Lula e Trump vão falar de Venezuela por pura formalidade; o foco é o Brasil
Quanto mais se aproxima do Brasil e de Lula, mais Donald Trump investe contra a Venezuela e, agora, a Colômbia. O Brasil é líder político e econômico da América do Sul e, até por isso, ou principalmente por isso, o Lula não pode ignorar a gravidade dessas investidas no encontro que terá com Trump, possivelmente no próximo domingo, na Malásia. Não pode ignorar, mas também não deve perder o foco: a prioridade brasileira é o Brasil, o resto é acessório.
Lula vai cumprir a formalidade e manifestar preocupação, mas sem pegar em armas e gastar cartuchos para defender os dois países vizinhos, num encontro para consolidar a aproximação com os EUA e o processo para livrar o Brasil de sanções econômicas e políticas injustas e danosas aos interesses nacionais. Posicionar-se na tensão na Venezuela e na Colômbia, sim. Ameaçar o namoro com Trump e o fim das sanções, definitivamente, não.

Enquanto a Bolívia elege um presidente de centro-direita, depois de décadas de governos de esquerda, e a Argentina, em sua eterna crise, conquista uma linha de financiamento de US$ 20 bilhões dos EUA, as relações entre Trump e Petro vêm se deteriorando no rastro das graves ações dos EUA contra a Venezuela, até com ameaça de invasão por terra.
Não é trivial, nem aceitável, que Trump chame o presidente Gustavo Petro de “líder do narcotráfico” e que Petro responda xingando Trump de “ignorante”, depois de convocar o embaixador do país a Bogotá, “para consultas”. Na linguagem diplomática, significa desagrado, ou irritação, com o outro governo. Para aumentar a complexidade da questão, a Colômbia é, historicamente, o maior aliado dos EUA na região.
O risco não se limita a Petro e a Nicolás Maduro, que está isolado e desmoralizado, mas atinge toda a América do Sul que, como Lula lembra, é uma região pacífica, sem crises externas, muito menos guerras, mas “vive um momento de polarização e instabilidade”. E alertou: “Intervenções estrangeiras podem causar danos maiores do que o que se pretende evitar”. Recado dado.
Quem se agarrou à bandeira da soberania quando o ataque foi ao Brasil, em forma de tarifas, suspensão de vistos e Lei Magnitsky, não pode lavar as mãos. O fundamental, porém, é cuidar do interesse brasileiro. Como ilustrou um embaixador, “o rabo não pode abanar o cachorro”.
Não se pode esperar que Lula e Trump discutam se as tarifas serão zero, 20 ou 50, se café, carne e suco de laranja serão excluídos do tarifaço e quais vistos para os EUA serão ou não mantidos, o que cabe aos escalões ministeriais e técnicos. O importante é o fato político e a foto: os dois presidentes trocando um aperto de mãos, de preferência sorrindo.
Uma imagem vale mais do que mil palavras. No caso, para encerrar de vez as versões de Eduardo Bolsonaro e das redes bolsonaristas de que era só jogo de Trump, Marco Rubio acabaria com qualquer chance de dar certo, o telefonema dos dois presidentes não serviu para nada e, até, que o encontro de Rubio e Mauro Vieira “nem aperto de mão teve”. Teve, sim, senhores.
Soa como desespero, porque a realidade é outra. Trump e seus assessores estão num clima de paz e amor com Lula, nunca mais citaram Jair Bolsonaro, criticaram o Brasil ou acenaram com sanções. Daí a fingir que o Brasil não tem nada a ver com ingerência na Venezuela e na Colômbia seria demonstrar medo ou fraqueza, algo que Lula não pode, não deve e tem horror de fazer.
Trump sabe disso e ambos sabem jogar o jogo. Um tem de falar, o outro está preparado para ouvir e fica por isso mesmo. O tema será abordado na Malásia, mas por pura formalidade.