‘Piloto’: como o chefe do DNIT do Amapá usava o cargo para fraudar licitações, segundo a PF
A Operação Route da Polícia Federal, deflagrada na manhã desta terça-feira, 22, aponta que o superintendente do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT) no Amapá, Marcello Vieira Linhares, articulou, junto com Breno Barbosa Chaves Pinto, segundo suplente do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, um esquema de fraude nas licitações da autarquia que teria desviado cerca de R$ 60 milhões. Diálogos interceptados mostram que Linhares pedia a Breno que utilizasse sua influência com Alcolumbre para liberar verbas para o DNIT. Um chama o outro de ‘piloto’.
Linhares foi afastado do cargo por ordem do juiz Jucelio Fleury Neto, da 4ª Vara Federal Criminal do Amapá. Segundo a PF, ele se associou aos empresários Breno Chaves Pinto e Luís Otávio Fontes para ‘favorecer indevidamente suas empresas nas licitações da autarquia’.
O senador não é alvo da investigação. A PF e o Ministério Público Federal confirmam ‘ausência de qualquer indício de participação dolosa do parlamentar nos fatos apurados’.

De acordo com os investigadores, a operação financeira era baseada na montagem de pregões fraudados, com propostas fictícias que simulavam uma competitividade entre empresas rivais.
“Seis das nove empresas participantes não participaram ativamente da fase de lances, apresentando propostas com desconto nulo ou acima do preço de referência, comportamento alinhado com Propostas Fictícias ou de Cobertura”, afirma a PF sobre um processo de licitação.
A Operação Route destaca um contato próximo de Linhares com o representante das empresas de Breno e Luiz Otávio nos pregões do DNIT, Francisco Gomes Barbosa Júnior. Os policiais alegam que o superintendente afastado da autarquia no Amapá ‘orientava o pregoeiro, compartilhando documentos internos e ajustando estratégicas para o vencimento das licitações’.
Linhares também se comunicava com os empresários beneficiados. Em mensagens de outubro de 2023, interceptadas pela PF, ele pede que Breno, segundo suplente de Alcolumbre, interceda junto ao Senado para liberar recursos para a autarquia.
“Marcello solicita a Breno que fale com o senador Davi Alcolumbre para postar uma foto, e para dar uma pressão no governo para liberar nossos empenhos”, transcreve a PF.
A organização, segundo a investigação, tinha como principal alvo o contrato de obras da BR-156, que corta o estado do Amapá.
Outros diálogos foram resgatados pela PF. Conversas de WhatsApp entre o segundo suplente de Alcolumbre e Linhares ‘revelam uma proximidade pessoal’. Um chama o outro de ‘piloto’.
Em 23 de outubro de 2023, Breno encaminha o currículo de Elenice Rodrigues Fernandes para Marcello Linhares. Para a PF, o gesto ‘indica ingerência nos quadros do DNIT e possível conluio na designação de Elenice para a Coordenação de Engenharia sem processo seletivo’.
Uma conversa de 25 de outubro de 2023 mostra Marcello Linhares “agradecendo a Breno pela ampliação de repasses de R$ 30 milhões para R$ 58 milhões, atribuindo a melhora às ‘tratativas do nosso senador’.”
“Breno acompanha com interesse os fluxos de empenho e pagamento de contratos. Planilha de pagamentos compartilhada por Marcello evidencia empresas investigadas como LCM e consórcio SMSS”, destaca a investigação.
Ao decretar medidas de busca e apreensão contra os investigados, o juiz Jucelio Fleury Neto, da 4ª Vara Federal Criminal do Amapá, aponta que a ‘fraude em contratos licitatórios destinados à manutenção e recuperação de trechos da BR-156, rodovia federal de importância estratégica para o Amapá, notoriamente conhecida por seu histórico de atrasos e corrupção, configura grave ofensa à confiança da sociedade e aos pilares da República’.
“Trata-se de infraestrutura vital para o acesso da população a bens e serviços em uma região remota, cuja funcionalidade é intrínseca às necessidades básicas de seus habitantes.”
COM A PALAVRA, O SENADOR DAVI ALCOLUMBRE
Por meio de nota, o presidente do Senado disse que não possui relação com as empresas citadas na operação da PF, nem com a atuação do segundo suplente, alvo da apuração. “Alcolumbre reitera seu respeito às instituições e entende que todos os envolvidos devem prestar os devidos esclarecimentos à Justiça, respeitado o devido processo legal”, diz nota da assessoria do senador.
COM A PALAVRA, O DNIT
Em nota oficial, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) informou que ‘colabora com a investigação, visando a completa elucidação dos fatos’.
“As instâncias de integridade da autarquia também estão apurando os fatos a fim de adotar as medidas administrativas que forem necessárias. O Departamento repudia qualquer prática fraudulenta ou ato de corrupção e conta com uma Política Antifraude e Anticorrupção que, entre outros aspectos, deixa clara essa premissa. O DNIT está em permanente contato com os órgãos de controle e reafirma que pauta sua atuação dentro da legalidade e lisura, respeitando todos os princípios éticos da administração pública.”
COM A PALAVRA, MARCELLO LINHARES
O Estadão busca contato com a defesa do superintendente afastado do DNIT no Amapá. O espaço está aberto. (nalbert.antonino@estadao.com e fausto.macedo@estadao.com)
COM A PALAVRA, BRENO BARBOSA CHAVES PINTO
A reportagem busca contato com a defesa. O espaço está aberto.