29 de setembro de 2025
Politica

Novo presidente do STF, Fachin se equilibra entre moderação e avanço; veja o que dizem especialistas

BRASÍLIA – O ministro Edson Fachin toma posse como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira, 29, com a expectativa de que imprima um perfil discreto e austero à Corte e dê prioridade a pautas sociais. Zelador da chamada “autocontenção” do Judiciário ao mesmo tempo que é dono de votos progressistas, o estilo dele se distancia em alguns aspectos – e em outros marca continuidade – em relação ao seu antecessor no cargo, Luís Roberto Barroso.

Assim como Barroso, Fachin não é habitué das relações políticas e mantém certa distância do Palácio do Planalto e do Congresso. Mas, diferentemente do antecessor, tem um perfil reservado, e raramente dá palestras e faz declarações públicas. As falas em eventos costumam ter tom institucional, avaliam especialistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast. Um deles aponta que um dos desafios de Fachin é de ordem interna, que é convencer seus colegas de Corte a adotarem atuações mais na colegialidade e menos monocráticas.

Ministro Edson Fachin, novo presidente do STF
Ministro Edson Fachin, novo presidente do STF

No caso que lhe rendeu mais holofotes, Fachin passou a ser relator da Operação Lava Jato após a morte do ministro Teori Zavascki, em 2017. As decisões dele de caráter punitivista – mesma ala de Barroso – o levaram a ser considerado um “herói” da direita. Partiu da mesma caneta, porém, a decisão que anulou as condenações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba. A decisão foi confirmada pelo plenário.

Em outro ponto que o diferencia do antecessor, Fachin costuma se manifestar em votos e em declarações públicas com um “jurisdiquês” apelidado nos bastidores da Corte de “fachinês”. Já Barroso fez do “pacto pela linguagem simples” no Judiciário uma das marcas de sua gestão.

Ao menos no discurso, Fachin se manifesta contra o protagonismo do Judiciário e costuma repetir: “Ao direito o que é do direito, à política o que é da política”. Em uma fala recente, Fachin disse que é “o preconceito elitista contra a política” que “tende a justificar a atuação do Supremo como resposta à suposta omissão do Congresso”.

Mas isso não significa que o ministro não vote para derrubar leis nem reconheça omissões da política. Em um voto histórico em conjunto com o ministro Celso de Mello, o ministro enquadrou a transfobia como crime de racismo. A partir do voto, seguido por mais seis ministros, o Supremo reconheceu que houve omissão do Congresso por não editar lei que criminalizasse esses atos.

Fachin também foi relator do caso conhecido como “ADPF das Favelas”, julgado neste ano, em que o STF determinou uma série de medidas para a redução da letalidade policial em operações nas comunidades do Rio de Janeiro.

Para Conrado Hübner Mendes, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), “autocontenção” não passa de uma “palavra de conteúdo vazio”. Na sua avaliação, o discurso de Fachin é mais estratégico do que de fato uma promessa de que vai “tirar o Supremo do campo”.

“Quando se fala em autocontenção, não se fala em renúncia do poder de controlar a constitucionalidade e proteger direitos. No fundo, o termo autocontenção é uma grande armadilha retórica que a esfera pública gosta de escutar, porque responde a uma acusação nem sempre correta de que o STF está usurpando o papel dos outros Poderes”, disse.

“Eu acho que ele (Fachin) dá uma resposta dizendo que o Supremo precisa, de fato, tomar cuidado com certas divididas de bola com a política, mas é muito perigoso esse discurso, porque autocontenção pedida pelo Parlamento é, no final das contas, um pedido para que o Supremo deixe de exercer a sua função”, afirmou o especialista.

Para Álvaro Palma de Jorge, professor da FGV Direito Rio, a personalidade de Fachin pode ajudar a “distensionar” questões em relação à Corte, intensificadas pelo julgamento da trama golpista que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a mais de 27 anos de prisão. “Ele é um magistrado mais discreto, não gosta muito de holofote, não procura se expor, não fala fora dos autos, não está emitindo nem opiniões sobre o dia a dia do País. Na sua presidência, ele deve tentar marcar essa distinção, que ele já anunciou, entre o direito e a política”, avaliou o professor.

Jorge destaca que o papel do presidente do STF é influenciar pelo “exemplo”, já que não há uma hierarquia em relação aos demais ministros. Para o especialista, um dos maiores desafios de Fachin será convencer seus pares “a agirem mais na colegialidade e menos na individualidade”.

Prioridades de Fachin no comando do STF

Ao definir a pauta da primeira semana na presidência do Supremo, Fachin já indicou sua prioridade inicial: o processo que trata da “uberização”. A controvérsia gira em torno da existência, ou não, de vínculo empregatício dos motoristas de aplicativo. O caso, de repercussão geral, teve origem em um recurso da Uber contra decisão da Justiça do Trabalho que condenou a empresa a pagar encargos trabalhistas aos motoristas.

Fachin tem sido uma voz solitária – mais recentemente acompanhada por Flávio Dino – na defesa da competência de juízes trabalhistas para verificar a existência de fraude e reconhecer vínculo empregatício em casos de trabalhadores “pejotizados”. Para a maioria do Supremo, tais contratos são válidos e deve-se aplicar a decisão que reconheceu a terceirização irrestrita, em 2018.

Nos próximos meses, o Supremo deve enfrentar o tema sob duas óticas: a de Fachin, que tende a ser mais protetiva ao trabalhador, e a do ministro Gilmar Mendes, que critica abertamente a Justiça do Trabalho. Gilmar relata outra ação sobre o tema, que questiona a “pejotização” em relações sem intermediação de aplicativos. Há uma audiência pública marcada para 6 de outubro.

Outro tema que deve ser resolvido na gestão de Fachin é o marco temporal para demarcação de terras indígenas. Ele é relator da ação que declarou a inconstitucionalidade da tese em 2023. Mais recentemente, o tema passou a ser tratado pelo ministro Gilmar, que relata ações sobre a Lei do Marco Temporal – que recriou a tese contrariando a decisão do STF.

Gilmar enviou as ações para a conciliação, em um esforço que durou meses e rendeu poucos resultados, sob protesto de povos indígenas, associações e partidos que pedem a suspensão imediata da lei. Os pedidos também foram direcionados a Fachin, que optou por aguardar que Barroso pautasse os pedidos para se posicionar. Agora, com o poder da pauta em suas mãos, é provável que o tema avance.

 

 

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