FGM participa de Seminário do Patrimônio Cultural Negro, promovido pelo MPBA
Texto: Maiama Cardoso | MPBA e Ascom FGM
Foto: Divulgação | MPBA
Especialistas que palestraram no ‘2° Seminário do Patrimônio Cultural Negro’, promovido pelo Ministério Público do Estado da Bahia nesta quarta-feira (12) destacaram a relevância da história e cultural do povo negro para consolidação do patrimônio cultural brasileiro. Um dos participantes foi o diretor de Patrimônio e Equipamentos Culturais da Fundação Gregório de Mattos, Vagner Rocha, que esteve na mesa institucional de abertura do evento.
“Falar de patrimônio é falar de memória, de legado, de identidade. A gente não consegue pensar na formação desta cidade, deste estado e deste país sem pensar nas contribuições afrodiaspóricas, porque até o patrimônio edificado, considerado branco, foi erguido por mãos negras. Esse seminário é, também, um processo de reparação histórica, de entender que sempre é tempo de recuperar aquilo que nos foi apagado”, destacou Vagner durante a fala no evento.
O evento foi aberto pelo coordenador do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos (CAODH), promotor de Justiça Rogério Queiroz, que lembrou de um marco “importantíssimo” para história do povo negro e do Brasil, que foi o achado do Cemitério dos Escravizados em Salvador.
“Esse achado é a prova arqueológica do epistemicídio que o povo negro tem sido vítima, do apagamento da sua cultura, da sua história, dos seus nomes e até mesmo do direito de cultuar os seus mortos”, disse ele. Rogério Queiroz destacou que a ação permite “o resgate da história de quem foi trazido para cá a força, quem sofreu o processo de escravização perverso, cuja abolição foi mal conduzida e traz reflexos até os dias atuais”. “Estamos trabalhando no resgate do direito humano à memória, o direito humano a cultuar os seus mortos, à ancestralidade, aos seus nomes, à sua cultura… retirado durante muito tempo”, concluiu, parabenizando as instituições que atuam no procedimento.
O coordenador do Núcleo de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (Nudephac), promotor de Justiça Alan Cedraz, à frente do seminário, registrou que o evento acontece dentro do Novembro Negro e que “a defesa do patrimônio cultural negro é também uma forma de justiça racial, uma forma de reparar invisibilizações históricas e de fortalecer políticas públicas voltadas à salvaguarda dos saberes e práticas das comunidades de matriz africana”.
No painel ‘Festas Populares no Brasil’, a historiadora Raquel Barreto e a jornalista Cleidiana Ramos abordaram o papel da comunidade negra na formação desse patrimônio e reforçaram a importância de lutas travadas, ao longo da história, para preservação da memória e da cultura do povo negro.
Ao falar sobre o papel da mulher na formação das festas populares no Brasil, a historiadora Raquel Brito citou o livro ‘Festas Populares no Brasil’, de Lélia Gonzalez, assinalando que a autora abordou a cultura brasileira apontando as raízes na cultura negra já na década de 70. Segundo a historiadora, a relação capital versus trabalho foi definida pelos africanos e seus descendentes e o mundo da cultura também.
“Um lugar luminoso pra gente poder observar isso é nas festas populares, que seguem um calendário cristão, pois é nelas que, segundo Lélia, os africanos e seus descendentes compreenderam que era possível reatualizar seus mitos, festas e tradições, aproveitando esse espaço para celebrar a sua própria cultura e, com isso, marcar a cultura do colonizador”, resumiu Barreto, frisando que esse cenário não pode ser lido na ideia de democracia racial que nega o conflito e a violência, hierarquizando contribuições.
A jornalista Cleidiana Ramos abordou a resistência da ancestralidade frente às tentativas de apagamento nas celebrações de festas de rua em Salvador, sobretudo na ‘Festa de Yemanjá”. Segundo ela, “não tem festa de largo em Salvador que não tenha a mão afrobrasileira”. O legado é do povo negro, que tem resistido ao longo dos séculos, afirmou Cleidiana, citando vários episódios em que a igreja católica tentou invisibilizar a cultura do povo negro. A jornalista chamou atenção para o fato de que as festas de largo têm um caráter especial nas sociabilidades, mas também nas tensões, pois repete o cotidiano, inclusive o racismo e a desigualdade.
“As festas de rua foram construídas pelo povo negro e não podemos perder de vista de que elas são uma das melhores forma do povo negro e indígena terem deixado as suas marcas”, registrou no painel que foi mediado pela promotora de Justiça Lívia Santana Vaz.
O seminário foi aberto com apresentação de capoeira da mestra Bia, primeira mestre de capoeira do Nordeste de Amaralina. Teve ainda apresentação de painel sobre a proteção da capoeira como bem imaterial, com a professora Negona do Ébano, abordando ‘Que ginga é essa: detentoras do patrimônio imaterial bahiano’; e com a antropóloga do Iphan, Rebecca Guidi, que discorreu sobre o ‘Plano de salvaguarda como instrumento de proteção do patrimônio imaterial’. O painel foi mediado pelo historiador do Nudephac, Miguel de Santana Soares.
