19 de agosto de 2025
Politica

Como decisão de Dino pode beneficiar Moraes? O que dizem especialistas

RIO – O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu nesta segunda-feira, 18, que decisões judiciais estrangeiras só podem ser executadas no Brasil mediante homologação ou por meio de mecanismos de cooperação internacional. De acordo com o ministro, leis e ordens estrangeiras não produzem efeitos em relação a pessoas brasileiras.

A decisão de Dino abre precedente para que as sanções impostas pela Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes não tenham efeito imediato no País, de acordo com especialistas ouvidos pelo Estadão.

Embora não cite expressamente a Lei Magnitsky aplicada pelos EUA contra Moraes, o ministro destacou que a decisão, tomada em processo de disputa entre Instituto Brasileiro de Mineração e municípios brasileiros que procuraram a Justiça do Reino Unido, tem “efeito vinculante”.

O advogado Daniel Toledo, especialista em Direito Internacional, explica que o ministro Flávio Dino ratificou “o que já estava decidido”.

“O Flávio Dino decidiu o que já estava decidido. Decidiu que leis internacionais não têm efeito no Brasil sem que seja, efetivamente, aprovada de acordo com o trâmite legal do país, ou que seja através de um acordo ou através de uma ordem internacional por outros acordos que já existam, para ser validada pelo STF e cumprida. É o caso de extradição, alguns casos de intimação internacional, que passa pelo Ministério das Relações Exteriores”, explica.

O ministro Alexandre de Moraes
O ministro Alexandre de Moraes

Toledo explica que decisões de países estrangeiros não produzem efeito imediato “em nenhum país do mundo, não só no Brasil”. Ele explica que para se ter a validação de uma lei internacional é preciso um tratado internacional que regulamente a legislação.

“Isso não produz efeito em nenhum país do mundo, não é só no Brasil. Para você ter uma validação de uma lei internacional no Brasil, a primeira coisa que você precisa é ter um tratado internacional que regulamente aquele tipo de de legislação, aquele tipo de regulamentação”, diz.

Na decisão, Dino destacou o contexto atual, em que os EUA têm aplicado sanções ao Brasil e a ministros do STF como forma de pressionar por uma anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro, sem citar diretamente a Lei Magnitsky. No mês passado, o governo de Donald Trump aplicou a norma ao ministro Alexandre de Moraes. A lei, tradicionalmente aplicada contra graves violadores de direitos humanos, prevê bloqueio de contas bancárias e de bens em solo americano.

De acordo com Dino, a violação a essas regras “constitui ofensa à soberania nacional, à ordem pública e aos bons costumes, portanto presume-se a ineficácia de tais leis, atos e sentenças emanadas de país estrangeira”.

“Diferentes tipos de protecionismos e de neocolonialismos são utilizados contra os povos mais frágeis, sem diálogos bilaterais adequados ou submissão a instâncias supranacionais”, disse Dino. “Nesse contexto, o Brasil tem sido alvo de diversas sanções e ameaças, que visam impor pensamentos a serem apenas ‘ratificados’ pelos órgãos que exercem a soberania nacional.”

Para a advogada Vera Chemim, especialista em Direito Constitucional, a decisão de Dino, tomada em processo de disputa entre Instituto Brasileiro de Mineração e municípios brasileiros que procuraram a Justiça do Reino Unido, “não guarda qualquer relação ou similaridade com a aplicação da Lei Magnitsky no Brasil”.

A decisão representa uma “manobra jurídica sui generis” devidamente planejada para dar um suposto sentido e alcance de sua eficácia em face da Lei Magnitsky

Vera Chemin, advogada constitucionalista

Para ela, “ao que parece, a decisão representa uma “manobra jurídica sui generis” devidamente planejada para dar um suposto sentido e alcance de sua eficácia em face da Lei Magnitsky, favorecendo o ministro Alexandre de Moraes, atingido diretamente pela legislação americana, em razão de suas decisões que prejudicaram empresas e cidadãos americanos”.

“A despeito de tal constatação, a decisão de Flávio Dino tem a pretensão de constituir um “precedente esdrúxulo” para justificar uma provável e futura decisão para frustrar a aplicação da Lei Magnitsky no Brasil. Na hipótese de o STF decidir que a Lei Magnitsky não poderá ter eficácia no Brasil, os bancos serão obrigados a cumprir aquela determinação. Na sequência, o sistema americano suspenderia as suas transações financeiras com os bancos brasileiros (todos eles têm filiação com o sistema americano), provocando uma quebra do conjunto de bancos no Brasil”, explica.

Na prática, segundo Vera, caso os bancos mantenham as contas de Moraes, eles sofrerão as sanções da lei americana. Por outro lado, se cortarem as transações financeiras com Moraes serão enquadrados em crime contra a soberania nacional.

“Os bancos e empresas americanas não vão realizar qualquer tipo de transação com instituições financeiras brasileiras, em razão de serem obrigados a atender à exigência da Lei Magnitsky. Por óbvio, as empresas e bancos do Brasil terão que fechar as suas portas, em decorrência das “consequências” da sua não aplicação, por determinação do STF”, explica.

O advogado Daniel Toledo diz que a decisão de Dino “tenta não só evitar a aplicação da Magnitsky ao Alexandre de Moraes, mas também a aplicação a qualquer outro ministro ou em qualquer outra pessoa dentro do território nacional, e também quaisquer outras sanções, que possam vir de quaisquer outros governos internacionais”.

“Então o que ele fez foi, simplesmente, na minha opinião, decidir que já era decidido pela própria legislação brasileira. Leis internacionais não têm a capacidade de gerar suas consequências dentro do território brasileiro sem antes passar pela própria avaliação do Congresso, do presidente e os trâmites legais para aprovação de uma lei ou de um tratado”, finaliza.

 

 

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