4 de setembro de 2025
Politica

No banco dos réus, militares envolvidos no golpe poderão se tornar o que mais temem: “paisanos”

O cidadão civil condenado à prisão perde, além da liberdade, as prerrogativas da convivência em sociedade. O cidadão militar, se sentenciado a mais de dois anos de prisão, porém, perde uma vida em que ele, como diz a professora e doutora em Ciências Sociais Adriana Marques, se sentia “acima do bem e do mal, senhor da superioridade moral que cabe a uma parcela pequena da sociedade”. O militar perde soldo, títulos e condecorações, ou seja, tudo que ele conquistou desde que cruzou os simbólicos portões da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), na época em que era um jovem cheio de ilusões e sonhos para a carreira que escolhera, muitas vezes influenciado pela tradição familiar.

A partir desta terça-feira, 2, “o núcleo crucial” da tentativa de golpe de Estado, que inclui o ex-presidente da República Jair Bolsonaro e mais cinco oficiais – incluindo o tenente coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens e delator – que fizeram parte do governo (alguns generais de três ou quatro estrelas no topo da carreira) necessitarão de nervos de aço. Ao lado de dois civis (Alexandre Ramagem e Anderson Torres), todos eles ouvirão a acusação do procurador-geral da República, Paulo Gonet, e terão a oportunidade de serem defendidos pelos seus advogados.

Para quem vem da Academia Militar das Agulhas Negras(Aman), nada pior do que virar um
Para quem vem da Academia Militar das Agulhas Negras(Aman), nada pior do que virar um “paisano”

Alguns recursos jurídicos poderão ser usados para adiar a sentença final. Mas o fato real e doloroso para eles, se forem realmente condenados, é que eles se tornarão cidadãos como eu ou você.

Ninguém lhes baterá continência. Perderão a patente – o general será o senhor Fulano – e as condecorações conquistadas ao longo da carreira. E o pior: em uma carreira que se baseia na disciplina, subordinação e, por que não, no respeito, eles serão expurgados por seus pares.

“Bolsonaro é um covarde. Já sofri muito com tudo isso. Não quero sentir mais vergonha”, afirma Sérgio Etchegoyen, o general reformado, ex-chefe do Estado Maior das Forças Armadas e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) no governo de Michel Temer, que vem de uma família criada em paralelo à história do Exército brasileiro.

Poucos no Brasil estudaram tão a fundo o “Espírito Militar” como o professor Celso Castro, diretor da Escola de Ciências Sociais (FGV/CPDOC) e da Escola de Relações Internacionais (FGV/RI) da Fundação Getúlio Vargas. Quem quiser ter uma ideia de como poderá ser a vida desses senhores se estiverem presos, deve procurar ler os escritos do professor.

Na Aman, a população, para os alunos, se divide entre os militares e os “paisanos” (civis), em tom pejorativo. Se os militares que estarão sentados no banco dos réus da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) forem condenados eles se tornarão, automaticamente, “paisanos”.

Cumprirão pena em uma prisão civil? Instalação Militar estará fora de cogitação, se perderem as patentes. Eles não serão mais militares. Com a sentença proferida pelo STF, o Superior Tribunal Militar (STM) apenas homologará a decisão? Por enquanto o que se sabe é o que está no artigo 142 da Constituição (suprema coincidência, porque é o mesmo artigo que Bolsonaro usava para justificar a intervenção militar), no item III nos incisos VI e VII, a regra para a perda de patente.

“VI -O oficial só perderá o posto e a patente se for julgado indigno do oficialato ou com ele incompatível, por decisão de tribunal militar de caráter permanente, em tempo de paz, ou de tribunal especial, em tempo de guerra; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

VII – O oficial condenado na justiça comum ou militar à pena privativa de liberdade superior a dois anos, por sentença transitada em julgado, será submetido ao julgamento previsto no inciso anterior; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998).”

Se tornar paisano não será nada fácil para quem viveu uma vida inteira no mundo verde oliva.

 

 

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