5 de setembro de 2025
Politica

Advogado de Torres usa erro técnico para sustentar tese da ‘minuta do Google’; veja

O advogado Eumar Novacki, que representa o ex-ministro da Justiça Anderson Torres no julgamento da ação penal da trama golpista, sustentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira, 2, que a “minuta do golpe” já estava na internet em dezembro de 2022. Por essa razão, o defensor apelidou o documento de “minuta do Google”. Durante sua sustentação oral, o advogado expôs uma captura de tela que mostra uma busca pelo documento relacionada ao dia 12 de dezembro de 2022. O arquivo exposto por Novacki está hospedado no portal ConJur.

A “minuta do golpe” é o esboço de um decreto que imporia um estado de exceção no País. Uma das versões do documento foi localizada em uma operação de busca e apreensão na casa do ex-ministro da Justiça em 12 de janeiro de 2023. Embora a defesa de Torres use a data exposta pelo Google para alegar que o esboço já estava na internet antes da apreensão, os metadados do arquivo relevam que o documento foi modificado em janeiro de 2023. O portal ConJur contesta a informação do defensor, e o próprio Google afirma que a data relacionada a um resultado de busca pode ser imprecisa, pois é analisada a partir de vários fatores.

Eumar Novacki usou erro técnico do Google para sustentar tese de que 'minuta do golpe' já estava na internet antes de ser apreendida na residência de Anderson Torres, em janeiro de 2023
Eumar Novacki usou erro técnico do Google para sustentar tese de que ‘minuta do golpe’ já estava na internet antes de ser apreendida na residência de Anderson Torres, em janeiro de 2023

“O Google não depende de um único fator de data, porque todos eles estão sujeitos a problemas. Por isso, nossos sistemas analisam vários elementos para determinar a melhor estimativa possível da data em que a página foi publicada ou teve atualizações significativas”, afirma o mecanismo de busca em um material destinado a desenvolvedores.

Os metadados da “minuta do golpe” hospedada no ConJur mostram que o arquivo foi modificado pela última vez em 13 de janeiro de 2023. A informação pode ser verificada por qualquer usuário por meio da plataforma de metadados EXIF.tools. A data é a mesma que expôs o ConJur em auditoria encaminhada à Polícia Federal.

Metadados da minuta do golpe publicada no portal 'ConJur' na ferramenta EXIF.tools
Metadados da minuta do golpe publicada no portal ‘ConJur’ na ferramenta EXIF.tools

Em nota, o portal contestou a informação de Eumar Novacki. “O Google indexou a prova do crime contra seu cliente, pela data que consta no documento – e não pela data de postagem – o que só aconteceu em janeiro de 2023”, afirmou o portal. “Tivesse dado o furo, este site seria o primeiro a se gabar — e não a negar”, diz.

“Quando o assunto veio à tona pela primeira vez, a ConJur fez uma auditoria a pedido da PF e constatou que o documento só foi publicado em 13 de janeiro de 2023, nesta reportagem, portanto depois da descoberta da PF e depois de os fatos terem sido revelados por outros veículos de comunicação”, completou o portal. “O esclarecimento de que o dia 12 de dezembro de 2022, que aparece no buscador, é a data que consta na minuta, e não a data da publicação da ConJur já foi repetido diversas vezes.”

Eumar Novacki foi procurado pelo Estadão, mas não respondeu aos contatos. Ao STF, o advogado alegou que a perícia do ConJur não esclareceu a origem do arquivo. “Não falseou a verdade, mas não respondeu o que eu queria saber”, disse.

“O usuário precisa entender que essa data não é ‘data de indexação’, mas sim ‘provável data de publicação’. O Google acerta em alguns casos, mas erra em muitos outros. Buscar por data auxilia a levantar resultados relevantes, mas sempre requer que o resultado seja estudado para ter certeza”, afirmou Natanael Antonioli, apresentador do canal do YouTube Fábrica de Noobs, dedicado a temas de computação.

'Minuta do Google': defesa de Anderson Torres usa erro técnico para sustentar que minuta do golpe já estava na internet em dezembro de 2022
‘Minuta do Google’: defesa de Anderson Torres usa erro técnico para sustentar que minuta do golpe já estava na internet em dezembro de 2022

Antonioli explica que o Google faz uma estimativa de quando o documento foi publicado, mas a exibição nem sempre é correta. “Não é uma indicação precisa de quando o documento foi feito”, afirmou. “Caso eu, hoje, produza um decreto datado de 2014 e envie ao Google, é provável que ele deduza que o meu decreto foi feito em 2014.”

Ao Estadão, Natanael exemplificou como uma data incorreta pode ser induzida pelo uso de ferramentas de pesquisa do Google. “A Taylor Swift publicou o álbum ’1989′ em 2014, mas uma pesquisa por ‘Taylor Swift’ no Google que restrinja a data para antes de 1990 irá produzir resultados do ano 1989 porque o Google encontra o nome ’1989’ na página e deduz que é a data de produção”, mostrou Antonioli.

Álbum '1989', lançado pela cantora Taylor Swift em 2014, é indexado de modo incorreto pelo Google
Álbum ‘1989’, lançado pela cantora Taylor Swift em 2014, é indexado de modo incorreto pelo Google

Essa não é a primeira vez que a defesa de Anderson Torres refere-se ao documento que imporia um estado de exceção no País como “minuta do Google”. O termo foi usado pelo próprio réu durante seu depoimento ao STF, em junho.

“Na verdade, ministro, não é a minuta do golpe, eu brinco que é a minuta do Google, porque está no Google até hoje. Esse documento foi entregue no meu gabinete no Ministério da Justiça e eu levava diariamente duas pastas para a minha residência, uma delas contendo a agenda do dia e outra com documentos gerais que vinham no ministério“, disse Torres. “Isso foi uma fatalidade. Eu nunca trabalhei isso. O documento era muito mal escrito. Não sei quem fez, não sei quem mandou fazer e nunca discuti esse tipo de assunto.”

A defesa de Torres nega a participação do ex-ministro de Jair Bolsonaro (PL) em reuniões em que a “minuta do golpe” teria sido discutida e editada, segundo a acusação da Procuradoria-Geral da República (PGR). Torres é um dos oito réus do núcleo crucial da tentativa de golpe de Estado, que teve o julgamento no Supremo iniciado nesta terça-feira, 12. Há sessões previstas até o dia 12.

 

 

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