2 de outubro de 2025
Politica

Rejeitado nas redes e criticado até por aliados, pedágio free flow vira desgaste para Tarcísio em SP

Os novos pedágios “free flow” se tornaram um dos focos de desgaste da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) e já acendem alerta no Palácio dos Bandeirantes. O novo sistema, que elimina as praças físicas e faz a cobrança da tarifa de forma automática, a partir da leitura da placa ou da tag do veículo, virou munição da oposição e tem recebido críticas até de deputados da base. Aliados do governador avaliam que o tema é impopular e pode causar desgaste junto ao eleitorado.

Procurado, o governo não respondeu. Em nota, a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) informou que “as cobranças nos trechos somente são autorizadas após a conclusão, por parte das concessionárias, dos investimentos necessários e previstos em contrato”.

Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas sofre desgaste político por conta de pedágios free flow em rodovias estaduais
Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas sofre desgaste político por conta de pedágios free flow em rodovias estaduais

De um lado, a gestão estadual argumenta que os pedágios “free flow” vão atrair investimentos, melhorar a fluidez do trânsito e tornar a cobrança mais justa, já que o motorista paga só pelo trecho percorrido. De outro, a oposição, acompanhada por parte da base de Tarcísio, sustenta que o modelo pesa no bolso da população, sobretudo de quem vive nas cidades onde os pontos de cobrança foram instalados.

Filiado ao partido de Tarcísio, o deputado estadual Vitão do Cachorrão (Republicanos) virou um dos principais críticos do free flow na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Ele assinou, junto a parlamentares de PT, PSB, PSOL e PCdoB, um projeto que tenta derrubar o decreto estadual que autorizou o sistema no Estado.

Em um vídeo que gravou deitado às margens da rodovia Raposo Tavares, Vitão implora “pelo amor de Deus” para que Tarcísio retire o sistema free flow do local e diz que moradores de um bairro de Sorocaba terão de pagar pedágio até para “buscar um pão”.

Na terça-feira, ele voltou ao tema na tribuna da Alesp e disse que, mesmo sendo do partido do governador, vai se opor aos novos pedágios até o fim do mandato.

Outro crítico ao modelo é o deputado Gil Diniz, filiado ao PL, legenda que integra a base do governador. Ele questiona principalmente as cobranças nos pórticos instalados na Raposo Tavares. Desde 1.º de outubro, a rodovia conta com três pontos de cobrança automática, sendo que outros quatro estão previstos até o fim deste ano.

“O metrô parou em Taboão da Serra. Em cidades como Cotia e Vargem Grande não há trem nem metrô, o trânsito é caótico e, agora, há pedágio”, criticou o deputado bolsonarista, conhecido como Carteiro Reaça. “O modelo free flow vai dificultar muito (a vida da população), sobretudo dos idosos e daqueles que têm dificuldade com o mundo digital.”

Nas redes sociais, o tema tem mobilizado a opinião pública. Um levantamento da AP Exata, feito a pedido do Estadão, registrou 6,9 mil publicações únicas sobre o tema no X, TikTok e Instagram nos últimos 30 dias. Elas geraram 21 mil comentários e alcançaram cerca de 9 milhões de pessoas.

“É algo muito relevante e com imenso potencial de mudar narrativas”, explica Sergio Denicoli, CEO da AP Exata, acrescentando que a análise inclui todas as publicações sobre o tema, inclusive comentários.

A AP Exata identificou que a maioria das postagens nas redes (63,3%) é reprovando o free flow em São Paulo. Apenas 25,4% manifestam apoio, enquanto 11,3% são neutras.

A rejeição é quase unânime entre perfis de esquerda (87,8%). Na direita, embora haja mais divisão, também predomina a crítica: 55,8% desaprovam, contra 34,7% que aprovam. Já entre os moderados, há tendência de apoio: 43,9% defendem o modelo, ante 34,5% que o rejeitam.

Denicoli diz que a esquerda transformou o tema em bandeira política contra Tarcísio e, por isso, é o campo com maior participação narrativa no debate. “Como a esquerda é massivamente contra, há hoje uma predominância narrativa desse espectro. Ou seja, quem está formando mais opinião é quem critica, e isso é prejudicial ao governo em termos de imagem, embora seja um quadro possível reverter com uma campanha explicativa.”

Tarcísio quer 79 pedágios com sistema free flow até 2030

A lei que instituiu o modelo free flow nas rodovias nacionais foi sancionada em 2021, quando Tarcísio comandava o Ministério da Infraestrutura no governo Jair Bolsonaro (PL). Na época, o então ministro implantou o sistema de cobrança eletrônica nas rodovias federais Dutra e Rio-Santos. Agora, à frente do governo paulista, tenta replicar a iniciativa sob forte ofensiva da oposição, que o apelidou de “pai do free flow” no País.

Como mostrou o Estadão, a expectativa é que as principais rodovias paulistas tenham 79 pedágios com o sistema free flow até 2030. Atualmente, há seis em funcionamento: um na Tamoios, um na Carlos Tonani, um na Laurentino Mascari e três na Raposo Tavares. A Artesp prevê instalar outros 13 em 2025, elevando o total para 19 até o fim do ano.

Embora parte da base critique o modelo, há também quem o defenda. Para o deputado Altair Moraes (Republicanos), o free flow representa um avanço na infraestrutura paulista e uma demonstração de modernidade da gestão estadual. “A oposição critica, mas se esquece de que o modelo antigo, com praças de pedágio, gera congestionamentos e custos desnecessários aos motoristas”, afirmou.

Apesar de afirmar que o free flow é irreversível, Tarcísio fez recuos. Em abril, após protestos no interior, reduziu de 13 para 9 os pórticos previstos na Rota Sorocabana. Disse, à época, que projetos podem ser ajustados e que a medida buscava evitar cobranças em áreas urbanas.

Na Alesp, há uma série de propostas legislativas que versam sobre os pedágios free flow. Há pedidos de deputados para isentar moradores de determinadas regiões; não cobrar tarifa de proprietários de carros de coleção durante os finais de semana e feriados; deixar de exigir a cobrança de públicos específicos, como trabalhadores da saúde ou pessoas com deficiência; e há pedidos mais ousados, pedindo para rever a instalação de pontos.

Nos últimos dias, o deputado estadual Tenente Coimbra (PL) anunciou ter sido atendido em dois pedidos pelo governo: a isenção do pedágio para moradores de quatro bairros da Área Continental de Santos (SP) e a unificação de praças no Vale do Ribeira, que afetam Itariri, Pedro de Toledo e Miracatu. Segundo ele, antes, o Estado previa a instalação de três equipamentos de cobrança entre os municípios. Agora, essas estruturas serão transferidas para a Rodovia Rio-Santos.

Oposição explora desgaste dos pedágios

A adoção do free flow deu à oposição uma pauta concreta para trabalhar. Depois de um longo período sem conseguir emplacar um tema contra a gestão paulista, a esquerda agora aposta em diferentes frentes para surfar no desgaste do Palácio.

O deputado estadual Simão Pedro (PT) protocolou uma representação no Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) contra a implementação dos novos pedágios. Já o deputado estadual Reis (PT) realizou audiências públicas contra a medida em diferentes cidades, como Alumínio, Americana, Santa Bárbara d’Oeste, Serra Negra e Sorocaba.

Reis considera que o governo estadual não investiu o suficiente em campanhas para orientar a população sobre o sistema free flow. “A maioria das pessoas não sabe o que é free flow. Muitos motoristas passam achando que se trata de um radar”, disse.

Para o petista, a falta de informação tende a ampliar as multas por evasão de pedágio, infração grave que custa R$ 195,23 e rende cinco pontos na CNH. Ele alerta ainda que, se o número de pórticos crescer até o fim do ano, como prevê a Artesp, as autuações devem se multiplicar. “É muito temerário seguir com o free flow assim”, afirmou.

No plano federal, as multas por evasão de pedágio no free flow já são alvo de contestação judicial. Em um ano, um pórtico da Rio-Santos gerou mais de 1 milhão de autuações. No último dia 26, o Ministério Público Federal entrou com ação civil pública questionando o volume de multas, pedindo que o repasse às concessionárias seja considerado inconstitucional e defendendo que as penalidades são desproporcionais.

A ofensiva petista inclui também manifestações nas ruas, abaixo-assinado e posts nas redes sociais. Um vídeo publicado no Instagram pelo deputado estadual Antônio Donato (PT), crítico ao sistema free flow, soma mais de 1 milhão de visualizações.

Outro conteúdo que viralizou foi um vídeo feito com inteligência artificial em que Tarcísio aparece dançando enquanto pedágios são instalados nas rodovias de São Paulo. A paródia traz versos como: “Esse pedágio é sorrateiro / Ele te cobra sem avisar / Tá aparecendo no Estado inteiro / E vai te endividar”. O post no perfil do PT já superou 700 mil visualizações.

 

 

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