Disputa na base de Lula para o Senado abre espaço para avanço da direita no Nordeste
A esquerda enfrenta um dilema no Nordeste que pode afetar a estratégia do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a eleição ao Senado em 2026. Enquanto em algumas regiões do País os aliados do petistas estão com dificuldades para encontrar nomes para disputar a corrida contra bolsonaristas e representantes da direita, na região onde Lula sempre dominou os votos o problema é o excesso de nomes que querem entrar na corrida.

Esse maior volume de potenciais concorrentes pode acabar travando as negociações para as legendas que formam a base de Lula apoiarem um único nome. Essa diluição de forças pode favorecer candidatos que fazem oposição ao petista.
Em 2022, um racha entre candidatos do PSB e PDT, no Rio Grande do Norte, acabou abrindo espaço para a vitória de Rogério Marinho (PL), aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A disputa ao Senado é estratégica para ambos os lados. Lula quer ter mais cadeiras para evitar que o bolsonarismo conquiste maioria e force pautas como anistia pelos atos golpistas do 8 de janeiro e eventual impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal. Para isso, Lula busca alianças com partidos de centro, como mostrou o Estadão.
No Nordeste, essa aproximação com legendas do centro abriu espaço para uma grande quantidade de candidaturas. O Ceará é o Estado onde a base de Lula tem mais pré-candidatos: José Guimarães (PT), Eunício Oliveira (MDB), Júnior Mano (PSB), o presidente do Republicanos cearense, Chiquinho Feitosa, Domingos Filho (PSD) e o secretário da Casa Civil, Chagas Vieira.
Até o momento, a oposição lidera a corrida, puxada por por Ciro Gomes (PDT), que tem articulado com o PL de Bolsonaro. A aproximação se intensificou há um ano, quando o ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio decidiu apoiar André Fernandes (PL) na disputa pelo comando da prefeitura da capital cearense no segundo turno de 2024.
Cláudio se desfiliou do PDT e pretende se filiar ao União Brasil. Até agora, o cenário desenhado é uma aliança entre Tasso Jereissati (PSDB), Ciro Gomes, e Roberto Cláudio, que articulam uma frente de oposição entre o PL, União Brasil e PP. Estrategistas destacam que, se essa aliança se confirmar, poderá haver um cenário inédito, onde o candidato da oposição teria mais tempo de TV que a base do governo.
O deputado José Guimarães (PT), que está à frente das articulações para as eleições de 2026, minimiza o excesso de nomes aliados à Lula, afirmando que “os palanques estão praticamente constituídos”. Ele, que também tem interesse na vaga para a corrida ao Senado, avalia que há espaço para negociação da segunda vaga em disputa para senador ou vice-governador com MDB e PSD, desde que alinhadas com a reeleição de Lula.
O cientista político Antônio Lavareda alerta que a divisão entre esquerda e centro abre caminho para a direita em uma região historicamente lulista. Ele lembra que, em 2022, os votos de direita para Câmara dos Deputados no Nordeste foram proporcionalmente altos, equiparados ao resto do país.
“Qualquer fracionamento entre esquerda e centro permitirá à direita emplacar candidatos”, pondera o cientista político.
Cenário baiano
Na Bahia, o PT disputa duas vagas no Senado com o PSD. O senador Jacques Wagner tentará a reeleição e Rui Costa, que comanda a Casa Civil de Lula, também é cotado, ambos na coligação do governador Jerônimo Rodrigues (PT). O PSD, no entanto, quer reeleger o senador Ângelo Coronel.
“Nosso partido é grande. E um partido grande não pode servir somente de coadjuvante. Nós somos aliados do PT hoje na Bahia, não somos capachos”, afirmou Ângelo. O senador reconheceu que siglas não contempladas pelo PT poderiam unir forças com outros partidos de oposição para ganhar a eleição.
A articulação na Bahia também já envolveu a possibilidade de Jerônimo abrir mão da reeleição em favor de Rui Costa. O deputado José Guimarães se opôs à alternativa, destacando que os governos da Bahia, do Ceará e do Piauí são vitoriosos e têm direito de disputar a reeleição.
Em Pernambuco, João Campos (PSB) e Raquel Lyra (PSD) buscam apoio de Lula para o governo. Raquel aguarda posição do PSD nacional, que considera lançar o governador do Paraná, Ratinho Junior, à Presidência. Outros nomes que se desenham em torno de sua candidatura são do presidente do PL pernambucano, Anderson Fernandes (PL), do deputado federal Eduardo da Fonte (PP) e do ex-ministro do Desenvolvimento Armando Monteiro (Podemos).
Na ala de Campos, estão o senador Humberto Costa (PT), cuja reeleição é prioridade para Lula, o deputado estadual Miguel Coelho (União Brasil), o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho (Republicanos), e a ex-deputada federal Marília Arraes (Solidariedade). Interlocutores afirmam que o presidente tem defendido que a segunda vaga seja ocupada por Silvio, aliado do petista, também como uma estratégia de aproximação com o centro.
Contra Marília pesam suas duas derrotas recentes para os cargos de governadora e prefeita. Já Coelho pode perder espaço caso a federação entre União‑PP seja concretizada. Lideranças da federação rejeitam apoiar Lula, cenário que favorece Eduardo da Fonte.
Apesar do cenário, aliados do presidente minimizam a disputa no Nordeste e defendem que as duas vagas ampliam a chance de vitória da esquerda e do centro, mesmo com fragmentação. Segundo interlocutores, o presidente tem estimulado alianças com o centro por todo o País, mirando em candidaturas como os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro (PSD), e do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet (MDB), acreditando que podem atrair votos da direita mesmo com seu apoio.
Para Lavareda, outro ponto a ser considerado é o comprometimento com a anistia aos envolvidos no 8 de janeiro. Segundo ele, a pauta “pode atrair cerca de 20% dos votos. E isso pode ajudar a eleger candidatos de direita de outros partidos, mesmo hoje ‘moderados’ que precisem desses votos pra ganhar a eleição”.
No Maranhão, o governador Carlos Brandão (PSB) deverá permanecer no cargo, impedindo a candidatura do vice Felipe Camarão (PT), como previa uma articulação do então senador e atual ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino. Nesse cenário, o nome ventilado é o do sobrinho de Brandão, Orleans Brandão, secretário e pré-candidato a deputado federal. Guimarães reconhece a indefinição.
“É o único estado do Nordeste que as coisas estão desarrumadas. Mas tende a se arrumar. Na hora certa, o Lula chamará o feito à ordem”, afirmou o deputado.