9 de agosto de 2025
Politica

Aprender com a natureza

A história da humanidade reflete o estranhamento do ser humano com a natureza da qual faz parte. Como se fora um extraterrestre, o autoconsiderado racional se porta irracionalmente. Desmata, quer “corrigir” os rios e acaba com suas sinuosidades. Enterra córregos, asfalta, impermeabiliza as cidades. Tudo faz para que a natureza seja considerada um inimigo e não uma parte essencial de sua existência. Algo vivo, como ele próprio, o ser que se considera primícia da criação.

Há pessoas sensíveis, que já se relacionam adequadamente com a “Mãe Natureza”. Em todas as épocas. Francisco de Assis, considerado “o homem do milênio, no século XX”, chamava de irmãos o sol, a lua, a água, as árvores, os animais. Ainda hoje há quem “converse” com as árvores e são pessoas extraordinárias. Quem não se relaciona com a natureza perde uma parte formidável de suas experiências e pode enfrentar problemas emocionais que interferem na sua higidez mental.

Tímidas iniciativas de “soluções baseadas na natureza” despontam aqui e ali, principalmente em países mais adiantados no seu estágio civilizatório. Elas custam a chegar aos emergentes, onde a educação capenga e não tem sido levada a sério.

Mas existe hoje uma ciência que pode estimular essa retomada do imprescindível diálogo com o ambiente. Ela se chama biomimética. Ramo de pesquisa que busca traçar estruturas e funcionamentos da natureza, de modo a incorporá-los em produções e dificuldades humanas. As leis físicas, as leis biológicas, em regra as leis que regem as chamadas “ciências exatas”, funcionam perfeitamente. Ao contrário das regras estabelecidas pelos homens nas chamadas “ciências humanas”, que são falíveis por várias circunstâncias. Inclusive pela falta de comprometimento humano em honrar os compromissos assumidos. Ou seja: a lei positiva deveria ser uma relação necessária extraída da natureza das coisas. Mas é um texto normativo destinado a ser ignorado quando não interessar ao egoísmo. Somente no Brasil se pode falar em “leis que pegam e leis que não pegam”.

É muito importante que a insensatez dos que agridem a natureza, desmatam, poluem, tornam a Terra um espaço inabitável, aprendam com a natureza. A biomimética propicia estudos interdisciplinares que analisam a viabilidade e sustentabilidade dos mecanismos naturais. Veja-se o exemplo dos fixadores de velcro, inspirados em carrapichos globulares e hoje compõem vestimentas, acessórios e outros itens organizacionais.

O termo biomimética foi criado em 1997 pela bióloga e escritora Janine Benyus, no livro Biomimética: Inovação Inspirada pela Natureza (Cultrix, 2012) que o popularizou. Quem se detiver no estudo das soluções que a natureza encontrou para a sua subsistência neste planeta, sem dúvida muito ganhará. Observar como foi que a natureza solucionou algumas dificuldades auxiliará a humanidade a também encontrar respostas para as suas. A maior parte delas, criada pela própria inobservância do respeito que a natureza merece.

Somente olhos muito atentos e muito sensíveis conseguem enxergar a sapiência contida no funcionamento de tudo aquilo que compõe o ambiente. Quantas questões aparentemente insolúveis não podem ser enfrentadas se tivermos a humildade de tomar a natureza como mestra?

Sem dúvida, ela nos teria impedido de cometer delitos ecológicos assim como os praticados na maior parte das cidades brasileiras e, principalmente, no maior município do Brasil e da América Latina, São Paulo. Não teríamos rios que já não são corredores de água límpida, mas trágicos condutores de imundícies despejadas pela população naquele líquido sujo, turvo e malcheiroso.

Não teríamos enterrado milhares de córregos para substituí-los por asfalto, por onde correm diuturnamente milhões de carros. Não teríamos edificado a cidade que mais serve ao veículo egoísta chamado automóvel, geralmente com um só passageiro à direção, do que aos humanos. Teríamos insistido em ferrovias, em lugar do transporte movido por combustíveis fósseis. Aqueles que nos envenenam, que causam o aquecimento global e que condenam a humanidade a um não remoto ecocídio.

É preciso aprender com aqueles que tratam a natureza como parte necessária e indissolúvel de sua própria existência. Há muitos exemplos além do velcro. Outro foi o voo do pássaro martim-pescador, que resolveu o problema derivado da alta velocidade do trem-bala japonês. Foi uma descoberta oriunda do conhecimento e da paciência do engenheiro Eiji Nakatsu, que elaborou a solução para o barulho dos vagões. A coloração estrutural das asas das borboletas inspirou a maquiagem e a pintura de veículos. E a protuberância nas nadadeiras de baleias-jubarte resolveram a questão das pás de geradores eólicos.

Quanta coisa mais está à espera da observação, da pesquisa, do devotamento daqueles que respeitam a natureza, para solucionar entraves à melhor qualidade de vida? Sejamos humildes e prestigiemos a biomimética.

 

 

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