24 de setembro de 2025
Politica

O que a votação da PEC da Blindagem vai demonstrar sobre o caráter da cada senador

Em 19 de julho de 1999, o motorista de um Chrysler Stratus foi parado na Marginal do Pinheiros por dois investigadores da Delegacia de Roubos a Bancos. O homem, procurado pelo roubo milionário da Transpev, não reagiu. Seu nome era Marco Willians Camacho, o Marcola. O delegado que o prendeu era um jovem policial. Seu nome? Ruy Ferraz Fontes. Marcola nunca mais saiu da cadeia. Na segunda-feira retrasada, o PCC fechou essa conta. Ruy está morto.

O senador Alessandro Vieira, relator da PEC da Blindagem: ela já avisou que o texto não passa
O senador Alessandro Vieira, relator da PEC da Blindagem: ela já avisou que o texto não passa

Nenhum dos 344 deputados que aprovaram a chamada PEC da Blindagem compareceu ao velório do doutor Ruy. Se lá fossem, poderiam perguntar a policiais e promotores o que pensam da medida. Como ficam, por exemplo, os responsáveis por colocar na cadeia o deputado TH Joias, que, de dentro da Assembleia Legislativa do Rio, ajudava traficantes de drogas e armas? A coluna ouviu alguns desses policiais. O incômodo era grande. Um integrante da Inteligência da Polícia Civil resumiu: “Cuspiram no caixão do doutor Ruy”. Podiam propor uma Lei Antimáfia; preferiram, no dia do enterro, salvar os THs. Em que mundo vivem os deputados? Em Nárnia? Não sabem que o crime organizado é a principal urgência neste país?

Ruy era o delegado-geral quando foi descoberto o gigantesco esquema de desvio de verbas da saúde por meio de organizações sociais que mantinham contratos para administrar hospitais em diversos Estados: a Operação Raio X. Os donos das OS e lobistas foram flagrados em conversas com deputados estaduais. Recebiam segurança de policiais e de bandidos do PCC. Tudo junto e misturado.

E assim permanece. A sombra ameaçadora da Operação Carbono Oculto começa a incomodar gabinetes em Brasília, que se dedicavam a defender os interesses de Roberto Augusto Leme da Silva, o Beto Louco, e seu sócio Mohamad Hussein Mourad, acusados de chefiar o esquema que movimentou bilhões na Faria Lima, obtidos com fraudes e sonegação de impostos em parceria com o PCC – aí incluído o núcleo do qual participava um homem apontado como o operador financeiro de Marcola. Quem se deitou com o dinheiro da facção que aguente.

Câmara aprovou PEC da Blindagem, que aumenta a proteção de deputados contra processos e prisões de deputados, na terça-feira, 26, dia do enterro do delegado Ruy
Câmara aprovou PEC da Blindagem, que aumenta a proteção de deputados contra processos e prisões de deputados, na terça-feira, 26, dia do enterro do delegado Ruy

A PEC está agora nas mãos de outro delegado, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE). Ele já disse que ela não passa na Casa. Nem com modificações, o que seria devolvê-la à Câmara. Ou seja… Quem zela pela lei e pela ordem não pode contribuir para a desordem, a corrupção e a impunidade. Não é preciso lembrar aos senhores senadores: o que protege as prerrogativas do Congresso – bem como a incolumidade de seus membros em uma democracia – é, antes de tudo, o caráter de cada parlamentar. Esta deve ser a mais importante de todas as defesas.

 

 

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