11 de outubro de 2025
Politica

Epidemias não são novidade

Tendemos a esquecer as coisas. Boas ou ruins. Parece que a Covid19 foi coisa do século passado. Já não se fala nela. E pensar que, durante seu auge, havia a esperança de que a humanidade sairia mais fraterna, mais solidária, mais polida! Ilusão vã. Só quem não conhece – e nem desconfia – da qualidade da matéria de que é feita a espécie que se considera racional, é que ousaria sonhar com essa utopia.

Mas epidemias não constituem novidade no Brasil. Em março de 1889, irrompeu um violento surto de febre amarela, que provocou alarme, confusão e terror principalmente em Campinas, um florescente centro de progresso.

Para administrar a crise que se instalou, formou-se um pugilo de cidadãos prestantes, em torno a Bento Quirino e José Paulino, para assumir os serviços públicos. Oriundos de família jundiaiense, José Bueno e Maximiano de Camargo foram verdadeiros heróis, ao lado de Alberto Sarmento e Cônego Cipião Junqueira, Padre Neri, mais tarde o primeiro bispo de Campinas, Joaquim Gomes Pinto e Alberto Müller.

Em torno à associação chamada “Protetora dos Pobres”, faziam visitas domiciliares aos enfermos abandonados, levando medicamentos, alimentação e conforto. O auxílio era imediato e efetivo. Sem burocracia.

Exemplo de participação da sociedade civil na resolução de problemas que afetam a cidadania. Algo que parece faltar em nossos dias.

Interessante resgatar, junto com a ressurreição da memória dessa brava gente, o teor de uma carta que, em 8 de abril de 1889, o benfeitor José Bueno encaminhou a Francisco Glicério, líder-maior do republicanismo pátrio, que então se encontrava na Corte, no Rio de Janeiro. É de se lembrar que foi nesse ano, em novembro, que se instaurou a República.

O documento dizia:

“Glicério: Não imagina como isto está! Agora é que estamos na epidemia. Não sei como nos sairemos dela, me responda esta carta. O José Paulino caiu ontem e não vai bem; o Oto Langaard está pateta, com a família toda doente. Não temos mais vereadores na cidade; não haverá perigo de sofrermos algum desgosto em estarmos levando o serviço como se o José Paulino estivesse presente?”.

Quando José Paulino caiu vítima da febre amarela, durante o período de sua defecção, os serviços da cidade precisariam continuar. Foi então que esse grupo heroico assumiu as funções dos responsáveis enfermos. Daí o receio de alguma represália, fruto de uma equivocada compreensão do que sejam os deveres em relação ao povo que sustenta a máquina governamental.

E José Bueno continua: “Eu, o Maximiliano e o Luís Fiscal temos autorizado todas as despesas que são necessárias – tudo, tudo, como se o José Paulino estivesse aqui. Essas despesas são altas e acho que temos mesmo autorizado alguma coisa mais do que o estabelecido. Fazemos isso porque não tem aqui camarista a quem se entregue esta população que agora é que sabe o quanto está sofrendo. Não sei quantas casas, das habitadas, não tem um doente, mas sei de muitas que têm 4 e 5, e outras que tem 2, porque já morreram 2 e 3!”.

José Bueno já conhecia como se comportava o establishment imperial, não o magnânimo e democrata Imperador que logo mais seria traído e obrigado a deixar sua pátria como se criminoso fosse. Daí sua preocupação: “Se você vir que a Câmara pode sofrer, ou por outra, que o José Paulino pode sofrer algum desgosto pelo que estamos fazendo na ausência dele, você nos diga, porque faremos o José Paulino chamar outro vereador (quem há de ser?) para assumir a direção e responsabilidade disto tudo e nós vamos descansar de ver lágrimas e misérias”.

A situação era, mesmo, desesperadora: “Não se escreve o que por aqui vai! Na loja (era a maçonaria em ação) não fazemos outra coisa senão tomar apontamentos e atender, só e exclusivamente, o serviço da peste – é um trabalho tal que, quando chega a noite, a gente está esbandalhado. Calculo em mais de 400 doentes (numa população que acho que não exagero dizendo que é agora apenas de 3.000!). Venha logo sua resposta, para nossa tranquilidade. Adeus. O amigo José Bueno”.

Eram tempos de probidade, de correção, de se levar a sério o Erário, fruto do trabalho de todos e que não pode ser tratado como coisa e propriedade do mandatário da vontade popular.

Hoje, além das epidemias em sentido estrito, que ainda virão, se o aquecimento global persistir e aumentar, existe aquela do uso do dinheiro do povo para fins personalíssimos e muito distantes da ética, matéria-prima de que o Brasil tem crescente carência.

 

 

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