Messias defendeu em tese que ativismo judicial é ‘parte da institucionalidade brasileira’
BRASÍLIA – Favorito para assumir a vaga de Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal (STF), o advogado-geral da União, Jorge Messias, defendeu que o ativismo judicial é “parte da institucionalidade brasileira pós-1988”. A afirmação consta em tese apresentada em curso de doutorado na Universidade de Brasília (UnB), concluído em 2024, quando já fazia parte do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

“Gostando-se ou não da judicialização e do ativismo judicial, sabemos que são parte da institucionalidade brasileira pós-1988, e, embora em intensidades variadas, traços observados em outras democracias ao redor mundo”, diz trecho da obra acadêmica.
Procurado, o ministro não quis se manifestar.
O trabalho de 328 páginas intitulado “O Centro de Governo e a AGU: estratégias de desenvolvimento do Brasil na sociedade de risco global” aborda a atuação do órgão no País, dedica um capítulo inteiro às ações do petista no atual mandato e cita artigo do próprio Barroso. Nos agradecimentos, o ministro evangélico faz uma agradecimento a Deus.
Em um dos tópicos, Messias sustenta que a Constituição ampliou a esfera de atuação do Judiciário para proteger a sociedade de arroubos autoritários e líderes populistas. O aumento da atuação de juízes na resolução de conflitos se deve, na sua visão, à escolha da Justiça como meio preferencial para a garantia dos direitos.
Ele cita a reversão de condenações da operação Lava Jato, a gestão da pandemia da covid-19 e a defesa do sistema eleitoral em 2022 como exemplos de “decisões racionais” do STF. Destaca ainda que algumas delas colocaram a Corte na mira de ataques do ex-presidente Jair Bolsonaro e de seus apoiadores.
“De toda forma, como resultado desse embate, o Supremo Tribunal Federal acabou tornando-se ainda mais central na arena política brasileira, reforçando suas credenciais como defensor da democracia”.
Para sustentar a ideia de que a judicialização crescente da política é um fenômeno global e se deve, em parte, às normas constitucionais do Brasil, Messias cita, entre outras fontes, artigo do próprio Barroso. O ministro escreveu, em junho de 2012, um ano antes de ser empossado no STF, texto no qual apresenta argumentos para justificar o aumento do protagonismo dos tribunais.
Na tese, Messias ainda faz críticas à atuação da Corte no caso do mensalão e nos processos no âmbito da operação Lava Jato, que atingiram diretamente o PT com a condenação de seus líderes.
“Entre 2012 e 2018, multiplicaram-se críticas da esquerda sobre o conservadorismo e autoritarismo do judiciário e do STF, que estariam atuando de maneira partidarizada em detrimento dos interesses do Partido dos Trabalhadores e dos próprios trabalhadores e movimentos sociais. A própria prisão do ex-presidente Lula, bem como a negação do registro de sua candidatura em 2018 reforçaram as censuras”, diz na sua tese de doutorado.
Em seguida, contemporiza a crítica e atribui a culpa pelo que considera excessos do Judiciário a outros membros da Justiça e a agentes políticos. “Na realidade, a autoridade do Supremo Tribunal Federal estava sendo solapada por movimentos sociais autoritários e por instâncias inferiores do Judiciário, que, em última instância, buscavam reverter a própria ordem constitucional de 1988”, diz.
Messias também defende o papel do Judiciário de avalista de políticas públicas e de atos do governo e destaca a possibilidade de reverter medidas do Executivo. “Os governos devem estar atentos aos movimentos do judiciário, uma vez que sentenças podem erodir a base tributária, reverter nomeações para determinados cargos, paralisar a implementação de políticas públicas, impedir ou postergar determinado investimento etc”.
Na tese, Messias também faz elogios a iniciativas do governo Lula, como a reedição dos programas sociais de seus primeiros governos e a volta de práticas econômicas desenvolvimentistas de indução ao crescimento econômico.
Ao abordar o aumento das tensões geopolíticas no mundo, diz, por exemplo, que causa da guerra entre Rússia e Ucrânia pode ser tanto o “revisionismo russo” quanto o “expansionismo da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), ”a depender do gosto do analista”.
O conflito teve início após a Rússia invadir o território Ucraniano por não reconhecê-lo como nação soberana. A agressão foi condenada pelas democracias e a comunidade internacional.
Messias diz ainda que o Brasil viveu período de “agenda ultraliberal” após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
Messias vê big techs como causadoras de desinformação e monopólios
Parte da tese se debruça sobre diversos fenômenos que, na visão de Messias, constituem ameaças para a ordem global. Um deles é a força das chamadas big techs sobre o mercado de comunicação e a influência no debate público.
Ele responsabiliza essas empresas pela “difusão em massa de mentiras”, a radicalização política e a supressão de ideias divergentes.
“Google, Facebook, Instagram são monopólios que não só impedem a competição econômica, como empregam seus vastos recursos para financiar estratégias políticas a fim de manter suas posições privilegiada.”
As plataformas, segundo Messias, tiveram papel na ascensão da direita na última década. Ele cita os presidentes dos Estados Unidos, Donald Trump, e da Argentina, Javier Millei, além de Jair Bolsonaro.
Ele sinaliza também ser favorável a leis que estabeleçam controle para as redes sociais e do uso da inteligência artificial. Esses temas têm sido tratados com recorrência no STF, que estabeleceu a responsabilidade das redes sociais por postagens criminosas ou ofensivas dos usuários.
A decisão prevê a aplicação de sanções mesmo sem notificação judicial prévia em casos de conteúdos impulsionados por anúncios pagos ou robôs.