15 de setembro de 2025
Politica

Julgamento de Bolsonaro: Um voto esdrúxulo, um efeito virtuoso

É difícil saber os reais determinantes do voto minoritário do ministro Luiz Fux no julgamento do “núcleo 1” – considerado crucial – dos envolvidos na trama golpista de Bolsonaro. O fato é que sua posição destoou não apenas da maioria da Corte, mas também de sua própria postura anterior, quando proferiu votos duros nas condenações de réus do 8 de janeiro.

Apesar de inconsistente, o voto de Fux pode ter efeitos institucionais relevantes. Ao romper a unanimidade, reduziu a força do argumento de Bolsonaro e de seus seguidores radicais de que o Supremo estaria agindo de forma parcial, em um julgamento de cartas marcadas. Em contextos de alta polarização política, o dissenso interno reforça a legitimidade externa da Corte.

Apesar de inconsistente, o voto de Fux pode ter efeitos institucionais relevantes.
Apesar de inconsistente, o voto de Fux pode ter efeitos institucionais relevantes.

Não se está aqui querendo argumentar que uma decisão unânime de condenação do STF seria menos legítima. Mas a divergência, em ambientes políticos polarizados, traz a percepção de que um dos lados não foi simplesmente alienado. Além do mais, como observa Diego W. Arguelhes no livro “O Supremo: entre o direito e a política”, decisões majoritárias de um tribunal tendem a ser percebidas, inclusive pelo lado derrotado, como mais imparciais e legítimas.

Não se trata de sugerir que Fux tenha assumido deliberadamente o papel de “boi de piranha” em nome da reputação do STF. Mas, ao introduzir conflito e pluralidade no julgamento, sua dissidência ajuda a blindar a Corte de ataques políticos e a esvaziar iniciativas de contenção judicial – o chamado court-curbing.

Como argumentam Daniel Bogéa e Luciano Da Ros no artigo “Contenção judicial: mapa conceitual e pedidos de impeachment de Ministros do STF”, ações de contenção do Supremo tendem a prosperar quando ganham densidade política e encontram um clima de deslegitimação pública da Corte. O voto divergente de Fux atua justamente no sentido inverso: ao sinalizar que não há unanimidade artificial, aumenta a percepção de justiça processual.

Esse efeito, porém, não é homogêneo na sociedade. Ele tende a ser mais significativo entre a direita não bolsonarista – o maior grupo do campo conservador –, que não se identifica com Lula, mas tampouco adere ao bolsonarismo radical. Para esses eleitores, o dissenso interno funciona como um beyond reasonable doubt (acima de qualquer dúvida razoável), capaz de legitimar a condenação.

Ao fim, mesmo um voto minoritário e contraditório pode produzir efeitos virtuosos. O Supremo sai mais protegido contra o discurso de parcialidade e contra ofensivas legislativas de contenção. No cálculo político, a divergência de Fux fortalece, paradoxalmente, a autoridade da própria Corte.

 

 

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