10 de setembro de 2025
Politica

Júlio Frank redivivo

Em 2027 a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco atingirá o seu segundo centenário. Entre 2027 e 2028 haverá grande calendário de eventos para evidenciar o que significou a autonomia brasileira em relação a Coimbra, onde eram obrigados a estudar ciências jurídicas os aqui nascidos.

O Diretor Celso Fernandes Campilongo já tem programação elaborada e um projeto excelente é o de fazer do espaço frontal do edifício um belo boulevard, tornando agradável aquele território livre, que já foi palco de tantos momentos históricos desta nação.

Além disso, haverá a entrega da biblioteca da FADUSP, uma das mais importantes do Brasil e, como antecipação dos festejos, foi reinaugurado o espaço em que está enterrado o legendário Júlio Frank.

O túmulo de Júlio Frank se encontra no chamado “Pátio Menor” das Arcadas. Mereceu restauração, como devem merecer todos os elementos que compõem o patrimônio histórico. Servia, na década de 1950, como ponto de encontro e convivência dos acadêmicos. E agora passa novamente a receber eventos artísticos e culturais.

A “velha e sempre nova” Academia do Largo de São Francisco sempre foi um nicho cultural. Quantos poetas já passaram por ali! Pense-se naqueles que Lygia Fagundes Telles, ela mesma aluna das Arcadas, chamava de integrantes da “Escola de morrer cedo”: Castro Alves, Álvares de Azevedo e Fagundes Varella. Mas também Paulo Bomfim, o Príncipe dos Poetas Brasileiros, Mário Chamie e Geraldo de Camargo Vidigal.

Nem se fale da política, palco de prática de outras artes… A São Francisco faz parte da melhor parte da História do Brasil. Aquela que prezou sempre a democracia e por ela lutou, inclusive com derramamento de sangue, como ocorreu na Revolução Constitucionalista de 1932.

Mas Júlio Frank é um capítulo especialíssimo desse contexto. Há muito mistério em sua insondável trajetória. Nascido em Gotha, na Turíngia, Alemanha, veio para o Brasil e esteve primeiro em Sorocaba, na Fundição Itapema, que era gerida por patrícios seus. Logo veio para São Paulo, onde lecionou História e Geografia do “Curso Anexo”, uma espécie de preparatório para o vestibular de ingresso na Escola de Direito. Ali deu aulas de 1834 até sua morte.

A ele se atribui a idealização do Centro Acadêmico e da Academia de Letras da Faculdade, que congregou luminares na cultura brasileira. Muito assertivo, criou as confrarias franciscanas e o nebuloso projeto que resultou na sociedade secreta denominada “Bucha”, abreviação tupiniquim do nome alemão “Burschenschaften”, cujo propósito era socorrer alunos necessitados e apoio financeiro.

Nada obstante o cipoal legendário que cerca a “Bucha”, consta que dela participaram o Barão do Rio Branco, Rui Barbosa e vários dos presidentes da República que por ali passaram. Um exercício permanente dos acadêmicos que passam pela São Francisco é tentar adivinhar quem foram os “bucheiros”, recolher relatos de suas atividades e descobrir se a “Bucha” ainda existe, ainda que permaneça misteriosa e secreta.

Júlio Frank é o personagem idealizado que permeia todo esse folclore acadêmico. Morreu muito cedo, em 1841, quando tinha apenas trinta e dois anos. Por ser protestante, não pode ser enterrado em cemitério católico, nem na igreja, como era o costume de então. Os alunos fizeram questão de sepultá-lo no pátio interno da Faculdade, que então só tinha pouco mais de vinte anos.

Nenhuma certeza existe sobre o que levou Johann Julius Gottfried Ludwig Frank partir de sua Alemanha e vir morrer no Brasil. Culto, estudioso e amigo da juventude acadêmica, traduziu o Compêndio de História Universal de Poelitz. Mais ainda, completou a obra, ampliando-a com as histórias da França, Itália, Espanha e Portugal, que não constavam do original.

Júlio Frank é uma espécie de “padroeiro” dos estudantes da FADUSP. Bela tradição a de cultivar sua memória. Que sirva de exemplo para outros cultos de celebridades que passaram pelas Arcadas, hoje esquecidos e desterrados da lembrança coletiva, embora mereçam ao menos uma lamparina votiva em nossa consciência adormecida.

 

 

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