23 de outubro de 2025
Politica

O retorno de Lula e o haraquiri da direita

Lula voltou a ser o favorito. A crise provocada pelo tarifaço americano, em vez de enfraquecer o governo, acabou fortalecendo-o. O presidente está tão à vontade que decidiu nomear para ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência um aliado de perfil controverso, mas de confiança pessoal — gesto típico de quem sente o terreno seguro e firme sob os pés.

No presidencialismo multipartidário, o equilíbrio da coalizão nunca é estático. Em artigo escrito com Frederico Bertholini — Pagando o preço de governar: custos e gerência de coalizão no presidencialismo brasileiro — mostramos que a força do Executivo oscila conforme choques endógenos e exógenos reconfiguram o poder de barganha entre os atores. Mesmo arranjos subótimos — em que o governo governa por meio de coalizões amplas e heterogêneas, mas distribui poder e recursos de forma desproporcional ao peso político dos aliados — podem ser alterados por eventos imprevisíveis que deslocam o centro de gravidade da coalizão.

Lula tem se aproveitado de erros da direita para voltar a se tornar competitivo para 2026
Lula tem se aproveitado de erros da direita para voltar a se tornar competitivo para 2026

O recente choque tarifário imposto pelos Estados Unidos é um exemplo eloquente: transformou a relação de forças entre Planalto e Centrão, devolvendo ao Executivo parte da iniciativa perdida nos meses anteriores. O então principal candidato da oposição, antes em empate técnico com Lula, agora aparece bem atrás nas pesquisas de intenção de voto.

Mas o tarifaço, por si só, não explica a recuperação de Lula. O que realmente o ressuscitou politicamente foi o haraquiri cometido pela direita, liderado por Eduardo Bolsonaro. Ao instrumentalizar a centro-direita, a transformou em refém de uma estratégia de confronto ideológico que a empurrou para os extremos e reduziu sua competitividade para 2026.

Trump iniciou sua ofensiva tarifária com um aumento de 10% sobre todas as importações, sem distinções maiores. O Brasil, inicialmente, não seria alvo preferencial. Mas bastou Eduardo Bolsonaro sair em campanha aberta pela anistia do pai — inflamando o Secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, e provocando Washington — para o tombo vir rápido: as tarifas subiram para 50%. Em vez de um golpe contra Lula, a direita lhe entregou um presente. Foi o empurrão que faltava para o presidente vestir novamente o figurino de defensor dos interesses nacionais contra o arbítrio estrangeiro.

A sequência de equívocos foi notável: campanha pela “anistia geral”, bandeira dos EUA tremulando na Avenida Paulista e Tarcísio de Freitas desfilando de chapéu MAGA. Tudo isso reforçou a imagem de uma oposição submissa a interesses externos e desconectada da sensibilidade popular.

Lula, pragmático como sempre, apenas colhe os frutos plantados por seus adversários. O equilíbrio de forças mudou — por ora, a seu favor. Mas, como ensina o próprio presidencialismo de coalizão, todo equilíbrio é dinâmico: novos choques podem, a qualquer momento, inverter novamente o jogo. Por exemplo, com a possibilidade cada vez maior de um acordo entre Lula e Trump que reduza as tarifas impostas ao Brasil, tende também a arrefecer o discurso de defesa da soberania que hoje impulsiona o presidente.

 

 

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