A responsabilidade penal do falido
Chega às livrarias Direito penal da recuperação e da falência, em coautoria com o Professor Nilo Batista, publicado pela Tirant lo Blanch. O grande mestre me ofertou o estímulo intelectual de construir novo texto, a contar das suas lições sobre o crime falimentar.
Nilo Batista se apresenta o penalista perfeito, com aptidão para navegar com habilidade em direito privado e com profundo conhecimento de história. Daí, tanta dedicação que conferi ao trabalho. Era a oportunidade de o músico normal dialogar com Johann Sebastian Bach, como brinquei certa feita com ele.

Depois de dois anos, aí se encontra o livro, com três objetivos ao menos: (i) mostrar a via crucis do devedor falido na tradição jurídica ocidental; (ii) firmar a função social da propriedade como bem jurídico-penal dos tipos legais; e (ii) sistematizar a interpretação dos crimes em vigor (Lei 11.101/05), mediante o uso de rígidos princípios do direito penal.
As infrações penais falimentares, de um lado, perderam a eficácia no direito pátrio, em virtude de antigos equívocos estruturais dos tipos (v.g., Decreto-Lei nº 7.661/45) e complexidades procedimentais que, em muito, complicaram a apuração de materialidade e autoria de tais delitos.
Todavia, de outro, os processos judiciais por crimes da espécie mostraram o embaralhamento entre a figura do devedor, falido ou em recuperação, e o criminoso. Certo grau de responsabilidade objetiva surgiu dos preconceitos do passado, o que levou a emprego equivocado dos tipos legais, sem juízos corretos quanto a tipicidade, ilicitude e culpabilidade.
Em boa medida, a ausência de compreensão quanto ao sentido econômico contemporâneo das falências e das recuperações advinha das incertezas quanto ao valor jurídico-constitucional, tutelado pelos tipos penais. Desse modo, com cuidado, buscou-se laborar com o conceito jurídico de função social da propriedade para sugerir raciocínio firme quanto ao significado dos comportamentos típicos.
Por fim, diante da multiplicidade de elementos normativos, procurou-se auxiliar no entendimento dos crimes em vigor, dissecando institutos jurídicos de diversos ramos do Direito.
Entretanto, a premissa da interpretação seguiu à risca a parte geral, do Código Penal, e toda a dogmática que a acompanha. Sim, não obstante a especificidade da matéria falimentar, se assentou a convicção de que os tipos legais se aplicam por meio de conhecimentos próprios do direito penal. E jamais, ao contrário.
O leitor depara-se com problemas difíceis como a natureza da sentença decretatória de falência – ou da sentença de recuperação judicial, ou ainda de homologação da recuperação extrajudicial – e ao que tais provimentos jurisdicionais correspondem para o crime falimentar. Por consequência, se impôs, também, a questão do quando foi perpetrada a conduta típica, antes ou depois de aludidas sentenças.
O emaranhado de definições jurídicas (de direito civil, empresarial, processual civil e processual penal), bem assim os desafios inerentes ao direito penal especial encantaram juristas como Tullio Ascarelli e Francesco Carnelutti. Com certeza, hão de cativar quem se preocupa, como ambos os atuais autores, em pensar sobre tais situações econômico-financeiras na relação com o todo do ordenamento jurídico.
