Fux mantém os fatos apontados por Moraes, mas diverge na interpretação
O filósofo Immanuel Kant, do século 18, já escreveu que intuições sem conceitos são cegas. O mesmo podemos dizer sobre os fatos: sem uma história que os reúna, que os concatene, não fazem qualquer sentido. A diferença dos votos dos ministros Alexandre de Moraes e de Luiz Fux, até agora, sobre a acusação de golpe de Estado que pesa sobre Jair Bolsonaro e seus cúmplices, é a maneira como organizaram os fatos conhecidos pelo público.
Por exemplo, para Moraes, o que sabemos dos encontros e ações públicas de Jair Bolsonaro são uma prova irrefutável de que o ex-presidente liderou uma organização criminosa. Já Fux acha que os mesmos acontecimentos não são suficientes para que o réu seja enquadrado como líder de uma quadrilha.

Nenhum dos dois togados nega o vandalismo de 8/1/2023 contra as sedes das instituições federais. Mas enquanto Alexandre de Moraes os coloca como soluços finais de uma trama golpista e por isso devem ser condenados, Fux considera como um evento criminosos, que, porém, precisam ser individualizados. Seria preciso, para Fux, sempre buscar o tipo penal devido ao pedir a punição de alguém – tarefa que os acusadores teriam miseravelmente falhado.
Alexandre de Moraes, em seu voto, destacou os acontecimentos que envolveriam uma tentativa de golpe de Estado. Fux, os meandros da lei. Se colocou como um garantidor do Estado de Direito. Os movimentos talvez criminosos da turma de Bolsonaro seguem os mesmos. Mas, para Moraes, devem ser julgados por uma turma do Supremo. Para Fux, em outra instância.
As interpretações sobre as divergências entre os dois ministros serão muitas. Como as chances de Fux ser derrotado em suas teses são grandes no final do julgamento, busca-se deixar uma porta aberta para Bolsonaro ser livre quando a configuração política brasileira mudar? Mas, na verdade, nisso tudo, temos que buscar a ajuda de outro filósofo, Aristóteles: no sentido de que não conseguimos nos desvincular da política na consecução de nossos atos. A maior consequência do voto do Fux será na política brasileira.
Do lado de fora, a sociedade segue a mesma. É punitivista se os inimigos, as pessoas que não admira, são réus; e garantista quando os julgados são merecedores de algum afeto. Os fatos não falam por si para ninguém.