7 de agosto de 2025
Politica

A prática do clientelismo nas eleições no Brasil e o orçamento secreto

A prática clientelista não constitui uma abordagem inédita de conduzir a política, tanto no Brasil quanto na América Latina. Entretanto, muitos a veem como prejudicial ao processo democrático, que deveria implementar políticas públicas de maneira universal para os que atendem aos requisitos estabelecidos pela política em desenvolvimento, isto é, para todos os indivíduos que pertencem aquele Estado ou unidade político-geográfica onde a referida política pública foi executada e que cumprem os critérios de elegibilidade previamente definidos pela política pública em questão (Nunes, 2003). Entretanto, o clientelismo contrapõe-se a esta maneira de efetuar a distribuição dos recursos públicos, realizando essa repartição conforme os interesses daqueles que têm acesso aos bens públicos. A alocação acontece para aqueles que se inserem em uma teia de relações na qual ocorre a troca de favores políticos entre os participantes.

Conforme Nunes (2003), o clientelismo é uma ação que se contrapõe ao universalismo de procedimentos. Nesse modelo de relacionamento, estabelece-se uma conexão de clientela entre aqueles que controlam a liberação dos recursos e os que aproveitarão os benefícios proporcionados. Essa relação caracteriza-se por ser uma interação entre desiguais, gerando um vínculo de subordinação entre aquele que recebe a benesse e aquele que a concede. Para ele, o clientelismo constituía uma prática realizada entre patronos e agricultores. Os últimos encontravam-se em uma situação de subordinação em relação aos patronos, uma vez que não dispunham de acesso à terra e aos seus bens. Assim sendo, a relação clientelista consiste, invariavelmente, em uma ação de subordinação entre o cliente e seu patrono, tanto no contexto rural quanto no urbano.

De acordo com Nunes (2003), a disparidade na interação entre patrão e cliente cria vínculos pessoais entre os participantes dessa relação, que podem variar desde laços de compadrio até lealdades de caráter político. Essa relação assimétrica diminui a chance de se constituírem identidades de interesses coletivos entre os participantes da ação clientelista. De acordo com o autor, o cliente aprova de forma consciente as condições do contrato estabelecido com o patrono, configurando, desse modo, uma ação racional.

Conforme Nunes (2003), as interações no clientelismo são amplamente disseminadas, podendo envolver diversos itens no contexto da troca. Entretanto, cada item que é substituído possui referências às condições gerais dos grupos; ou seja, os produtos que são trocados são aqueles que os grupos requerem para permanecerem fiéis aos seus patronos. Essas transações são de caráter pessoal e criam promessas e expectativas de benefícios futuros. Na sociedade brasileira, a lógica da troca generalizada é aplicada a associações, instituições políticas, agências públicas, partidos e facções. É possível que existam grupos com relações de patrono-cliente; tais grupos consistem em estruturas nas quais diversos clientes se conectam a um patrono, configurando uma rede de relações de troca. Ademais, podem ocorrer pirâmides de patrono-cliente, que se caracterizam por estruturas nas quais vários líderes de grupos patrono-cliente estabelecem vínculos com outros agentes situados em níveis superiores da pirâmide. É possível, dessa maneira, constituir grupos políticos que firmam pactos para obter o quantitativo de votos requerido em um pleito eleitoral, além de realizar troca de favores entre os participantes da hierarquia.

É exatamente essa benesse que o orçamento secreto discutido no país pode gerar: uma interferência em prol de quem ocupa posições no poder legislativo. Aqueles que já se engajaram em uma eleição têm plena consciência de que o investimento necessário para obter votos não é substancialmente baixo. Esse valor pode ser reduzido conforme o grau de conhecimento e a relação que os eleitores possuem com o candidato concorrente ao pleito eleitoral. Esse envolvimento pode ocorrer por meio de serviços prestados à comunidade e/ou assistência a indivíduos com suas necessidades pessoais, como emprego, atendimento em unidades de saúde e até mesmo auxílio financeiro. O orçamento secreto fomenta a ação final, uma vez que o titular do poder dispõe de condições favoráveis para estabelecer a conexão entre a necessidade do indivíduo e sua resolução.

No Brasil, a maior parte dos municípios não gera empregos e condições adequadas para que seus habitantes consigam atender às suas necessidades de trabalho e renda. Nesse caso, as prefeituras são a principal fonte de emprego. Esse fenômeno acontece, sobretudo, nas cidades de pequeno porte com menos de 100 mil habitantes. Conforme informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 94,2% dos municípios encontram-se nessas circunstâncias.

Um outro elemento que impulsiona as práticas clientelistas é a presença, na esfera política, de domínios territoriais controlados por famílias que frequentemente alternam entre os espaços legislativo e executivo. Dessa forma, um ente federativo que se encontra no poder legislativo e possui interesses específicos em uma localidade onde um parente ocupa um cargo no executivo será beneficiado por meio da alocação de recursos públicos, o que potencializa as oportunidades de troca de favores.

Dessa forma, a elaboração do orçamento e sua alocação devem continuar a ser atribuições do poder executivo. Aquele que foi escolhido para ocupar uma posição no poder legislativo não demonstra preocupação com a maioria da população, mas sim com um grupo reduzido que assegura sua permanência no cargo; ao contrário, o líder do executivo, efetivamente, manifesta essa preocupação. Uma outra circunstância é a ausência de relatórios de prestação de contas acerca desses valores bilionários, o que intensifica as suspeitas sobre práticas clientelistas entre o legislativo e os eleitores.

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *