Xingamentos e ‘esporros’: ouça os áudios obtidos pela PF no celular apreendido de Bolsonaro
O relatório da investigação da Polícia Federal (PF) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tirado do sigilo nesta quarta-feira, 20, tornou público 11 arquivos de áudio encontrados no celular do ex-chefe do Executivo, apreendido pelos agentes dia 4 de agosto.
Na ocasião, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes decretou a prisão domiciliar de Bolsonaro por quebra de medida cautelar que o impedia de usar as redes sociais, mesmo por meio de terceiros. No relatório da PF, os investigadores mostram que o então presidente descumpriu a determinação no dia anterior, 3 de agosto, enviando mensagens a aliados que participavam de manifestações em prol do ex-presidente em diversas cidades do País.
As trocas de mensagens cujas gravações foram obtidas ocorreram entre Bolsonaro e o pastor Silas Malafaia; com o advogado americano Emiliano Martin de Luca, que representa as empresas Rumble e Trump Media em um processo movido nos Estados Unidos contra o Moraes, e com o deputado federal Capitão Alden (PL-BA).
Conversa com Silas Malafaia
A maior parte dos áudios foi trocada com Malafaia. O pastor foi alvo de busca e apreensão e de retenção de passaporte pela PF nesta quarta-feira. Nas gravações, Malafaia chama o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) de “babaca” e ameaça “arrebentar” com ele. O motivo da irritação era uma declaração do deputado sobre as tarifas impostas pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros.
As conversas ocorreram a partir de 11 de julho, dias seguintes ao tarifaço anunciado pelo presidente americano Donald Trump, que mencionou em carta apoio a Bolsonaro. “Tem que pressionar o STF dizendo que se houver uma anistia ampla e total, a tarifa vai ser suspensa”, diz o pastor.
Malafaia também orienta Bolsonaro sobre como deve reagir ao tarifaço, aconselhando que o ex-presidente grave um vídeo “para o povo em geral”, apostando que o formato da comunicação viralizaria. “Só o que viraliza é vídeo. Vai por mim, não espere o pior acontecer. Se posicione! O jogo está armado e o juiz comprado”, escreve. Segundo os investigadores, as mensagens revelam estratégia de difusão do material, com ajuda de Eduardo Bolsonaro e ferramenta de inteligência artificial.
Para os investigadores, as conversas indicam que o pastor atua diretamente na definição das ações planejadas pelo grupo investigado, que tem por finalidade coagir autoridades judiciais da Suprema Corte, e que exerce influência direta sobre o modus operandi da família Bolsonaro.
Conversa com Martin de Luca
Segundo as mensagens interceptadas pela PF, Martin de Luca enviou a Bolsonaro uma cópia de uma peça do processo movido contra Moraes nos Estados Unidos. Para os investigadores, o envio dos documentos constitui indício relevante que “evidencia desvio quanto a real finalidade das pretensões deduzidas pela empresa em face de litigância” contra Moraes.
Na troca de mensagens, Martin diz a Bolsonaro que tem recebido convites da imprensa americana para o ex-presidente se pronunciar sobre o assunto, e pede para quem deve encaminhar as solicitações. Bolsonaro responde por áudio, pedindo “orientação” para o advogado sobre como se posicionar após a imposição de tarifa de 50% a produtos brasileiros.
Para os investigadores, o áudio atribuído Bolsonaro demonstra que o ex-presidente atua “de forma subordinada a interesses de agentes estrangeiros, em alinhamento previamente condicionado ao atendimento de pretensões dissociadas ao interesse nacional, direcionadas a vulnerar a independência dos Poderes constituídos, especialmente o Poder Judiciário, por meio de atos de coação ao seu órgão de cúpula, e a soberania nacional”.
Em resposta, o advogado afirma que vai enviar um resumo de como acha que “pode melhorar a comunicação” de Bolsonaro em relação ao tarifaço, ainda no mesmo dia. O ex-presidente agradece e diz que Martin pode “ligar quando desejar”.
Conversa com deputado Capitão Alden
No dia 3 de agosto, domingo em que ocorreram manifestações a favor de Bolsonaro em diversas cidades brasileiras, o deputado federal Capitão Alden (PL-BA) questiona o ex-presidente se ele poderia mandar um áudio para a Bahia, para ser exibida durante o ato em Salvador. Em resposta, Bolsonaro afirma que “pode dar problema” e que não pode falar, mas que o deputado poderia ligar para ele, mostrando sua imagem para os manifestantes.
A ligação dura 1 minuto e 14 segundos. Alguns minutos depois, Bolsonaro envia um vídeo gravado por terceiro, de 55 segundos, e é possível ouvir ao fundo que a manifestação estaria ocorrendo em Salvador. Ao final, o chamador diz “abraço, presidente” e Bolsonaro responde “abraço, minha Bahia”.
Bolsonaro, em seguida, envia a mensagem: “Obrigado Bahia. Dep Cap Alden. Pela liberdade Jair Bolsonaro”. Poucos minutos depois, envia uma foto sua sentado olhando para um aparelho celular, com mensagem dizendo: “De casa acompanhando. Obrigado a todos. Pela nossa liberdade. Jair Bolsonaro”.
Para os investigadores, a troca de mensagens evidencia “modus operandi de utilização de terceiros para burlar a medida cautelar”. Depois daquele domingo, Bolsonaro teve decretada a prisão domiciliar por descumprir a medida imposta por Moraes de não utilizar redes sociais.
