Dividido em momento decisivo, bolsonarismo coloca em risco o discurso que mais fustiga o PT
O bolsonarismo está em estágio de desagregação. Embora seja inegável sua força eleitoral, há uma crise que tende a definir o futuro do grupo. De um lado, pelo menos três dos quatro filhos do ex-presidente Jair Bolsonaro. De outro, o grupo político que o sustentou em partido de centro-direita. E, em meio ao momento conturbado, sem coordenação, os aliados do ex-presidente ofereceram a oportunidade de que Lula contraponha o discurso que mais tem fustigado o PT ao longo dos últimos 20 anos: o da corrupção e da impunidade.
Ao defender a aprovação da PEC da Blindagem em reação ao STF, o bolsonarismo, alinhado ao Centrão, garantiu, na prática, a volta aos tempos daquela impunidade parlamentar que marcou os primeiros anos pós-Constituição de 1988. Tratava-se de uma pauta suprapartidária, que interessa esquerda e direita, e que cuja aprovação já se gesta desde 2021, quando Arthur Lira era o presidente da Câmara. Diante da pressão da opinião pública, faltava o apoio público decisivo de uma das correntes que polarizam o Brasil para que avance pauta tão impopular. Em guerra com o Judiciário, o bolsonarismo aceitou a tarefa inglória.

É inegável que, com o mensalão e, posteriormente, com os escândalos revelados pela operação Lava Jato, o PT passou a sofrer muito no debate do combate à corrupção. A anulação de processos da operação contra petistas e empresários aliados promovida pelo STF reforçou ainda mais essa pecha. Veio agora o bolsonarismo a tentar equilibrar a balança ao embalar a aprovação de um texto que, na prática, pode impedir as investigações, condenações e prisões de parlamentares exatamente no momento em que o orçamento secreto começa a ser desvendado.
A mãozinha a Lula vem no momento em que o grupo que controla a direita decide seu futuro. De um lado, Eduardo Bolsonaro e os irmãos Carlos e Jair Renan, além do influenciador Paulo Figueiredo, do ex-secretário Fábio Wajngarten em, em certa medida, Silas Malafaia, não escondem mais a predileção pela possibilidade de que um membro da família seja considerado como candidato a presidente, sendo Eduardo o mais cotado. De outro, figuras que sustentaram politicamente o bolsonarismo dentro de partidos do Centrão querem outro rumo, com acenos cada vez mais explícitos a Tarcísio de Freitas.
A ponto de, como disse a colunista Bela Megale, em O Globo, Eduardo cogitar até mesmo lançar sua candidatura por outra legenda para concorrer com o governador (se não ficar inelegível). Alguns poderiam dizer que bastaria que o pai, Jair Bolsonaro, o desautorizasse. Mas proibido de falar, preso em domiciliar e às vésperas de julgamento, parece ficar claro que o patriarca não controla mais o filho. As mensagens que se tornaram públicas expuseram também esse desafio interno. E se Bolsonaro não pode vir publicamente endossar um candidato, ainda que mande uma carta ou coisa do tipo, estaria aberto o caminho para que um membro da família encontre uma via alternativa para concorrer na marra.
No caso de Eduardo, maior desafio seria o fato de que não pode hoje pisar no Brasil sem risco de prisão. Ou o fato de estar à beira de uma cassação de mandato. Até nisso a PEC da Blindagem, gestada por integrantes do Centrão e encampada pelos bolsonaristas como vingança ao STF pode ajudá-lo, ao dificultar uma condenação e prisão, o que abriria caminho para que ele voltasse ao Brasil. Seria mais um sonho para Lula que, evidentemente, preferia enfrentar o rejeitado sobrenome Bolsonaro, ainda mais diante de todo o desgaste com a campanha americana promovida por Eduardo.