7 de setembro de 2025
Politica

‘Demover de quê?’: Pergunta de Cármen Lúcia pode complicar Bolsonaro no julgamento?

O advogado Andrew Farias, que representa o general Paulo Sérgio Nogueira no julgamento da trama golpista, afirmou nesta quarta-feira, 3, que o ex-ministro da Defesa tentou “demover” Jair Bolsonaro (PL) de quaisquer medidas de exceção após a derrota nas eleições de 2022.

Ao final da sustentação oral, a ministra Cármen Lúcia perguntou a Farias, de forma específica, ao que ele se referia ao falar em “demover” o ex-presidente. “Demover de adotar qualquer medida de exceção”, reforçou o advogado. Na avaliação de criminalistas ouvidos pelo Estadão, a resposta do defensor é um reconhecimento tácito de que o planejamento de uma tentativa de golpe estava em andamento. Por outro lado, é a alegação de uma das partes e não constitui elemento de prova. Nesse sentido, a afirmação do advogado, em si, não complica a situação jurídica de Bolsonaro.

Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-ministro da Defesa de Jair Bolsonaro (PL), é um dos oito réus do 'núcleo crucial' da tentativa de golpe; ao lado, o defensor do general, o advogado Andrew Farias
Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-ministro da Defesa de Jair Bolsonaro (PL), é um dos oito réus do ‘núcleo crucial’ da tentativa de golpe; ao lado, o defensor do general, o advogado Andrew Farias

Andrew Farias citou os depoimentos ao Supremo Tribunal Federal (STF) de Carlos Baptista Júnior e de Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandantes da Aeronáutica e do Exército, respectivamente.

Freire Gomes negou que Paulo Sérgio Nogueira tivesse o pressionado a aderir a alguma medida de exceção. Baptista Júnior também negou qualquer tipo de pressão do general. Além disso, afirmou que ele, Freire Gomes e o ministro da Defesa estavam “desconfortáveis” com a discussão de medidas como Garantia da Lei da Ordem (GLO), estado de sítio e estado de defesa. “Eu lembro que o Paulo Sérgio, Freire Gomes e eu conversávamos mais, debatíamos mais, tentávamos demover mais o presidente”, disse o comandante da Aeronáutica em depoimento.

Durante a sustentação oral, Andrew Farias disse que o depoimento de Baptista Júnior era “contundente e acachapante” sobre a recusa do então ministro de aderir a um intento golpista.

O criminalista Marcelo Crespo, coordenador do curso de Direito da ESPM-SP, avalia que a defesa de Nogueira aposta na tese da não adesão do general aos atos para o golpe. “Me parece uma estratégia clara da defesa do Paulo Nogueira em tentar mostrar que o cliente dele não estava aderindo às ideias do Bolsonaro”, disse.

A tese da não adesão, por outro lado, implica no reconhecimento, ainda que tácito, de que o entorno do presidente discutiu e cogitou a implementação de medidas de exceção. Para a PGR, os elementos demonstram que o golpe de Estado já estava “em curso”. “Não é preciso esforço intelectual extraordinário para reconhecer que o presidente da República e depois o ministro da Defesa convocam a cúpula militar para apresentar documento de formalização de golpe de Estado. O processo criminoso já está em curso”, afirmou Gonet na primeira sessão de julgamento, na terça-feira, 2.

O criminalista Rogério Taffarello, sócio do escritório Mattos Filho e professor da FGV, afirma que as alegações de Andrew Farias “não fazem prova a favor ou contra quem quer que seja”. “O efeito jurídico, portanto, é limitado, visto que ao tribunal cabe julgar com base nas provas que estejam no processo, e não na retórica, acertada ou desacertada, de qualquer das partes”, disse.

“O que importa mais, neste caso, é saber se a alegação do defensor ressalta um fato provado no processo, e a relevância desse fato para favorecer a tese acusatória da PGR, ou da defesa, ainda que se trate da defesa de um acusado em detrimento de outro”, completou Taffarello.

Segundo a PGR, Paulo Nogueira endossou a narrativa de fraude eleitoral e postergou de forma “deliberada” a entrega do relatório de fiscalização do ministério da Defesa, com o “propósito de manter fora do alcance da opinião pública” as conclusões do documento, que apontavam para “a inexistência de fraudes ou vulnerabilidades que colocassem em dúvida o resultado das urnas”.

Além disso, como admitiu o próprio réu, participou de reuniões entre o então presidente e comandantes militares em que foram discutas medidas de exceção, congregadas em um documento que ficou conhecido como “minuta do golpe”.

A Procuradoria quer a condenação de Paulo Sérgio Nogueira por organização criminosa armada, abolição do Estado de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado. O ex-ministro da Defesa e mais sete réus do “núcleo crucial” estão em julgamento na Primeira Turma do STF. As sessões serão retomadas na próxima terça-feira, 9.

 

 

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