PEC da Blindagem domina buscas, sofre rejeição nas redes e impulsiona atos convocados pela esquerda
Já se aproximava da meia-noite quando a Câmara dos Deputados aprovou a PEC da Blindagem, proposta que dificulta a prisão de deputados e senadores. A votação em horário tardio, comum em pautas impopulares, não evitou que o tema entrasse na ordem do dia dos brasileiros. Levantamento exclusivo do Google Trends mostra que a PEC, ao lado da condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), esteve entre os assuntos mais buscados no Brasil na última semana, atrás apenas de jogos de futebol.
As buscas pela PEC da Blindagem aumentaram 25 vezes (+2.400%) de terça para quarta-feira, segundo os dados do Google Trends. As principais dúvidas dos usuários eram sobre o conteúdo da proposta e quais parlamentares votaram a favor.
A repercussão colocou o Congresso Nacional no centro das atenções, mas sob um viés majoritariamente negativo e com a esquerda conseguindo dominar a narrativa digital. É o que mostra uma análise da consultoria AP Exata obtida pelo Estadão.

A AP Exata examinou 32 mil menções à PEC da Blindagem até a noite de quarta-feira, 17, no X e no Instagram. O saldo foi amplamente negativo: 78,6% das postagens eram contra a proposta e apenas 14,2% saíam em defesa. Nos perfis ligados à esquerda, a rejeição foi quase unânime (96,8%). Já entre as contas de direita, a maioria (63,9%) apoiou a medida, com o argumento de que o Judiciário persegue parlamentares conservadores. No campo do centro, a balança pendeu contra: 66,4% se disseram contrários, frente a 21,7% favoráveis
Ainda segundo a AP Exata, a esquerda conseguiu pautar o debate nas redes, respondendo por 46,7% das postagens sobre o tema no X e no Instagram, contra 25,4% da direita.
Para Sergio Denicoli, CEO da AP Exata e cientista de dados, a esquerda conseguiu se impor no debate nas redes, o que se refletiu na ampla rejeição à proposta.
“A esquerda conseguiu dominar a narrativa, passar a ideia de que o crime agora vai estar dentro da Câmara, que traficante vai querer ser deputado. A esquerda conseguiu colar com força o selo de que quem apoia a PEC está protegendo bandido. Houve muita revolta e indignação nas redes. De forma geral, os moderados não gostaram da proposta, a esquerda menos ainda, e a direita ficou sem saber o que dizer — é uma pauta difícil de rebater. Entendo que seja difícil a PEC vingar porque a direita só conseguiu falar com a própria bolha, enquanto a esquerda furou essa barreira e conseguiu alcançar os moderados”, diz Denicoli.
A repercussão negativa da PEC ganhou força com manifestações contrárias de artistas, como Anitta e Caetano Veloso, e animou partidos de esquerda, que votaram majoritariamente contra a medida. Movimentos sociais, como a Frente Povo Sem Medo, ligada ao deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), convocaram protestos em diversas capitais, entre elas São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife.
Os chamados para os atos chamam o Congresso de “inimigo do povo” e miram não apenas a PEC da Blindagem, mas o projeto de anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro, cuja tramitação em regime de urgência foi aprovada nesta semana.
“Tivemos uma reunião da Executiva Nacional do PT nesta quinta-feira, com a participação do presidente nacional do PT, Edinho Silva, e dos presidentes estaduais, e aprovamos o estado permanente de mobilização. Estaremos nas ruas no domingo, mobilizando nossos diretórios estaduais e municipais para se juntarem às manifestações da Frente Brasil Sem Medo e da Frente Brasil Popular”, diz o secretário de Comunicação do PT, Éden Valadares. Segundo ele, o partido também aprovou uma orientação à bancada do Senado para votar contra todas as “iniciativas de anistia e impunidade”.
Segundo a AP Exata, no X, foram 48,9 mil publicações hoje com a frase “Dia 21 Povo na Rua”, com alcance estimado de 15,6 milhões de pessoas. Segundo o CEO da consultoria, no entanto, a mobilização está muito focada na esquerda, sem adesão ainda em outras bolhas. “A esquerda foi eficaz em divulgar o ato, mas vai precisar engajar até domingo, para que seja algo representativo”, explica Denicoli.
Anistia também pautou internet
Os dados do Google Trends mostram que a anistia também pautou a internet e, com exceção dos jogos de futebol, foi o assunto com maior crescimento no Google no Brasil nas últimas 24 horas. As buscas sobre o tema aumentaram sete vezes no período (+590%).
Já a AP Exata analisou 20 mil menções sobre anistia nesta quinta-feira no X e no Instagram. Entre as publicações, a esquerda se posicionou majoritariamente contra o projeto (92,3%), enquanto a direita apareceu em maioria favorável (69,8%). O público em disputa é o do centro: nesses perfis, 44,2% das postagens foram contrárias e 36,2% favoráveis.
“A gente observa que houve um crescimento dos moderados em relação à anistia. Eles estão muito eficazes, pressionando deputados a se posicionar e dominando a narrativa. O moderado é quem a gente precisa observar: há um volume curioso de apoiadores entre esse espectro. O fato de o Bolsonaro ter ficado doente também mobiliza um pouco. E uma coisa interessante é que a campanha da direita não foi focada no Bolsonaro, mas nas pessoas do 8 de Janeiro, mostrando fotos das famílias dos condenados. Se a esquerda domina o debate da PEC, a direita domina o da anistia”, diz Denicoli.