STF impõe a Bolsonaro 27 anos e três meses de prisão em regime fechado; veja todas as penas
Depois de formar maioria para condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por todos os cinco crimes atribuídos a ele na denúncia da trama golpista, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) definiu o tamanho da pena. Bolsonaro foi condenado a 27 anos e 3 meses de reclusão em regime inicial fechado.
Segundo a decisão, ele deve cumprir 24 anos e 9 meses de reclusão e 2 anos e 6 meses de detenção, ou seja, em regime semiaberto ou aberto.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do processo, sugeriu a pena e foi acompanhado por unanimidade. O ministro Luiz Fux, o único que defendeu a absolvição de Bolsonaro, não votou sobre a dosimetria. Também participaram do julgamento os ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
O ex-presidente foi condenado por cinco crimes – organização criminosa armada, golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado contra o patrimônio da União.
Mesmo tendo recebido um desconto na pena por ter mais de 70 anos, a sentença de Bolsonaro foi a maior porque ele foi considerado o líder da trama golpista. Uma pena alta era esperada já que seus apoiadores condenados na sequência do 8 de Janeiro foram sentenciados a mais de 17 anos.
Em nota, os advogados Celso Vilardi e Paulo Amador da Cunha Bueno, que representam o ex-presidente, disseram que consideram as penas dele e dos demais réus “absurdamente excessivas e desproporcionais” e que vão aguardar a publicação do acórdão para avaliar os recursos cabíveis, “inclusive no âmbito internacional”.
As penas mínimas e máximas, agravantes, atenuantes e causas de aumento ou diminuição estão previstos na legislação, mas cabe aos magistrados fazer o cálculo a partir desses critérios.
Ao definir as penas, os ministros levaram em consideração a necessidade de dar uma resposta à altura aos golpistas, mas também a importância do caráter “pedagógico” da decisão, ou seja, de deixar para o futuro a mensagem clara de que o tribunal vai tratar com rigor novas tentativas de atentar contra as instituições e, com isso, prevenir novas investidas golpistas.
“As circunstâncias judiciais devem ser analisadas para evitar a reiteração de uma histórica repetição em nosso País da transformação de grupos políticos, com apoio de determinados setores das Forças Armadas, em organizações criminosas”, defendeu Moraes.
O julgamento é histórico. É a primeira vez que um ex-presidente e oficiais do alto escalão das Forças Armadas respondem na Justiça por atentar contra a democracia no Brasil.
“A reprovação e a prevenção a partir da dosimetria da pena deve ser feita para desencorajar a tentativa de obstruir a manutenção da normalidade democrática e a ideia de que a quebra do Estado de Direito é fácil”, acrescentou o relator.

A Primeira Turma do STF também aplicou ao ex-presidente uma multa de 248 salários-mínimos. O valor exato ainda será calculado no processo. É considerado o valor do salário mínimo vigente à época dos crimes e depois o total é atualizado até a data do pagamento, que precisa ocorrer após o trânsito em julgado da condenação (quando não há mais possibilidade de recurso).
Veja como ficaram as penas do ‘núcleo crucial’ da trama golpista:
- Jair Bolsonaro: 27 anos e 3 meses em inicial regime fechado;
- Mauro Cid (ex-ajudante de Ordens da Presidência e delator): 2 anos em regime aberto;
- Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e da Casa Civil): 26 anos em regime inicial fechado;
- Anderson Torres (ex-ministro da Justiça): 24 anos em regime inicial fechado;
- Almir Garnier (ex-comandante da Marinha): 24 anos em regime inicial fechado;
- Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional): 21 anos em regime inicial fechado;
- Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa): 19 anos em regime inicial fechado;
- Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-diretor da Abin): 16 anos, 1 mês e 15 dias em regime inicial fechado.
As prisões não são automáticas. Os réus têm o direito de recorrer antes de começar a cumprir as sentenças. Os recursos, no entanto, se limitam a questionamentos sobre detalhes do acórdão e não têm mais potencial de reverter as condenações.
Ao concluir o julgamento, Moraes voltou a se dirigir ao Congresso, como já havia feito ao votar, e afirmou, sem mencionar diretamente o PL da Anistia, que o caminho para a pacificação é a “aplicação da Constituição e das leis” e não a impunidade.
“Isso leva a que as feridas sejam curadas, que a democracia fique mais forte e que nunca mais se repita uma tentativa de golpe de Estado”, defendeu o ministro.
‘Divisor de águas’
Os ministros Luís Roberto Barroso, presidente do STF, e Gilmar Mendes, decano do tribunal, não compõem a Primeira Turma, mas compareceram na sala de sessões para demonstrar o apoio e a união da Corte. O movimento ocorreu após a divergência de Fux, que fissurou a unidade dos ministros na decisão.
Barroso quebrou o protocolo no STF e fez um discurso ao final do julgamento, em defesa dos procedimentos adotados pelo tribunal e da decisão final da Primeira Turma. O presidente do Supremo disse que o tribunal cumpriu uma missão histórica e que o julgamento é um “divisor de águas na história do Brasil”. Segundo ele, a decisão foi tomada com base em diversas provas e “só o desconhecimento profundo dos fatos ou uma motivação descolada da realidade encontrará no julgamento algum tipo de perseguição política”.
O ministro afirmou ainda que espera que a decisão ajude o Brasil e “virar a página” para que a sociedade possa “trabalhar por uma agenda comum verdadeiramente patriótica”, sem “intolerância, extremismo ou incivilidade”.
“Acredito que nós estejamos encerrando os ciclos do atraso na história brasileira, marcados pelo golpismo e pela quebra da legalidade. Sou convencido de que algumas incompreensões de hoje irão se transformar em reconhecimento no futuro”, concluiu o presidente do STF.
Delação premiada
Por unanimidade, o STF reconheceu a validade da delação de Mauro Cid. Com isso, ele manteve todos os benefícios pactuados no acordo de colaboração com a Polícia Federal.
A defesa pleiteou o perdão judicial ou uma pena privativa de liberdade de no máximo dois anos para o tenente-coronel. Os ministros optaram pela segunda opção por considerar que não é possível perdoar crimes contra a democracia.
“Assim como não cabe indulto pelo presidente, assim como cabe não anistia pelo Congresso, também não cabe perdão judicial pelo Poder Judiciário em crimes contra a democracia. Esses institutos não podem ser usados contra a Constituição”, defendeu Moraes.
Os ministros ressalvaram que, apesar da gravidade dos crimes confessados pelo ex-ajudante de Bolsonaro, o STF não poderia quebrar o acordo.
“Houve um acordo do Estado com esse senhor e, apesar da reprovabilidade alta das condutas que ele adotou, creio que do ponto de vista ético o Estado deve honrar, inclusive à vista de fortalecimento deste instituo relevantíssimo para o desate de outras organizações criminosas”, acrescentou Dino.
Consequências da condenação
Como resultado da condenação, Ramagem perderá o mandato. Ele foi o único que não respondeu por todos os crimes imputados na denúncia. Em relação ao deputado, o processamento da acusação dos crimes associados ao 8 de Janeiro estão suspensos, porque ocorreram após a diplomação.
A condenação por organização criminosa também gera a inelegibilidade dos réus por oito anos, a contar da decisão. A punição está prevista na Lei da Ficha Limpa.
Outro efeito da decisão é a perda dos cargos públicos, que alcançará Ramagem e Torres, ambos delegados de carreira da Polícia Federal. No caso de Augusto Heleno, Almir Garnier e Paulo Sérgio, que são oficiais das Forças Armadas, o Superior Tribunal Militar (STM) será notificado para decidir sobre a perda das patentes.
Além disso, os réus foram condenados a pagar pelos danos causados na Praça dos Três Poderes no 8 de Janeiro. A multa solidária por danos morais coletivos é de R$ 30 milhões e está sendo compartilhada por todos os condenados das ações penais relacionadas aos atos golpistas. Já são centenas de condenados entre executores e instigadores.
COM A PALAVRA, A DEFESA DE BRAGA NETO
Recebemos a decisão com o respeito de sempre ao STF.
Mas não podemos deixar de registrar a indignação com o fato de a Turma ter convalidado, especialmente, o manifesto cerceamento de defesa ocorrido no caso.
Somente dias antes do início da instrução é que tivemos acesso a todos os elementos reunidos na investigação.
Os melhores momentos da Polícia e PGR não são acesso integral e efetivo. Não tivemos tempo para analisar o material e o prejuízo disso é evidente.
No mérito, nos causa espanto que o General Braga Netto seja condenado por supostamente discutir e financiar o plano Punhal Verde Amarelo/Copa 2022.
Está provado nos autos que o delator mentiu sobre a visita acontecida na residência do General. Por outro lado, o delator reconheceu expressamente na acareação que não possui nenhuma prova da suposta entrega do dinheiro. Ainda, o delator declarou mais de uma vez que nem sequer conhecia plano Punhal Verde Amarelo ou operação Copa 2022.
A Turma encampou a narrativa da acusação contra o General Braga Netto, apesar não haver provas de sua participação em qualquer crime. O que sustenta essa acusação são as mentiras do delator, que jamais poderiam basear uma condenação.
Reiterando o respeito à decisão, entendemos que a inocência do General Braga Netto está registrada nos autos.
Todos os recursos cabíveis serão analisados, inclusive às Cortes Internacionais.
Advogados José Luís Oliveira Lima, Rodrigo Dall’Acqua, Rogério Costa, Millena Galdiano e Bruno Dallari Oliveira Lima
COM A PALAVRA, A DEFESA DE JAIR BOLSONARO
A defesa do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro, recebe a decisão da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal com respeito. Contudo não pode deixar de manifestar profunda discordância e indignação com os termos da decisão majoritária.
Nesse sentido, continuaremos a sustentar que o ex-presidente não atentou contra o Estado Democrático, jamais participou de qualquer plano e muito menos dos atos ocorridos em 08 de janeiro.
Também continuamos a entender que o ex-Presidente deveria ter sido julgado pela primeira instância ou, se assim não fosse, pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal; da mesma forma, não podemos deixar de dizer, com todo o respeito, que a falta de tempo hábil para analisar a prova impediu a defesa de forma definitiva.
A defesa entende que as penas fixadas são absurdamente excessivas e desproporcionais e, após analisar os termos do acórdão, ajuizará os recursos cabíveis, inclusive no âmbito internacional.
Celso Vilardi
Paulo Amador da Cunha Bueno