Encontro global mostra mercado menos aflito com risco geopolítico
A reunião semestral do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial, acompanhada de vários eventos paralelos em Washington, costuma ser um bom termômetro da percepção global de risco. Desta vez, o clima foi bem menos tenso do que em abril. As conversas com investidores e autoridades mostraram uma comunidade financeira mais segura quanto à natureza dos riscos à frente — tanto na economia mundial quanto no Brasil. A sensação predominante era de que a fase mais aguda de incertezas ficou para trás, ainda que muitas ameaças estruturais continuem no horizonte.
No caso brasileiro, o tom das conversas mudou significativamente. A avaliação majoritária entre investidores, brasileiros e estrangeiros, é que aumentaram as chances de reeleição do presidente Lula em 2026. Essa percepção decorre, sobretudo, de uma recuperação de popularidade mais rápida e intensa do que se previa — de fato, uma das maiores surpresas do ano até aqui. Vários fatores explicam essa melhora. O principal é a queda da inflação, especialmente a de alimentos, favorecida pela queda do dólar, que também surpreendeu. Pesquisas recentes indicam uma taxa média de aprovação próxima de 48%, patamar mais alto do que parecia possível no início do ano.

Diante disso, a atenção dos mercados começa a se deslocar para 2027, quando o próximo governo — seja ele Lula 4 ou um presidente de direita — terá de enfrentar novamente a tarefa de ajustar as contas públicas. A trajetória da dívida brasileira é insustentável, o que torna inevitável um esforço fiscal mais contundente.
As expectativas, no entanto, são baixas. Muitos interlocutores acreditam que um eventual segundo mandato de Lula tenderá a propor medidas insuficientes de contenção de gastos, o que poderia levar a um novo ciclo de alta do dólar e de instabilidade financeira. Ainda assim, boa parte dos investidores, especialmente os estrangeiros, concorda que Lula seria pragmático o bastante para evitar rupturas, propondo medidas adicionais de contenção fiscal que poderiam, em tese, reequilibrar o cenário econômico em algum momento. Haverá muitos debates, de agora até 2027, sobre a natureza dessas medidas — e sobre o ponto a partir do qual os credores brasileiros se darão por satisfeitos.
Nesse sentido, o cenário internacional terá grande importância, pois um ambiente de maior apetite por risco facilitará a tarefa do próximo governo. A reunião deste mês em Washington, de fato, mostrou um clima mais ameno do que seis meses atrás, com um ambiente de leve otimismo. Se em abril predominava a incerteza sobre os rumos da política econômica de Donald Trump, agora o sentimento é de acomodação: o “novo normal” começa a ser compreendido. Dados recentes mostram resiliência maior das economias americana e global, sustentadas por estímulos fiscais. A possibilidade de uma recessão nos Estados Unidos é hoje vista como remota, e os mercados emergentes continuam se beneficiando da fraqueza do dólar e do apetite por ativos de risco.
Ainda assim, os participantes do encontro não ignoraram os riscos latentes. As tensões geopolíticas permanecem, mas em compasso mais previsível: o cessar-fogo em Gaza reduziu o risco de escalada regional; o conflito entre Rússia e Ucrânia segue sem novas rupturas; e as relações entre Estados Unidos e China caminham num equilíbrio tenso, em que ambos preferem estabilidade à confrontação aberta. O que preocupa, portanto, não são choques imediatos, mas a possibilidade de que essa resiliência disfarce vulnerabilidades de longo prazo — desde a fragilidade dos sistemas financeiros até disputas regulatórias em tecnologia e moedas digitais.
O saldo das reuniões foi o retrato de um investidor global aliviado, mas não complacente. Passada a fase de sobressaltos, ele começa a olhar para horizontes mais longos, com disposição para correr riscos, mas também consciente de que o próximo ciclo exigirá ajustes estruturais, no Brasil e no mundo. O desafio é lidar com riscos que não parecem explosivos, mas continuam profundos.
