Família Bolsonaro sacrifica Tarcísio para tentar salvar Jair
A pressão da família Bolsonaro em cima de Tarcísio de Freitas para que ele trabalhasse às claras pela anistia aos golpistas do 8 de Janeiro e também aos executores da empreitada contra a democracia surtiu efeito. Desde que passou a ser criticado com veemência por Eduardo e chamado de “rato” por Carlos Bolsonaro, o governador resolveu agir e explicitar seu interesse em salvar o ex-patrão. Isso, a despeito da reconhecida impopularidade da pauta que fatalmente tornará mais trabalhoso conseguir ser abraçado pelo eleitor de centro que, a cada quatro anos, desde a redemocratização, decide as eleições no Brasil por margem modesta.
O cálculo não era fácil para o governador. Houve a percepção de que havia risco real de que três filhos de Bolsonaro (Eduardo, Carlos e Jair Renan, com Flávio estando à parte) conseguissem convencer o pai a apostar em um nome da família em 2026. Ou que Eduardo, ainda que desautorizado, concorresse por outra legenda. Não é por acaso que Tarcísio − alinhado ao centrão, que exige como fatura o apoio de Bolsonaro ao governador −, tenha se movido exatamente quando o deputado federal expatriado mandou esse recado público. Assim, para evitar perder parte do bolsonarismo no primeiro turno, Tarcísio colocou em segundo plano o apoio do eleitor que não quer ver nem Lula nem Bolsonaro no Palácio do Planalto.
É um jogo arriscado. As pesquisas de opinião, já não é de hoje, mostram que o antipetismo que poderia eleger Tarcísio ou qualquer outro nome da direita é grande, mas que o antibolsonarismo é maior. A pesquisa Genial/Quaest de agosto mostra que são 47% os que dizem ter medo da volta de Bolsonaro, enquanto 39% temem a continuidade de Lula. Abraçar-se ainda mais ao ex-presidente do que a própria história política já obriga seria, por essa lógica, profundamente negativo.
De acordo com pesquisa Datafolha de agosto, são 55% os brasileiros contrários a uma anistia aos golpistas. Por outro lado, 35% são favoráveis. De acordo com a Atlas/Bloomberg, seriam 51,2% e 46,9% a favor.
A Genial/Quaest já havia mostrado, em agosto, sinais de desgaste dos primeiros movimentos, ainda tímidos, de Tarcísio em direção a uma posição de contestação do processo judicial e da articulação pela pauta da impunidade. De maio até aquele mês, os que conhecem e não votariam em Tarcísio passaram de 33% para 39%, enquanto os que conhecem e votariam ficaram no mesmo lugar, oscilando de 28% para 27%.
A tendência, agora, é que essa exposição possa ser um novo desafio ao governador. Sobretudo após ele dizer, em entrevista ao Diário do Grande ABC, que, no primeiro dia de governo, seu foco será no ex-chefe, com a assinatura de um indulto para ele. Deu a Lula o presente de poder apresentar uma pauta bastante popular para o primeiro dia e fazer o confronto na campanha e no programa eleitoral. Tudo o que Sidônio Palmeira queria.
Pode até ser que os aliados de Tarcísio entendam que, pago o pedágio ao bolsonarismo, haverá tempo de deixar esse assunto para trás. É bastante improvável que o tema seja abandonado tão cedo, porém. Não apenas pois o adversário lembrará disso insistentemente na campanha, mas pelo fato de que a tramitação do assunto vai inevitavelmente avançar pro ano eleitoral.
Ainda que a anistia seja aprovada nas próximas semanas na Câmara, o caminho é longo. É preciso ampliar a articulação no Senado, onde Davi Alcolumbre, responsável por pautar, é muito mais próximo do governo e onde a oposição, em princípio, não tem maioria clara. Depois, enfrentar um possível veto de Lula, que teria até 15 dias úteis para fazer isso, derrubando o no Congresso. Para, na sequência, enfrentar as certas ações de inconstitucionalidade no mesmo Supremo Tribunal Federal (STF) que agora julga o ex-presidente.
Se Tarcísio acredita que não será chamado a participar de cada uma das fases da articulação, expondo sua vinculação a uma iniciativa que soltará os condenados, àquela altura provavelmente já presos, está enganado. Sua imagem estará vinculada à foto de cada um deles saindo da prisão, se no fim sair vencedor dessa batalha. Tal qual Haddad em 2018, Tarcísio corre enorme risco de ser marcado como o cara a serviço de Bolsonaro. Com o adversário não deu certo.