Defensoria avalia pedir federalização de investigação sobre operação no RJ, diz chefe do órgão
O defensor público-geral federal, Leonardo Magalhães, afirmou nesta quinta-feira, 30, que avalia pedir a federalização das investigações sobre a operação policial mais letal da história do Rio de Janeiro, que deixou pelo menos 121 mortos na terça-feira, 28. Magalhães disse acompanhar o caso com “bastante preocupação” e ressaltou que moradores de favelas são oprimidos pelo Estado, mas também pelo crime organizado.
Em entrevista à Coluna do Estadão, o chefe da Defensoria Pública da União (DPU) disse ainda que o órgão tem a missão de defender qualquer pessoa, e vai acolher familiares de vítimas da megaoperação, tanto parentes de moradores de comunidades quanto de policiais.
“Muito provavelmente vamos reforçar o pedido de federalização das investigações relacionadas à megaoperação. Tudo indica isso. Estamos vigilantes. Agora é o momento de verificar e responsabilizar. Vamos analisar as informações prestadas pelo governo do Rio de Janeiro e decidir com base em provas”, afirmou Magalhães.

Nessa quarta-feira, 29, o PSB pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para federalizar o caso. O partido é o autor do processo conhecido como ADPF das Favelas, que busca reduzir a letalidade policial no Rio. Em abril, a Corte definiu uma série de regras para a atuação policial no Estado, o que a sigla alega que foi violado.
O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, convocou uma audiência pública na próxima segunda-feira, 3, com o governador do Rio, Cláudio Castro (PL) e outras autoridades estaduais.
A Defensoria Pública fluminense diverge da gestão fluminense quanto ao número de mortos na operação. O governo informou 121 pessoas mortas. A Defensoria aponta que 132 foram assassinadas na megaoperação policial contra o Comando Vermelho, que incluiu o lançamento de bombas por drones controlados pela facção.
Na manhã dessa quarta-feira, 29, moradores do Complexo da Penha levaram ao menos 60 corpos para uma praça, o que fez o governo dobrar a contagem oficial de mortos. Moradores disseram ao Estadão que havia cadáveres amarrados, decapitados e com ferimentos de facadas.
‘Criminalidade também oprime as comunidades’
Para o defensor público-geral federal, a crise na segurança pública é resultado de um cenário estrutural de desigualdade social, em que as facções criminosas aproveitaram a omissão do poder público.
“A DPU recebe muitos casos de famílias do Minha Casa Minha Vida que foram obrigadas pelo tráfico a deixar o imóvel. Onde está o Estado? São pessoas que não experimentam direitos básicos. Não é só o Estado, mas a criminalidade também oprime essas pessoas”.
Magalhães avaliou que a solução para superar a escalada da violência não inclui apenas o conflito armado, mas políticas públicas executadas a longo prazo.
“O Estado muitas vezes não está presente na educação, na saúde, e vai aparecer logo na repressão. Enquanto a gente não discutir políticas efetivas de redução de desigualdades estruturais, de desigualdades socioeconômicas, vai continuar esse ciclo de violência, infelizmente”.

‘Estado pune com prisão, não execução’
Questionado sobre a declaração do governador do Rio de Janeiro de que houve apenas quatro vítimas dentre os mais de cem mortos, em referência aos policiais assassinados, o chefe da DPU discordou. Respondeu que todos os mortos foram vitimados na megaoperação.
“A vida humana não pode ser mensurada. Foram dizimados os policiais e foram dizimadas pessoas da comunidade que podem ou não estar envolvidas com o crime. Ninguém pode ser privado da vida sem o devido processo legal. Todos têm direito a um julgamento. A forma como o Estado pune crimes é com prisão, não com morte ou execução”.
Policial tem direito de legítima defesa, com razoabilidade
O defensor público-geral federal ressaltou que os desafios enfrentados pelos policiais são extremos, e lembrou que integrantes do Comando Vermelho lançaram bombas por drones.
“O agente público que tem sua vida ameaçada exerce um direito de legítima defesa, mas com proporcionalidade e razoabilidade. Nós sabemos a dificuldade, também, das forças policiais no combate à violência. Todos nós somos contra o crime, todos temos direito à segurança, tanto nas áreas ricas quanto nas comunidades periféricas”.

