadas contra a soberania da Justiça do Brasil para punir Bolsonaro e os demais réus do processo do golpe, a tarifa de 50% sobre as exportações brasileiras já foram uma espécie de sanção, condicionada ao fim imediato do processo contra o ex-presidente. A essa decisão, Trump ameaça com novas sanções.
Se o governo brasileiro negocia para evitar o pior no comércio, a incerteza criada pela ação americana é péssima para o futuro da cooperação militar entre os países em uma área em que aliados precisam, antes de tudo, serem confiáveis e idôneos. É verdade que, nos anos 1980, o Brasil foi ameaçado com o uso da mesma Seção 301 em razão da reserva de mercado para a informática e pelo desrespeito às patentes de remédios.
Mas era então em nome do livre comércio e dos interesses de empresas americanas que os EUA atuavam. Agora, querem submeter o País aos interesses pessoais de Bolsonaro e de Trump, que já foi sócio do blogueiro Paulo Figueiredo, uma das peças fundamentais na operação psicológica montada pelos golpistas para atacar o Alto-Comando do Exército em 2022 com o objetivo de impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva.

Em nome de um extremismo cego, há quem pretenda ver o circo pegar fogo, esquecendo que incendiada será a Nação. O cálculo americano nos anos 1980 era de que o uso da Seção 301 era mais efetivo para os interesses unilaterais americanos quando utilizada contra parceiros de envergadura intermediária em termos econômicos e comerciais.
Essa era a conclusão do embaixador Regis Arslanian, que foi negociador-chefe de Comércio do Brasil na Organização Mundial do Comércio. Para ele, o espírito da Seção 301 estava “calcado na premissa de que o recurso a seus mecanismos” só seria justificado na medida em que assegurasse “a obtenção de resultados tangíveis e positivos para o comércio e os investimentos norte-americanos”.
Isso é ainda mais verdadeiro em um governo como o de Trump, em que a separação entre o público e o privado é tão frágil quanto as joias recebidas por Bolsonaro. Assim, muitos se perguntam: se a prisão de Bolsonaro – destino mais provável do ex-presidente – se concretizar, o que Trump poderá fazer?

O principal receio dos militares é que americano resolva vetar o envio dos 12 helicópteros Black Hawk comprados por US$ 960 milhões pelo Brasil, em um contrato assinado em 2024 pelo governo de Joe Biden. O mesmo poderia acontecer com os 222 mísseis FGM-148F Javelin e as 33 lançadores encomendados aos EUA ao custo de US$ 74 milhões. E ainda inviabilizar a pretensão de compra de mísseis antiaéreos Stinger.
Em fevereiro, o comandante do Exército, general Tomás Miguel Ribeiro de Paiva, havia publicado uma decisão no Boletim do Exército 9/2025 no qual autorizava a assinatura da Carta de Oferta e Aceitação para a aquisição de mísseis Javelin e o adiantamento de US$ 329,2 mil, conforme previsto no cronograma de desembolso da Carta de Oferta e Aceitação. Trata-se de recursos financeiros que fazem parte do Programa Estratégico do Exército Forças Blindadas, que integra o Plano Estratégico do Exército 2024–2027
O anúncio dessa compra havia sido feita em dezembro durante a inauguração da primeira companha anticarros do Exército, em Osasco, na Grande São Paulo. Parecia ser o fim de uma novela que se estendia desde 2020, quando País tentou adquirir pela primeira vez a arma anticarro que equipou a Ucrânia nos primeiros meses de guerra contra a Rússia. Diante da demora americana para aprovar a venda, o País comprou cem mísseis israelenses Spike LR2 e dez lançadores.

A Companhia Anticarro possuirá a capacidade de mobilização estratégica
O Spike LR 2 é um míssil que usa o chamado sistema fire, observe and update (disparar, observar e atualizar) com auxílio de Inteligência Artificial. Por meio dele, seu operador pode optar pelo controle manual do início ao fim do voo ou travar o alvo por meio da IA. Neste caso, ainda é possível fazer ajustes no voo até o impacto. O problema é que em razão da guerra de Gaza e dos atritos entre os governos de Netanyahu e Lula, as compras de equipamentos de Israel, como as 36 viaturas obuseiros Atmos 2000, travaram.
O Exército escolheu o produto da empresa israelense em licitação concluída em 2024. O valor do contrato chegava a R$ 750 milhões. Mas a assinatura do contrato foi vetada pelo governo Lula. A novela sobre as viaturas blindadas de combate obuseiros de calibre 155 mm autopropulsados sobre rodas (VBCOAP-SR) se estende até hoje.
Ou seja, sem poder contar com Israel para obter equipamentos e com a possibilidade de os fornecedores americanos serem cortados, restaria à defesa procurar a indústria europeia ou a chinesa. Às voltas com o rearmamento da Alemanha, França, Reino Unido e Polônia, a indústria de defesa europeia teria poucas condições para atender o Brasil. Assim, uma possível sanção americana teria como efeito jogar o País nos braços da China, mesmo contra a vontade dos militares e do governo brasileiro.

O outro caminho seria buscar alternativas na base Industrial de Defesa do Brasil. O Boletim do Exército 28/2025, publicado no dia 11 de julho trouxe a portaria, a 1.562, assinada pelo general Richard Nunes, chefe do Estado-Maior do Exército, que pode ser vista como uma das respostas da Força a essa situação, ao menos para a capacidade anticarro no teatro sul-americano: a adoção oficial pelo Exército do Míssil Superfície-Superfície 1.2 Anticarro, o Max 1.2 AC), fabricado pela brasileira Siatt.
O 18.º Regimento de Cavalaria Mecanizado (Boa Vista) havia recebido em 2024 um lote de uma centena, direcionados para Roraima a fim de dissuadir a Venezuela. Com a doção oficial do equipamento, será possível à Força receber os integrantes futuros da família do Max 1.2 AC, inclusive a futura versão 4 do míssil anticarro fire and forget (atire e esqueça). A previsão é que ela passe a equipar, a partir de 2027, as novas companhias anticarros do Exército.
É pouco, no entanto, o que a indústria nacional pode fornecer para cobrir os estragos que o ataque de Trump e de Bolsonaro ao Brasil podem causar. A Colômbia enfrentou problema idêntico, em fevereiro, quando Trump suspendeu por 90 dias a ajuda militar à Colômbia, fato que devia ter servido de alerta para o governo Lula.

E essa é a ameaça que continua a pairar sobre a Colômbia. Após decidir comprar 18 caças Gripen, que devem ser montados no Brasil, o ministro da defesa da Colômbia, Pedro Sánchez, teve de afirmar não haver risco de que os EUA procurem inviabilizar o negócio em razão de 30% dos componentes do avião sueco serem de origem americana.
Além das armas, o ataque de Trump ao País poderia ter reflexo na cooperação militar entre os países, como por exemplo os exercício conjuntos, como a Operação CORE 25, prevista para ocorrer no fim do ano. Ou ainda a cooperação aeroespacial e naval, inclusive no combate ao crime transatlântico, como ocorreu durante a Operação Dontraz, da Polícia Federal, com a participação das marinhas do Brasil e dos EUA
A verdade é que, como disse então o coronel Paulo Roberto da Silva Gomes Filho, do Centro de Estudos Estratégicos do Exército, “é muito difícil substituir a indústria do ocidente, pois ”causaria um terremoto técnico e doutrinário. muita coisa teria que mudar, a um preço enorme”. É esse o terremoto que atingiria o Brasil.
Fora do poder, Bolsonaro e seus filhos usam uma potência estrangeira para chantagear o País e suas Forças. Colocam em risco o bem-estar comum e a segurança de todos. É difícil imaginar do que não seriam capazes, caso estivessem governando, em Brasília.
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