Moraes expõe contradições de Fux, que enfrenta ressaca após voto a favor de Bolsonaro
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), enfrentou calado nesta quinta-feira, 11, a ressaca do voto a favor do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Ontem, ao longo das 12 horas que demorou para concluir sua manifestação, Fux não permitiu intervenções dos colegas. Ele justificou que não queria ser interrompido para não perder a linha de raciocínio.
Ao vetar de antemão os apartes, o ministro tentou minimizar a chance de ser contraditado, evitando embates por estar em menor número. A estratégia foi eficiente durante o voto, mas não blindou as reações na sequência da votação.
Nesta quinta, apagado na sala de sessões, ele ouviu recados e ironias dos colegas, que com atraso rebateram os principais argumentos de seu voto.
Logo na abertura da sessão, e antes de iniciar a leitura do voto, a ministra Cármen Lúcia, a primeira a se manifestar após o monopólio de Fux, fez um discurso sobre a importância do julgamento e defendeu que o STF tem o “compromisso” de dar uma resposta à sociedade sobre a tentativa de golpe, se contrapondo ao colega, que na quarta afirmou que “não compete ao tribunal realizar um juízo político do que é bom ou ruim”.
Em seguida, Flávio Dino pediu a palavra e a ministra, com bom humor, disse que permitiria as intervenções porque o diálogo “faz parte do julgamento”.
O ministro quis intervir para fazer coro em favor da necessidade de responsabilizar os envolvidos na tentativa de golpe. “O que define a paz que nós sempre devemos buscar não é a existência do esquecimento. Às vezes a paz se obtém pelo funcionamento adequado as instâncias repressivas do Estado”, defendeu Dino.
Entre a maioria, o clima alternou entre descontração e veemência. Já Fux, para manter a coerência e também evitar novos reveses, ficou em silêncio ao longo dos votos dos colegas.

As respostas mais incisivas partiram de Alexandre de Moraes, o relator do processo, que na quarta também ouviu em silêncio as críticas de Fux.
Ontem Fux defendeu que o tribunal não pode “confundir o papel do julgador com o do agente político” e que “o juiz deve acompanhar a ação penal com distanciamento” e imparcialidade. A declaração ocorreu no contexto de críticas a Moraes, acusado pelas defesas de assumir um papel de acusador, por vezes mais veemente que a Procuradoria-Geral da República.
Fux disse ainda que “não cabe a nenhum juiz assumir o papel de inquisidor, vasculhar mais de 70 milhões de terabytes de documentos a procura de provas que se encaixem na retórica acusatória” e logo votou para reconhecer que houve cerceamento de defesa pelo relator, abrindo enfrentamento direto a Moraes.
Em resposta nesta quinta, Alexandre de Moraes disse que todas as provas foram compartilhadas com os advogados e que nenhuma defesa usou o material porque os documentos “são completamente impertinentes”.
“Foram quatro meses. São 59 advogados com procuração nos autos, fora as equipes. Sabe quantos documentos eles juntaram como pertinentes? Nenhum”, devolveu Moraes.
Em um recado velado, o relator também fez questão de apontar a contradição de Fux ao votar para absolver Bolsonaro pelo crime de organização criminosa enquanto, no julgamento do Mensalão, reconheceu o crime de quadrilha.
“Essa questão da organização criminosa, cujo entendimento vem desde o julgamento do Mensalão, era outro tipo penal, mas a organização criminosa nada mais é do que existia na legislação”, apontou Moraes.
O relator ainda fez questão de rebater outro argumento de Fux, que descartou a existência de uma organização criminosa armada na trama golpista, embora tenha votado para condenar o tenente-coronel Mauro Cid e o ex-ministro Walter Braga Netto pela Operação Copa 2022, plano violento para monitorar, prender e executar Moraes.
O relator pediu para exibir imagens dos atos violentos no 8 de Janeiro, destacou o envolvimento de oficiais das Forças Especiais do Exército, os “kids pretos” e o outros planos de atentado, como o Punhal Verde e Amarelo.
“Havia forte armamento. A grave violência, a utilização de armas para a violência, os autos demonstram. E grave ameaça”, afirmou Moraes. “Essa organização criminosa queria se perpetuar no poder. Se para isso precisasse matar um ministro do STF, envenenar um presidente da República, praticar peculato, utilizando os poderes de Estado, são crimes indeterminados, crimes para chegar no seu objetivo.”
Até o ministro Cristiano Zanin, o mais comedido dos ministros, fez aditamentos aos colegas, demonstrando o alinhamento extensivo da maioria do colegiado.