Tarifa de Trump acirra disputa entre Tarcísio e Eduardo e expõe divergência sobre próximos passos
O anúncio do presidente Donald Trump sobre o aumento nas tarifas aplicadas a produtos brasileiros acirrou uma disputa que ocorre nos bastidores entre o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL) e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Eles discordam sobre a estratégia política que deve ser adotada pelo grupo político do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A eleição presidencial de 2026 é o pano de fundo da disputa: Eduardo quer ser indicado como sucessor do pai, mas vê Tarcísio como favorito dos partidos do Centrão e do empresariado.
Procurados, nem Tarcísio nem Eduardo responderam a um pedido de posicionamento do Estadão até a publicação do texto.

Tarcísio tem buscado responsabilizar o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a diplomacia petista pelo aumento das tarifas, enquanto tenta abrir um canal com o governo americano através da embaixada no Brasil, apresentando dados e informações técnicas para ajudar na reversão da medida. O governador entende que a prioridade é evitar danos à economia brasileira. As tarifas afetam setores específicos da indústria e do agronegócio, principalmente em São Paulo.
Já Eduardo defende que o foco do bolsonarismo deveria ser responsabilizar o Supremo Tribunal Federal (STF) – ele apelidou a medida de “Tarifa Moraes”, em referência ao ministro da Corte – e que antes de qualquer tentativa de negociação com os americanos é preciso exigir uma anistia “ampla, geral e irrestrita”, que beneficiaria seu pai, os demais acusados pela tentativa de golpe de Estado e os presos pelo 8 de Janeiro.
Aliados de Eduardo dizem que o governador contrariou o deputado licenciado ao se reunir com o encarregado de negócios da embaixada dos Estados Unidos, Gabriel Escobar, em Brasília, para discutir os impactos do tarifaço. Interlocutores do governador, no entanto, afirmam que Bolsonaro, com quem Tarcísio almoçou na quinta e na sexta-feira, estava ciente do movimento.
Pela rede social X, Eduardo Bolsonaro disse que “tem gente que ainda acha que vai pôr panos quentes, mediar, fazer uma delegação de ‘alto nível’ e enviar para os EUA para falar com Trump. Acho muito difícil que seriam sequer recebidos neste momento. O problema não é econômico e todos sabem qual é a causa”.
Tem gente que ainda acha que vai pôr panos quentes, mediar, fazer uma delegação de “alto nível” e enviar para os EUA para falar com Trump. Acho muito difícil que seriam sequer recebidos neste momento.
O problema não é econômico e todos sabem qual é a causa. Apresentar uma, ainda… pic.twitter.com/tPNMZccncc
— Eduardo Bolsonaro🇧🇷 (@BolsonaroSP) July 11, 2025
Pouco depois, o influenciador Paulo Figueiredo, um dos aliados mais próximos de Eduardo e réu no STF na ação da trama golpista, publicou nas redes sociais que Tarcísio atrapalha “sem nem saber”. “Mas, enquanto o sistema tiver esperanças de que ele surja como o Salvador da Pátria intermediando um acordo com os EUA, não vão nem cogitar aquela que é a única solução real: a anistia ampla, geral e irrestrita”, escreveu.
Em suas declarações públicas sobre o tarifaço, Tarcísio não deu ênfase à anistia ou às críticas de Trump ao STF. Em coletiva a jornalistas na quinta-feira, 10, o governador foi questionado sobre o papel da Corte na retaliação de Trump e respondeu apenas que há “uma série de posturas que não condizem com a nossa tradição democrática e eu espero que o Brasil sente na mesa e resolva o problema das tarifas”. Ele também afirmou que qualquer candidato de centro-direita concederia indulto ao ex-presidente, se for necessário.
“Conversamos sobre as consequências da tarifa para a indústria e o agronegócio brasileiro, além dos impactos para as empresas americanas”, escreveu Tarcísio nas redes sociais após se encontrar com o encarregado de negócios da embaixada americana. “Vamos abrir diálogo com as empresas paulistas, lastreado em dados e argumentos consolidados, para buscar soluções efetivas”, acrescentou.
Criticada por Eduardo, a postura do governador foi elogiada por Carlos Bolsonaro, outro dos filhos do ex-presidente. “Já que quem deveria estar negociando vai exatamente na contramão, prejudicando a todos, humildemente parabenizo o Governador Tarcísio pelo ato”, escreveu ele, também no X.
Aliados do governador ouvidos pelo Estadão entendem que o caminho defendido pelo filho do ex-presidente tem potencial para jogar o empresariado contra Bolsonaro e o próprio Eduardo porque pode passar a impressão de que o interesse pessoal dos dois está acima do interesse nacional.
Um integrante da cúpula do PL, que também tem focado nas críticas a Lula, afirma que a estratégia do deputado federal licenciado dá “munição para a esquerda” e o coloca ainda mais na mira do STF, que está com inquérito aberto sobre a atuação de Eduardo em busca de sanções contra a Corte e Moraes nos Estados Unidos.
Acabo de me reunir com Gabriel Escobar, Encarregado de Negócios da Embaixada dos EUA no Brasil, em Brasília. Conversamos sobre as consequências da tarifa para a indústria e agro brasileiro e também o reflexo disso para as empresas americanas. Vamos abrir diálogo com as empresas…
— Tarcísio Gomes de Freitas (@tarcisiogdf) July 11, 2025
Para aliados de Eduardo, no entanto, a taxação fortalece o deputado federal ao demonstrar o poder de articulação do parlamentar entre o governo norte-americano. Na última segunda-feira, 7, após Trump defender Bolsonaro em uma publicação na rede social Truth Social, Eduardo afirmou que aquela “não seria a única vez” que ouviriam o governo dos Estados Unidos falar sobre o tema da “perseguição” no Brasil nesta semana. Dois dias depois, o republicano anunciou o aumento das tarifas.
Na carta enviada ao Brasil, o Trump exaltou sua relação com o ex-presidente e afirmou que o julgamento contra Bolsonaro “é uma caça às bruxas”. Segundo ele, a aplicação das alíquotas seriam, em parte, uma reação às ações do STF.
A despeito do que foi escrito pelo republicano, bolsonaristas buscam afastar a responsabilidade do tarifaço sobre as ações de Eduardo nos Estados Unidos, utilizando a narrativa de que o republicano “não tinha outra opção” se não taxar o Brasil. Apesar do otimismo do entorno de Bolsonaro, ainda há o temor sobre o resultado político gerado pela aplicação da alíquota. Nas redes sociais, a percepção entre os aliados é que a ação de Trump reverberou mal para o campo da direita.
Para correligionários, a postura de Eduardo tem como foco manter sua relevância política. O governador de São Paulo é hoje o principal nome da direita e o preferido do empresariado. Apesar de repetir publicamente que não será candidato à Presidência no próximo ano, Tarcísio tem sinalizado uma possível entrada na disputa. Ele também foi citado entre os governadores com quem o ex-presidente Michel Temer (MDB) conversou visando formar uma candidatura única da direita.
A decisão sobre quem será o candidato da direita caberá a Jair Bolsonaro. Segundo interlocutores, o ex-presidente passou a acompanhar com mais atenção as pesquisas eleitorais para embasar sua escolha, embora esse não seja o único critério. O senador Flávio Bolsonaro (PL) afirmou em entrevista à Folha de S.Paulo que o apoio do pai dependerá de um compromisso com o indulto. Segundo ele, o escolhido terá de se comprometer não apenas com o perdão ao ex-presidente, mas também com o enfrentamento ao STF, caso a Corte julgue o indulto inconstitucional.
A avaliação de Flávio, segundo aliados, é de que Tarcísio poderia oferecer esse respaldo, especialmente por seu bom trânsito entre os ministros da Corte. Ainda assim, eles entendem que qualquer nome da direita estaria disposto a conceder o indulto.