Foro privilegiado é de fato um privilégio? Demora no julgamento pode servir para fugir da condenação
BRASÍLIA – Na últimas semanas, a oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Câmara aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Blindagem, que proibia a abertura de investigações de deputados e senadores sem autorização previa da Casa do parlamentar. O texto acabou barrado no Senado após ampla mobilização popular liderada pela esquerda, mas, no quadro geral, os legisladores brasileiros ainda seguem com tratamento diferenciado na Justiça que abre brecha para a prescrição de crimes e impunidade.
O foro privilegiado concedido a deputados, senadores e outras autoridades da República, como presidente e ministros de Estados, concentra os casos desses políticos no Supremo Tribunal Federal (STF). Em tese, o julgamento por uma única instância poderia levar a condenações mais rápidas, mas especialistas apontam que este instituto provoca justamente o contrário e pode causar prescrições de ações penais.

O objetivo do foro privilegiado é fazer com que juízes de instâncias inferiores não sejam alvo de pressões que os políticos investigados poderiam exercer buscando decisões favoráveis. Além disso, a medida também visa proteger parlamentares e autoridades do Executivo de serem penalizados excessivamente por decisões de magistrados de primeira ou segunda instância.
Mas, na prática, a concentração de casos no STF, que é formado por 11 ministros, passou a criar um gargalo no julgamento dessas autoridades. Foi este motivo que levou o novo presidente do STF, Edson Fachin, a defender o fim do foro privilegiado quando era relator da Operação Lava Jato, em 2017. Na avaliação dele, a morosidade dos julgamentos no Supremo permitia que os políticos escapassem das eventuais condenações.
Um caso emblemático é o do deputado federal Fernando Giacobo (PL-PR). O Ministério Público moveu ação penal contra o político pelos crimes de formação de quadrilha e falsidade ideológica. Após 11 anos de tramitação, as acusações prescreveram devido à demora para o julgamento.
Somado a isso, deputados e senadores ainda estão protegidos pela possibilidade de terem as suas ações penais suspensas pelo Congresso. Basta que o partido ao qual o deputado é filiado leve essa proposta ao plenário da Casa da qual ele fez parte e, caso a maioria decida favoravelmente, a acusação é congelada pelo tempo em que durar o mandato.
Essa manobra foi colocada em prática em abril deste ano, quando o PL tentou levar para votação um pedido que impediria a ação contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ). A demanda não avançou e Ramagem foi condenado pela Primeira Turma do STF a 16 anos e um mês de prisão por envolvimento na tentativa de golpe de Estado orquestrada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados entre 2022 e 2023.