Hipocrisia na defesa das mulheres
A hipocrisia, quando vem disfarçada de virtude, é talvez a mais traiçoeira.
Ela se apresenta com uma espécie de “verniz da empatia”, mas carrega por dentro a conveniência. Atualmente, fala-se muito de inclusão, enquanto se fecha a porta com o trinco da exclusão. Há promessas de igualdade, mas desde que os privilégios permaneçam intactos.
Chama atenção, e com certo incômodo, como muitos discursos “progressistas” se desfazem diante da primeira chance real de demonstrar coerência. Vejamos, por exemplo, o governo federal tão rápido em se autoproclamar defensor das minorias e das mulheres que se vê agora diante de uma oportunidade concreta indicar uma mulher preparada para o Supremo Tribunal Federal (STF).
Seria o momento ideal para transformar o discurso em ação; mostrar que a defesa das mulheres vai além dos palanques e das hashtags. Mas, como tem se tornado tradição, a bandeira da representatividade parece funcionar melhor como símbolo de campanha do que como prática de governo.
Na política, o protagonismo feminino muitas vezes é tratado como acessório decorativo.
A pauta da igualdade, tão amplamente explorada nos discursos oficiais, costuma desaparecer quando o assunto envolve dividir o poder real. Lembremos do ditado “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”, um slogan não-oficial da incoerência institucional.
O discurso de defesa das mulheres, repetido com entusiasmo em eventos e propagandas, tem servido muito mais como ferramenta de marketing político do que como política de Estado. Enquanto isso, profissionais qualificadas, preparadas e experientes seguem à margem das grandes decisões do país inclusive naquelas que moldam a própria Justiça brasileira.
É inevitável, portanto, a pergunta: será que a tão proclamada “luta pela representatividade” vale apenas até a porta do Supremo? Ou será que a igualdade de gênero só é bem-vinda quando não ameaça a estrutura de poder já consolidada?
O Brasil não precisa de slogans. Precisa de coerência. E coerência, neste momento, significaria reconhecer o que é óbvio: existem mulheres altamente qualificadas para ocupar uma cadeira no STF.
Mulheres com trajetória jurídica sólida, independência intelectual e compromisso com a Constituição não com partidos, grupos ou ideologias.
Dar esse passo não seria apenas um gesto político. Seria um gesto de justiça.