Direita monta força-tarefa para salvar projeto que pode ser ativo eleitoral em 2026
BRASÍLIA — Farejando a centralidade que o tema deve ter para as eleições de 2026, quatro governadores aterrissaram na capital federal nesta quarta-feira, 12, numa corrida para salvar um projeto de lei que pode virar troféu de campanha.
Atores do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional, de governos estaduais e da sociedade civil passaram o dia em reuniões em Brasília para tentar influenciar os rumos do projeto cotado como futuro marco no combate ao crime organizado no Brasil.

Depois que a Operação Contenção deixou 121 cadáveres, um cenário de guerra nas ruas do Rio de Janeiro e uma impulsão na popularidade do governador Cláudio Castro (PL), tanto o Ministério da Justiça quanto o bolsonarismo mexeram as peças para melhor se posicionar na discussão do enfrentamento a facções.
Enquanto o governo Lula enviou ao Congresso o projeto de lei Antifacção — que prevê aumento de pena para líderes de facções, a criação de um Banco Nacional de Organizações Criminosas e a infiltração de agentes e empresas fictícias em quadrilhas —, a oposição correu para tentar alterar a Lei Antiterrorismo e designar facções como grupos terroristas, em vão.
A reviravolta ocorreu quando o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), escolheu o bolsonarista Guilherme Derrite (PP-SP) como relator do projeto do governo, na prática tirando do governo federal o controle sobre o conteúdo. Derrite é da linha-dura da Polícia Militar e homem de confiança do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). O Executivo protestou.
Mirando o consenso, Derrite foi levado a produzir quatro versões diferentes do relatório entre sexta e quarta-feira, mas os remendos seguem desagradando ao governo. A cúpula do Ministério da Justiça define como “açodado” o processo e avalia que ele arrisca “patrocinar retrocessos e fragilizar o enfrentamento ao crime organizado”.
Sob o risco de ver o projeto derrotado, os governadores do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), de Goiás, Ronaldo Caiado (União), de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), e de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), se reuniram com Motta nesta tarde para pedir o adiamento da votação. Querem um projeto mais robusto — e antes palatável ao plenário.
“Nós unanimemente discordamos da rapidez desse projeto. Quem opera a segurança pública são os Estados. Não adianta votar projeto sem ouvir os Estados. Entendemos que um projeto de segurança deveria ser votado em pacote”, afirmou Castro após o encontro.
O líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), fez coro aos governadores e defendeu o adiamento da votação. Ele disse ter escrito tanto a Motta quanto a Derrite, na hora do almoço, expondo sua contrariedade.
“Não dá para votar uma lei que não agrada ao Derrite e não agrada ao governo. O texto do Derrite teria nosso apoio se fosse votado hoje, mas não resolveria o problema (da segurança pública)”, disse Sóstenes, desconsiderando que a proposta original não visava tamanha pretensão.
O prazo de 30 dias pedido pelos governadores pode dar à direita tempo para elaborar um pacote com as digitais do bolsonarismo — sobre aquelas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). À esquerda restará agir para não ver o tiro sair pela culatra.
A incomum sessão solene realizada no plenário do Senado para homenagear Castro e os quatro policiais mortos na Operação Contenção, nesta manhã, expôs a batalha deflagrada pela paternidade da grande aposta federal no combate ao crime. Parte dos discursos serviu para blindar o governador, e parte, para espinafrar o governo Lula.
“Como as pessoas fizeram uma fala que é mentirosa, colocando que os governadores, que nem participam desse debate, estão contrários, querendo tirar prerrogativas da Polícia Federal (PF). Se não querem debater segurança pública com os governadores, não inventem fake news contra eles”, afirmou Celina Leão (PP), vice-governadora do Distrito Federal, presente na sessão. Ela se referia às críticas de governistas de que um dos relatórios de Derrite enfraquecia o trabalho da PF.
Mais sutil, a senadora Tereza Cristina (PP-MS) associou as falhas na segurança pública, cuja responsabilidade constitucional é dos Estados, à “omissão e ausência de uma estratégia nacional”. Disse que o governo federal é quem tem o dever de apoiar e financiar ações estaduais de combate ao crime.
“Hoje, a ausência do governo federal é sentida em todo o território nacional. Foi muito fácil para este governo lavar as mãos e se dedicar a incrementar os seus projetos assistenciais. Só que agora, às vésperas das eleições, o problema da insegurança pública ficou grande demais passou a incomodar e a merecer alguma atenção do poder central”, discursou ela.
O próprio Derrite agiu para colar no governo Lula a pecha de tentar aliviar para os bandidos. Disse na tribuna que o Palácio do Planalto enviou “às pressas” um projeto antifacção que reduziria penas dos criminosos, e que ele não admitiria a situação.
Já Castro, estrela do evento, mirou na homenagem aos policiais e acertou nos adversários. Deu tanto ênfase ao nome da sigla autora da ação que impôs controle às operações policiais nas favelas do Rio, o PSB (Partido Socialista Brasileiro), quanto afirmou que “partidos de esquerda quiseram julgar o problema de segurança pública no Rio pelo remédio que estava sendo usado”.
Entre a homenagem e a reunião com Motta, os governadores participaram de um almoço realizado na sede da Frente Parlamentar do Livre Mercado (FPLM), onde aproveitaram para insuflar aliados pela necessidade de endurecer a lei contra os bandidos. Caiado deu o tom da importância eleitoral da pauta.
“Vocês têm maioria (no Congresso) para esse tema, e 80% da população batendo palma para vocês. É o sentimento da população. Aproveitem essa matéria agora, vocês precisam esgotar”, discursou em frente à mesa cheia de deputados e aliados.
Assim como a esquerda teve de se virar para não ver o auxílio emergencial do governo Bolsonaro na pandemia arrebatar para a direita a pauta da assistência social, a direita agora vê o seu território, o da segurança pública, ameaçado por uma iniciativa petista.
A força-tarefa promovida em Brasília nesta quarta-feira mostra que os bolsonaristas não devem dar a Lula, de mão beijada, o que promete ser um dos maiores ativos eleitorais nas definitivas eleições do ano que vem.
