O que é realmente estratégico para o Brasil?
“A empresa é estratégica”, li na semana, em meio ao debate sobre a crise dos Correios. Achei certa graça, mas não deveria. A empresa teve prejuízo de R$ 2,6 bilhões, em 2024, e R$ 4,3 bilhões na primeira metade de 2025. Agora pede um empréstimo de R$ 20 bilhões para empurrar o barco até o ano que vem. A turma diz que a culpa é a “taxa das blusinhas”. Será? Em uma empresa privada, quando o mercado muda, a reação é rápida. Ajusta-se custos, novos mercados. Na estatal, a conta vai para o governo. Leia-se: contribuinte. Muita gente tentou mudar estas coisas. A privatização dos Correios foi aprovada na Câmara, em 2021, e depois trancou. Vieram as eleições e barramos aquela maldade “neoliberal”. Lula avisou que faria isso. E vai aqui um elogio ao Presidente, pela coerência.

O que fascina é o slogan: a empresa é “estratégica”, visto que entrega encomendas em toda parte, e isto só uma estatal poderia fazer. Há algo mágico, aí. Era assim também com a telefonia, e por aí se tentou barrar a privatização do setor há 30 anos. Lembro disso pois fui um dos últimos brasileiros nada estratégicos que comprou uma linha telefônica por mil dólares, no apagar das luzes do modelo estatal. Hoje temos bem mais celulares do que habitantes, no Brasil, e tudo aquilo entrou para o anedotário nacional.
A Embraer também era estratégica e precisava ser do governo. Lembro de ler sobre as “demissões em massa” que viriam, e uma fila de desgraças. Hoje isso é um pouco piada. O tema realmente estratégico para a empresa era ganhar competitividade. E hoje temos a terceira maior empresa de aviões do planeta, pagando mais impostos e empregando muito mais gente do que antes da privatização. Vale o mesmo para nossos hospitais. Saúde não é negócio, correto? Até surgir o Hospital do Subúrbio, em Salvador, 100% gratuito, gestão privada, fins lucrativos. E vale para aeroportos, que também “tinham que ser” da nossa estratégica Infraero. Até que privatizamos os terminais, a qualidade explodiu e o assunto saiu de pauta.
O último gol brasileiro nessa área foi o marco do saneamento. Durante uma vida escutamos que o saneamento também era estratégico, e, logo, que só o governo poderia mexer com aquilo. Que apenas metade da população tivesse acesso ao saneamento não era o problema. O ponto é que “água não era mercadoria”, e por aí nos arrastamos décadas. Até que vencemos a conversa fiada e temos um mar de investimento privado no setor. Seriam os serviços de correios mais estratégicos do que água e esgoto? Cada um pode responder. De minha parte, digo que estratégico, em qualquer setor, é que as coisas funcionem. Que exista investimento, boa regulação. E que o contribuinte não pague a conta da ineficiência estatal, no fim do dia. Estratégico, no fim das contas, é mudar a nossa cabeça. Quem sabe a crise dos Correios possa nos ajudar, nisso. E oxalá este tema, que vai muito além desta ou daquela estatal, esteja no centro do debate brasileiro em 2026.