18 de outubro de 2025
Politica

Morte de Charlie Kirk leva a ‘caçada’ a detratores, e Nikolas Ferreira comanda campanha no Brasil

BRASÍLIA – O assassinato do ativista trumpista Charlie Kirk na semana passada nos Estados Unidos tem levado a uma “caçada” contra usuários na internet que debochem de sua morte. A campanha, que começou nos EUA, já ganhou seu braço no Brasil.

Kirk, 31 anos, foi morto com um único tiro no pescoço durante a participação num evento na Universidade Utah Valley. Ele era cofundador da organização política sem fins lucrativos Turning Point USA e um aliado próximo de Trump.

Comunicador trumpista Charlie Kirk foi assassinado em 10 de setembro com um tiro no pescoço
Comunicador trumpista Charlie Kirk foi assassinado em 10 de setembro com um tiro no pescoço

Admiradores de Kirk passaram a mapear detratores para expô-los e pressionarem pela demissão de seus locais de trabalho. A campanha se dá após anos de críticas de conservadores à chamada “cultura do cancelamento” associada à esquerda.

O movimento ganhou força com a adesão de bolsonaristas e trumpistas que levam as publicações-alvo para o governo americano. No Brasil, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) tem se dedicado desde o atentado a identificar esses usuários. Procurado, ele não se manifestou.

Pesquisadora da Universidade Federal de Santa Catarina e especialista em antropologia digital e radicalização, Letícia Cesarino diz ver na campanha contra detratores de Kirk uma espécie de escalada de um padrão de perseguição existente há anos, em especial nas redes sociais.

“A esquerda tem essa coisa de boicote a marcas, mas a extrema direita tem esse passo a mais de perseguição de pessoas, muitas vezes pequenas, que não são influenciadores, visando punição extrajudicial, através de pressão pública sobre empregadores”, diz ela.

O movimento seria diferente de um chamado ao cancelamento ou ao linchamento porque, segundo a pesquisadora, esses dois comportamentos exigem alvos pré-determinados. Ela o define como uma “mobilização de guerra”.

Cesarino diz que a campanha tem uma vantagem operacional, uma vez que mobiliza a militância de direita, não apenas discursivamente, mas de maneira prática. Os fãs de Kirk se sentem parte da “guerra contra o mal, contra a esquerda” ao ajudarem as lideranças políticas a identificarem os detratores.

“No caso do Charlie Kirk, a minha impressão é que isso toma essa proporção em razão de um ‘vácuo’, na medida em que não ficou comprovado que a motivação do atirador foi ideológica e que ele tem uma ideologia de esquerda. Como eles (conservadores) não podem ter o próprio atirador como esse inimigo, eles vão para essa questão lateral, pegando qualquer pessoa (debochando do assassinato), e não o atirador em si”, afirma.

A pesquisadora diz ver na campanha pós-morte de Kirk um “fenômeno novo”, pois articula vários padrões que existiam separadamente.

“Aparentemente esse rapaz (Robson) não tinha uma ideologia política reconhecida nos termos anteriores. É mais uma atuação dialética em cima dessa pós-política que está adquirindo essa característica que pode reverberar para uma violência extrema online. Me lembrou mais a questão dos ataques a escolas, uma violência meio niilista que visa uma certa exposição. Tanto é que não foi difícil pegá-lo, ele (o atirador) mesmo se entregou depois de conversar com os amigos no Discord. É um padrão piorado do que a gente já via antes”.

Os prints que Nikolas publicou

No dia seguinte ao assassinato de Kirk, Nikolas publicou prints de comentários de dois usuários que haviam pregado violência contra ele, inclusive sua morte. A empresa em que um deles trabalha publicou uma nota oficial anunciando a demissão do funcionário, e depois excluiu a conta das redes sociais.

Nikolas, então, publicou uma mensagem para alavancar a campanha de perseguição. “O movimento começou: demita os verdadeiros extremistas de sua empresa. Denuncie”, que rendeu 46 mil curtidas e alcançou 1 milhão de pessoas no X (antigo Twitter).

No fim de semana, o médico brasileiro Ricardo Barbosa entrou na mira do governo americano depois que Nikolas e Thiago Medina, vereador pelo PL em Recife, publicaram o comentário feito pelo usuário no Instagram, em que ele dizia: “um salve a este companheiro de mira impecável. Coluna cervical”.

Christopher Landau, vice-secretário do Departamento de Estado chefiado por Marco Rubio, anunciou que pediu a revogação do visto americano de Barbosa.

“De todo o conteúdo online depravado que já vi, este talvez seja o mais assustador. Este é um NEUROCIRURGIÃO do Brasil”, escreveu o número dois da diplomacia americana. “Eu pessoalmente ordenei ao chefe de Assuntos Consulares que revogasse seu visto americano, se ele tivesse um, e que colocasse um alerta nele para garantir que nunca o recebesse.”

Landau tem passado os últimos dias respondendo a usuários brasileiros e de outros países que levam até ele prints de comentários jocosos sobre Kirk. No sábado, ele reagiu a uma foto, compartilhada por outro usuário, que mostrava o comunicador Felipe Neto fazendo compras nos Estados Unidos. “Não é o shopping Premium Outlets em Orlando?”, comentou o vice-secretário numa publicação que pedia a revogação do visto de Neto.

A vereadora Sonaira Fernandes, do PL de São Paulo, afirmou ter oficiado o Theatro Municipal da cidade para discutir a demissão de um colaborador que havia chamado Kirk de neonazista. Nikolas diz ter recebido uma mensagem de WhatsApp do prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes (MDB), pedindo a demissão do rapaz.

Nikolas e outros parlamentares e lideranças da direita partiram para cima de empresas e instituições como a revista Vogue Brasil, a PUC-Rio, a PM do Ceará, o Conselho Regional de Medicina de Pernambuco, a Recife Day Clinic, Arena RM, Brasil Center Comunicações e Jovem Nerd.

“Muitas denúncias interessantes hoje. Nós vamos atrás de você”, comentou o deputado mineiro em meio à campanha. Ele afirmou ter começado o movimento no Brasil pedindo às empresas que “funcionários que celebram, apoiam ou incentivam a morte de oponentes políticos — especialmente os servidores públicos”.

“Não queremos que o dinheiro dos nossos impostos sustente essas pessoas. Façam o mesmo nos EUA. Eles são livres para dizer o que quiserem, mas as empresas também são livres para demiti-los”, escreveu.

Figuras públicas progressistas, como o deputado federal Túlio Gadêlha (Rede-PE), os humoristas Whindersson Nunes e Tiago Santineli e o ator José de Abreu, passaram a peitar o movimento.

“Todo mundo que (es)tiver perdendo emprego por causa do Nikolas. Falem comigo aqui que eu divulgo seu trampo no Instagram, canal do YouTube, vou fazer um vídeo só para isso”, escreveu Santineli, que usa uma estética similar à bolsonarista para produzir conteúdo com deboche e provocação aos adversários.

A morte de Kirk desencadeou uma nova frente de batalha na guerra entre esquerda e direita no mundo. Mesmo sem informações a respeito da identidade do suspeito de matar o comunicador nos primeiros dias pós-atentado, seus apoiadores começaram a especular que algum ativista de esquerda devesse estar por trás do crime.

“Se a esquerda mata pessoas e não é chamada de extrema esquerda, imagine se ela fosse”, publicou Nikolas na semana passada. Depois, ele defendeu radicalizar contra o que ele considera ser uma violência política dirigida aos conservadores: “Mataram a direita moderada. Querem que morramos mansos e calados. Pois que nos chamem de extremistas. Não tem mais volta”.

O governador de Utah, Spencer Cox, chegou a dizer em entrevista coletiva ter “rezado” para que o suspeito do assassinato não fosse americano ou daquele Estado. Ele lamentou que Tyler Robson, apontado como o autor do crime, fosse morador local, como se a origem do assassino tivesse relevância. A declaração não pegou bem, e usuários alegaram que Cox havia sido xenofóbico.

Autoridades do governo Trump ameaçaram na segunda-feira, 15, usar o poder do governo federal para uma ação repressiva sobre o que eles alegaram ser uma rede de esquerda que financia e incita a violência contra conservadores.

A Casa Branca e os aliados do presidente Donald Trump sugeriram que Robson fazia parte de um movimento coordenado que fomentava a violência contra conservadores – sem apresentar evidências. Os Estados Unidos passam por uma onda de violência em todo o espectro político, tendo como alvo democratas e republicanos.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *